Tese Delson Biondo.pdf - Universidade Federal do Paraná
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forma “quanto mais o contexto é compartilha<strong>do</strong>, em menor quantidade e menos<br />
óbvios são os marca<strong>do</strong>res necessários para sinalizar – ou atribuir – ironia.” 115<br />
A comunicação irônica é antes de tu<strong>do</strong> um meio de interação social, uma<br />
forma de permitir intercâmbios de valores, crenças, expectativas e suposições,<br />
elementos que preexistem em determinadas comunidades e que vamos aprenden<strong>do</strong><br />
a compartilhar na medida em que passamos a fazer parte delas. Cada um de nós<br />
participa concomitantemente de múltiplas comunidades, virtuais ou concretas.<br />
Comunidades são mo<strong>do</strong>s dinâmicos e reconfiguráveis de nos agruparmos, isto é,<br />
esferas ou ambientes aos quais nos associamos, ou somos associa<strong>do</strong>s, segun<strong>do</strong><br />
uma vasta gama de fatores (biológicos, econômicos, lingüísticos, geográficos,<br />
políticos, sociais, etc.). Esses fatores, que em geral são capazes de nos<br />
interconectar, também costumam servir para nos diferenciar:<br />
A coisa importante que se deve entender é que to<strong>do</strong>s vivemos em muitas<br />
comunidades discursivas ao mesmo tempo: simultaneamente eu sou ítalocanadense,<br />
professora, católica não praticante, branca, mulher, classe<br />
média, esposa, mas não mãe, pianista inepta mas entusiástica, ciclista<br />
ávida, amante de ópera. Qualquer desses itens poderia ser a base para<br />
uma comunidade discursiva que me permitiria partilhar com alguém<br />
conhecimento e informação prévia para decidir sobre a apropriabilidade<br />
assim como a existência e interpretação da ironia. 116<br />
Interpretar um enuncia<strong>do</strong> irônico não é simplesmente inferir o contrário<br />
daquilo que foi dito. Também não é apenas decodificar uma mensagem truncada. O<br />
funcionamento da ironia exige a participação ativa <strong>do</strong> interpreta<strong>do</strong>r. Este, movi<strong>do</strong><br />
pelas expectativas das coletividades de que faz parte, deve estar predisposto a<br />
captar (ou atribuir) intenção irônica, ser capaz de elaborar algo que não foi dito e<br />
jogá-lo contra aquilo que foi dito, dar-se conta de um confronto de forças (um jogo<br />
inevitável de poder) entre <strong>do</strong>is ou mais significa<strong>do</strong>s, intenções e participantes<br />
(ironista, intérprete, possíveis alvos) e, por fim, extrair um julgamento moral dessas<br />
oscilações de acor<strong>do</strong> com certos interesses pessoais e grupais.<br />
Tu<strong>do</strong> isso ajuda a configurar o cenário político dentro <strong>do</strong> qual a ironia pode<br />
ser percebida e interpretada. As reações que ela provoca – da indiferença ao<br />
comprometimento total, da raiva e desconforto ao deleite e bem-estar – são sempre<br />
inconstantes e imprevisíveis, pois dependem “de coisas como gosto, hábito,<br />
115 Ibid., p. 38.<br />
116 Ibid., p. 149. (grifos da autora)<br />
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