Tese Delson Biondo.pdf - Universidade Federal do Paraná
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dentro <strong>do</strong> humor satírico. A sátira, para fazer jus à etimologia da palavra, continua<br />
sen<strong>do</strong> uma grande miscelânea de temas, uma mistura de assuntos áci<strong>do</strong>s, picantes<br />
e deleitosos que nos deixam literalmente satura<strong>do</strong>s.<br />
Romances satíricos modernos, ao estilo de O tetraneto del-rei, guardam<br />
muitas semelhanças com as sátiras menipéias, que realizavam uma combinação<br />
habili<strong>do</strong>sa de episódios humorísticos com atitudes sérias e cínicas, até mesmo<br />
agressivas, e conjugavam assuntos risíveis, fantásticos ou grotescos com as<br />
amarguras <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> real, as mazelas <strong>do</strong> cotidiano e uma série de idéias abstratas e<br />
conflituosas. Entre os temas que geram comicidade nesse romance de Harol<strong>do</strong><br />
Maranhão, também merecem destaque:<br />
A loucura ou a insensatez <strong>do</strong>s homens – seres ator<strong>do</strong>a<strong>do</strong>s que a to<strong>do</strong><br />
momento se autoconfessam, não conseguem evitar a exposição de suas<br />
alucinações, cometem to<strong>do</strong> tipo de desvario e ajudam a criar um verdadeiro mun<strong>do</strong><br />
de desastres:<br />
Seria um <strong>do</strong>u<strong>do</strong>? Um <strong>do</strong>u<strong>do</strong> a mais a atravessar-se-lhe o caminho! Aos<br />
<strong>do</strong>u<strong>do</strong>s, temia-lhes os rompantes [...] No mais, é bela a <strong>do</strong>udice, o <strong>do</strong>ura<strong>do</strong><br />
chispar <strong>do</strong>s olhos <strong>do</strong>s dementes. A loucura povoa a mente <strong>do</strong>s heróis e <strong>do</strong>s<br />
santos, <strong>do</strong>s que vão à frente, aos outros arrastan<strong>do</strong>. 65<br />
O choque de culturas – não apenas entre coloniza<strong>do</strong>res e indígenas, suas<br />
diferenças raciais, de idioma e de costumes, mas também o abismo socioeconômico<br />
e humano entre fidalgos e plebeus, entre a cultura letrada <strong>do</strong>s gentis-homens, <strong>do</strong>s<br />
bem-nasci<strong>do</strong>s, e a ignorância bruta da escória portuguesa (de seus solda<strong>do</strong>s e<br />
marinheiros):<br />
Ven<strong>do</strong> o branco leso, e como dele ninguém cuidasse, achou o Torto de sua<br />
conta disso tratar.<br />
— És português?<br />
— E fodi<strong>do</strong>. 66<br />
As batalhas – os preparativos, os basti<strong>do</strong>res, as tramóias políticas, as<br />
conseqüências e ramificações de uma guerra longamente anunciada, no entanto,<br />
jamais decretada, que se pratica sempre à surdina, como gesto de desforra ou<br />
vingança. Guerra de nervos, de palavras, de provérbios; batalhas sexuais e também<br />
65 MARANHÃO, Harol<strong>do</strong>. Op. cit., 1988. p. 162.<br />
66 Ibid., p. 179.<br />
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