14.04.2013 Views

Tese Delson Biondo.pdf - Universidade Federal do Paraná

Tese Delson Biondo.pdf - Universidade Federal do Paraná

Tese Delson Biondo.pdf - Universidade Federal do Paraná

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

traduções, paráfrases ou comentários hermenêuticos sobre seus relatos, apontan<strong>do</strong><br />

para si mesmo no processo da escrita, chaman<strong>do</strong> a atenção para a forma (e o<br />

significa<strong>do</strong>) daquilo que ele próprio escreveu, é como se quisesse desmascarar o<br />

ilusório <strong>do</strong> discurso ou suspender, por um instante, o pacto ficcional trava<strong>do</strong> com o<br />

leitor: “Aliás, fazen<strong>do</strong> reparo no capítulo [...] Neste ponto, aza<strong>do</strong> é que abreviemos o<br />

discurso e alcancemos terra firme” 132 ; ou ainda: “Agora é lugar de considerar-se um<br />

capítulo por geral havi<strong>do</strong> de despicien<strong>do</strong>, qual o de averiguar-se quem deitou lume à<br />

pólvora. Ou seja, quem despediu o primeiro sinal de agravo, qual <strong>do</strong>s ban<strong>do</strong>s<br />

acarretou gravetos para deflagrar a fogueira.” 133 ; e também: “Foi o derradeiro<br />

pensamento que lhe acudiu àquela tarde. Minto; o penúltimo, que o último foi ao<br />

recordar-se de que, em nenhum momento, o Corvino lhe mirara os olhos” 134 .<br />

A autoconsciência momentânea <strong>do</strong> narra<strong>do</strong>r, seu desejo de estabelecer um<br />

pretensioso distanciamento crítico em relação ao narra<strong>do</strong>, bem como sua repentina<br />

e brusca interferência na história, acabam colocan<strong>do</strong> no primeiro plano <strong>do</strong> texto<br />

to<strong>do</strong>s esses expedientes ficcionais. Quan<strong>do</strong> o leitor os percebe, quan<strong>do</strong> se dá conta<br />

de que o escritor está manipulan<strong>do</strong> intencionalmente o enuncia<strong>do</strong> em busca de um<br />

efeito, surge o cômico <strong>do</strong> discurso.<br />

O mesmo acontece com a voz <strong>do</strong> Torto, em primeira pessoa, nas cartas<br />

dirigidas a sua dileta Augusta. Ao parodiar a ironia romântica, realizan<strong>do</strong> uma<br />

espécie de auto-referencialidade discursiva, ele consegue revelar um pouco <strong>do</strong>s<br />

basti<strong>do</strong>res da escrita e evidenciar parte <strong>do</strong> fingimento ficcional: “Sei que ardeis em<br />

curiosidade [...] por que vos faça eu relação destes nativos e de suas vergonhas [...]<br />

Desse capítulo cuidarei no correio a seguir-se” 135 ; ou ainda: “Não terá fugi<strong>do</strong> a<br />

vosso esperto faro que se vão espaçan<strong>do</strong> minhas letras.” 136<br />

A ironia metadiscursiva também ocorre quan<strong>do</strong>, depois de despejar pela<br />

carta uma torrente de versos de Fernan<strong>do</strong> Pessoa, o Torto acrescenta com pasmo e<br />

sonsice: “Que coisa curiosa estas associações de idéias!” 137 O enuncia<strong>do</strong> é irônico,<br />

entre outros motivos, porque evidencia os cordéis usa<strong>do</strong>s pelo escritor para<br />

manipular os pensamentos <strong>do</strong> personagem, porque nos faz assistir simultaneamente<br />

à colagem de Harol<strong>do</strong> Maranhão, com seu riso debocha<strong>do</strong> de satirista, e ao plágio<br />

132 Ibid., p. 12.<br />

133 Ibid., p. 28.<br />

134 Ibid., p. 94.<br />

135 Ibid., p. 20-21.<br />

136 Ibid., p. 69.<br />

137 Ibid., p. 55.<br />

78

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!