Tese Delson Biondo.pdf - Universidade Federal do Paraná
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textos sérios e a “reescritura bufa das obras-primas consagradas” 8 são poderosas<br />
armas de riso mediante as quais “os grandes assuntos tornam-se minúsculas<br />
farsas” 9 , perturba-se a gravidade <strong>do</strong>s grandes temas, transforman<strong>do</strong>-se um objeto<br />
antes intocável num motivo bem prosaico ou banal, reduzin<strong>do</strong>-se, assim, os espaços<br />
ocupa<strong>do</strong>s pelo sagra<strong>do</strong>.<br />
Parece que me<strong>do</strong> e riso seguem caminhos paralelos na história da evolução<br />
da sensibilidade humana. 10 Provocar o me<strong>do</strong> com propósito humorístico, a fim de<br />
se obter <strong>do</strong>s demais uma boa e sonora gargalhada, pode contribuir para dissipar<br />
nossos temores, afastar os maus presságios, afugentar nossos demônios, minimizar<br />
os perigos e as ameaças que nos espreitam, enfim, infundir-nos autoconfiança.<br />
Quan<strong>do</strong> se ri de algo amedronta<strong>do</strong>r, adquire-se a sensação de que ele foi, de certa<br />
forma, debilita<strong>do</strong>, como se o me<strong>do</strong> se tornasse menos importante ou deixasse, por<br />
um momento, de existir.<br />
Na maioria das vezes, encontramos no humor um meio muito eficaz e<br />
socialmente aceito de ocultar uma inverdade ou de exprimir o inconfessável. Sob o<br />
disfarce de recreação inofensiva, escritores de todas as épocas, artistas, palhaços e<br />
bufões utilizaram constantemente a cumplicidade <strong>do</strong> humor para escapar à censura,<br />
ao despotismo ou à vigilância moral. Os antigos bobos <strong>do</strong> rei, por exemplo, tinham o<br />
privilégio de dizer cinicamente, e bem alto, o que toda a corte pensava baixinho. 11<br />
É provável que nosso senso de humor seja um <strong>do</strong>s mecanismos instintivos mais<br />
eficientes desenvolvi<strong>do</strong> para que possamos detectar uma desonestidade: “com<br />
extraordinário faro, ele descobre o engano <strong>do</strong>s ideais artificiais e a falta de<br />
sinceridade <strong>do</strong> entusiasmo simula<strong>do</strong>. Poucas coisas neste mun<strong>do</strong> são tão<br />
irresistivelmente cómicas como a revelação desta espécie de fraude.” 12 Se é rin<strong>do</strong><br />
que se dizem as verdades, também é rin<strong>do</strong> que se mascaram ou se encobrem<br />
muitas mentiras, que se constatam pequenas farsas ou se evidenciam certos<br />
estereótipos.<br />
O ser humano é capaz de rir daquilo que diz respeito ao seu próprio ego, de<br />
se auto-ridicularizar. Por exemplo, risos introspectivos de autocomiseração podem<br />
8 Ibid., p. 394.<br />
9 Idem.<br />
10 GUREVICH, Aaron. Bakhtin e sua teoria <strong>do</strong> carnaval. In: BREMMER, Jan; ROODENBURG,<br />
Herman. (Org.). Uma história cultural <strong>do</strong> humor. Rio de Janeiro: Record, 2000. p. 86.<br />
11 MINOIS, Georges. Op. cit., p. 289.<br />
12 LORENZ, Konrad. A agressão: uma história natural <strong>do</strong> mal. Santos: Livraria Martinsfontes<br />
Editora, 1973. p. 299.<br />
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