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Tese Delson Biondo.pdf - Universidade Federal do Paraná

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cômicas e lúdicas, podem ser vistas como meio de difamar o gosto por longos<br />

retratos genealógicos, como crítica indireta ao lega<strong>do</strong> humano e cultural <strong>do</strong>s<br />

portugueses e ainda como tentativa irônica de questionar nossas origens ou de<br />

resgatar a multidão ignota de nossos antepassa<strong>do</strong>s. Quem são, quem foram, o que<br />

representaram e fizeram esses ilustres desconheci<strong>do</strong>s da História? 90<br />

Outro procedimento ficcional característico é a forma como Harol<strong>do</strong><br />

Maranhão costuma parodiar a si mesmo dentro de suas obras, crian<strong>do</strong> a ilusão de<br />

que é um personagem ou de que pertence ao mun<strong>do</strong> das narrativas. 91 Acredito que<br />

essa estratégia possa servir, em parte, para questionar sua identidade, legitimar sua<br />

imagem pessoal, disfarçar uma autocrítica ou realizar uma censura indireta aos seus<br />

detratores.<br />

Atente-se para o tom (ao mesmo tempo humorístico, pejorativo e autocrítico)<br />

<strong>do</strong>s jogos paródicos cria<strong>do</strong>s pelo escritor em torno a sua pessoa e ao seu nome.<br />

Primeiro em O tetraneto del-rei, quan<strong>do</strong> Jerónimo, num <strong>do</strong>s delirantes encontros<br />

com Camões, corrige o amigo deste mo<strong>do</strong>: “E que bizarro apeli<strong>do</strong> é tal, o que me<br />

acrescentais ao meu! Maranhão? De maranhas não sei nem delas cui<strong>do</strong>, meu bom<br />

Camões.” 92 Depois em Cabelos no coração, quan<strong>do</strong> o personagem histórico<br />

Filippe Patroni, indigna<strong>do</strong> com os comentários satíricos e as revelações mal<strong>do</strong>sas <strong>do</strong><br />

narra<strong>do</strong>r, resolve endereçar-lhe uma carta intimidante, forçan<strong>do</strong>-o a rever sua<br />

postura:<br />

Ao Snr. Harald Maranhão, irritativo cidadão <strong>do</strong> Pará.<br />

Estou aqui a bem considerar que não parece mesmo ter boa vontade com a<br />

minha pessoa. [...] eu bem o acompanho, de lupa à mão, <strong>do</strong> que anda a<br />

tratar sobre mim e os meus [...] me vejo compeli<strong>do</strong> a dirigir-me a vosmecê,<br />

intiman<strong>do</strong>-o a ater-se aos regra<strong>do</strong>s costumes. É pessoa de levantar<br />

malévolas suspeitas, e infundadíssimas. [...] São aleivosias e maquinações<br />

mal maquinadas, com que pretendeu atrevidamente bulir em matérias<br />

defesas, nas quais não haveria que estar a meter-se, se fosse pessoa de<br />

bem acerta<strong>do</strong>s procedimentos e não iníquo e ímpio, coliga<strong>do</strong> ao diabo<br />

anticristo, peteiro, refalsa<strong>do</strong>, língua impura. 93<br />

A manipulação <strong>do</strong> gênero epistolar com finalidade paródica é um <strong>do</strong>s<br />

expedientes de auto-reflexividade discursiva que o leitor tende a reconhecer com<br />

90 É irônico perceber que, num plano referencial paralelo, o trecho cita<strong>do</strong> nos remete imediatamente<br />

a nomes que recordam algumas das principais amizades cultivadas pelo autor: Benedito Nunes,<br />

Francisco Paulo Mendes e Max Martins.<br />

91 Numa de suas novelas, o escritor chegou a ficcionalizar a própria morte: MARANHÃO, Harol<strong>do</strong>. A<br />

morte de Harol<strong>do</strong> Maranhão. São Paulo: GPM, 1981. p. 47-79.<br />

92 MARANHÃO, Harol<strong>do</strong>. Op. cit., 1988. p. 102.<br />

93 MARANHÃO, Harol<strong>do</strong>. Cabelos no coração. Rio de Janeiro: Rio Fun<strong>do</strong>, 1990. p. 149-150.<br />

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