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Tese Delson Biondo.pdf - Universidade Federal do Paraná

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treinamento, política, temperamento e muitas outras variáveis” 117 . Por conseguinte,<br />

a tonalidade político-ideológica da ironia também é muito instável, poden<strong>do</strong> adquirir<br />

matizes conserva<strong>do</strong>res, autoritários e excludentes tanto quanto nuances<br />

provocativas, subversivas e críticas:<br />

para cada maneira de descrever o funcionamento da ironia existem<br />

avaliações diferentes [...] A retórica de aprovação e desaprovação assume<br />

muitas formas [...] e não pode ser nunca reduzida a nenhuma divisão<br />

política bem ordenada entre direita e esquerda, conserva<strong>do</strong>ra e<br />

revolucionária. Isso faz parte da natureza transideológica da ironia: pessoas<br />

de todas as inclinações políticas reconhecidamente aprovam e condenam<br />

seu uso. 118<br />

A voz narrativa pre<strong>do</strong>minante em O tetraneto del-rei possui um tom de<br />

burla que permeia to<strong>do</strong> o texto e possibilita ao literato paraense manter seu espírito<br />

crítico e sua atitude sarcástica sempre presentes. O narra<strong>do</strong>r, fugaz e mutável,<br />

assemelha-se a uma máscara frouxa que deixa entrever o sorriso irônico <strong>do</strong><br />

ficcionista. A onisciência <strong>do</strong> narra<strong>do</strong>r ultrapassa os limites <strong>do</strong> verossímil. Está tão<br />

cola<strong>do</strong> ao Torto no século XVI e, ao mesmo tempo, tão ata<strong>do</strong> a Harol<strong>do</strong> Maranhão<br />

no século XX que, ao permitir que os <strong>do</strong>is se expressem em primeira pessoa, acaba<br />

misturan<strong>do</strong> as memórias de ambos. Por seu relato fluem personagens e vozes<br />

fantasmagóricas que às vezes o atormentam e o confundem. Não consegue<br />

distinguir o discurso próprio <strong>do</strong>s discursos alheios e, na dúvida, acaba executan<strong>do</strong><br />

uma verdadeira antropofagia intertextual. Amante das belas citações, das frases<br />

feitas, <strong>do</strong>s provérbios, <strong>do</strong>s circunlóquios, das metáforas e <strong>do</strong> estilo barroco, entrega-<br />

se com freqüência aos prazeres de uma poética <strong>do</strong> escrever longo e tortuoso.<br />

Estratégia comum em metaficções históricas contemporâneas, os<br />

anacronismos estão a serviço de um mo<strong>do</strong> irônico de ler. É o caso, por exemplo, da<br />

apropriação paródica de textos de diferentes épocas cronológicas para recompor<br />

uma história ocorrida na primeira metade <strong>do</strong> século XVI e <strong>do</strong>s encontros impossíveis<br />

entre personagens verídicos cujas vidas, entretanto, nunca poderiam se cruzar<br />

(como as <strong>do</strong> Torto e de Camões).<br />

Também é o caso de uma inversão histórica proposital que pode ser<br />

negligenciada numa primeira leitura. Voltemos às linhas que abrem o romance:<br />

“Causou não pequeno reparo o haver-se posto à vela rumo a terras inda tão mal<br />

117 Ibid., p. 75.<br />

118 Idem.<br />

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