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Tese Delson Biondo.pdf - Universidade Federal do Paraná

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que encontra para prestar reverência ao mun<strong>do</strong> das palavras, ao encantamento que<br />

elas lhe provocam. Como vimos, tu<strong>do</strong> aquilo que diz respeito às experiências ou<br />

realidades palpáveis (forma, matéria, corpo, carne) exerce forte poder de atração<br />

sobre os satiristas.<br />

A língua portuguesa e suas literaturas são tratadas pelo autor como<br />

patrimônios, bens ou valores comuns que necessitam ser constantemente<br />

inventaria<strong>do</strong>s, difundi<strong>do</strong>s e compartilha<strong>do</strong>s. O escritor, por sua vez, apresenta-se<br />

como uma espécie de artífice <strong>do</strong> idioma, um indivíduo habili<strong>do</strong>so capaz de manipulá-<br />

lo, corrigi-lo, alterá-lo, transformá-lo e restaurá-lo, acima de tu<strong>do</strong>, como alguém que<br />

se encarrega de transmitir, ampliar e valorizar a linguagem, acessan<strong>do</strong> e<br />

organizan<strong>do</strong> livremente os discursos disponíveis.<br />

No que concerne à utilização de discursos, os satiristas tendem a não<br />

respeitar nenhum tipo de propriedade intelectual. Montam, desmontam, remontam,<br />

remendam, plagiam, copiam, imitam, pasticham, parodiam e canibalizam os<br />

discursos alheios com extrema naturalidade. Entre esses processos, destaco agora<br />

aquele que considero ser o ponto crucial de alguns procedimentos humorísticos: a<br />

imitação.<br />

Parto <strong>do</strong> princípio de que a intenção consciente de imitar o outro – ou seja, a<br />

tentativa de reproduzir, duplicar ou repetir o estilo <strong>do</strong> outro, com plena noção das<br />

limitações e implicações desse ato, a fim de valorizar ou desvalorizar tal estilo e<br />

ainda obter algum tipo de recompensa (aplausos, risos, adesões) – está na base de<br />

certos procedimentos retóricos especialmente emprega<strong>do</strong>s na literatura de cunho<br />

satirista, como algumas técnicas de “apropriação, interpolação, alteração, falsa<br />

atribuição” 22 , já observadas por Hansen; além de montagens, colagens (ou<br />

bricolagens), composições de mosaicos e demais artifícios de encaixe.<br />

O que é realmente espirituoso na técnica mimética de O tetraneto del-rei é<br />

que o autor não se limita apenas a escrever à moda de ou à maneira de, imitan<strong>do</strong><br />

passivamente os autores clássicos, mas acaba conduzin<strong>do</strong> sua mimese ao ponto<br />

extremo da intenção fraudulenta, saltan<strong>do</strong> ironicamente da imitação pura para a<br />

efetiva apropriação indébita, para o plágio e a falsa atribuição. Ele não se satisfaz<br />

em reproduzir com criatividade o estilo de outrem, pelo contrário, como um pícaro<br />

22 HANSEN, João A<strong>do</strong>lfo. A sátira e o engenho: Gregório de Matos e a Bahia <strong>do</strong> século XVII. São<br />

Paulo: Companhia das Letras: Secretaria de Esta<strong>do</strong> da Cultura, 1989. p. 45.<br />

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