14.04.2013 Views

Tese Delson Biondo.pdf - Universidade Federal do Paraná

Tese Delson Biondo.pdf - Universidade Federal do Paraná

Tese Delson Biondo.pdf - Universidade Federal do Paraná

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Ao observar de perto habilidades retóricas empregadas em ficção, veremos<br />

que elas se relacionam intimamente ao mo<strong>do</strong> como o ora<strong>do</strong>r tenciona apresentar<br />

seu discurso e absorver a atenção <strong>do</strong> interlocutor. Quan<strong>do</strong> se trata de conquistar o<br />

engajamento <strong>do</strong> auditório, pequenas variações no formato da apresentação podem<br />

ser decisivas. A busca por uma linguagem impecavelmente adequada ao contexto,<br />

por um discurso em que nada sobre ou falte, revela também o projeto pessoal de<br />

realizar um casamento perfeito entre realidade material da língua e significação.<br />

Quan<strong>do</strong> o ora<strong>do</strong>r consegue associar de maneira natural esses <strong>do</strong>is elementos na<br />

consciência <strong>do</strong> ouvinte, parece favorecer conseqüentemente a comunhão de idéias.<br />

Porém, a qualquer instante pode ocorrer uma ruptura; bastam ligeiros<br />

desvios <strong>do</strong> padrão, escolhas inapropriadas, pequenos estranhamentos, ênfases<br />

desnecessárias ou distrações momentâneas para que o interlocutor efetue uma<br />

dissociação entre o formato e a substância de um discurso, para que a mente recue<br />

a um <strong>do</strong>s níveis materiais da linguagem. Neste caso, o argumento se enfraquece e o<br />

ouvinte tende a perceber com maior nitidez o uso de expedientes, figuras e tropos<br />

retóricos. Ficcionistas (e artistas da palavra) costumam usar essa dissociação em<br />

benefício <strong>do</strong> próprio discurso literário, crian<strong>do</strong>, a partir da percepção da forma, certos<br />

efeitos estéticos nos planos sintático, prosódico ou morfológico da língua. Embora<br />

esses efeitos não falem diretamente à razão, podem muito bem sensibilizar por meio<br />

da emoção. Dosar a quantidade de emoção e de razão numa obra literária é tarefa<br />

morosa, que demanda tempo, invenção e energia, como atestam diversos exemplos<br />

<strong>do</strong> “Cotejo das edições”. 20<br />

Se um escritor não controlar sua impaciência, se quiser estabelecer com o<br />

auditório acor<strong>do</strong>s muito rápi<strong>do</strong>s, poderá sucumbir ao uso de clichês, valiosos em<br />

certas ocasiões. Mas numa cultura como a nossa, obcecada por originalidade ou<br />

tão-somente sedenta de novidades, tornamo-nos muito sensíveis à aceitação de<br />

lugares-comuns. Ao reconhecer um clichê (uma fórmula antiga num contexto novo),<br />

o interlocutor pode pensar que esse mo<strong>do</strong> de apresentação não é o mais eficiente<br />

nem o mais adequa<strong>do</strong> às circunstâncias. Em termos argumentativos, a rejeição de<br />

um clichê desqualifica e subestima o ora<strong>do</strong>r e, conseqüentemente, o seu discurso.<br />

Para impressionar o auditório, não basta escolher os elementos adequa<strong>do</strong>s,<br />

é preciso saber trazê-los ao primeiro plano da consciência <strong>do</strong>s ouvintes, através de<br />

20 Ver Apêndice 2.<br />

92

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!