14.04.2013 Views

Tese Delson Biondo.pdf - Universidade Federal do Paraná

Tese Delson Biondo.pdf - Universidade Federal do Paraná

Tese Delson Biondo.pdf - Universidade Federal do Paraná

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

dejaron las palabras.” 4 São as palavras que escaparam das bocas <strong>do</strong>s<br />

conquista<strong>do</strong>res, que se infiltraram e se cristalizaram na linguagem proverbial e nos<br />

textos literários, que o autor de O tetraneto del-rei recolhe, abraça e entesoura. A<br />

literatura é para ele um valor, talvez o mais alto, por isso o herói haroldiano corre<br />

diretamente de encontro a ela, na ânsia de pilhá-la.<br />

O desejo, consciente ou não, de transmitir e reforçar determina<strong>do</strong>s valores é<br />

tão flagrante em literatura que muitas de suas técnicas retóricas, elaboradas no<br />

intuito de enlaçar e envolver o leitor, são como atalhos que conduzem a um só<br />

caminho, como pequenos afluentes que desembocam to<strong>do</strong>s num mesmo rio, são<br />

impulsos forneci<strong>do</strong>s ao leitor para fazê-lo chegar aos momentos cruciais da<br />

narrativa, atingir o topo das emoções e poder comungar, por um instante que seja,<br />

com os valores propugna<strong>do</strong>s pelo autor implícito. As sociedades humanas parecem<br />

prever, permitir e exigir das obras ficcionais esse tipo de comportamento. Através da<br />

ficção, reforçam-se mais facilmente certos valores, em parte porque as técnicas<br />

empregadas não se apresentam como argumentos, às vezes nem são sentidas<br />

como tal; elas conseguem disfarçar o ato persuasivo, iludir e confundir a mente,<br />

prolongar sensações e criar experiências psíquicas (memoráveis e impactantes) que<br />

estimulam as consciências a aderir e concordar sem vacilar.<br />

O humor não exclui o valor, pelo contrário, quan<strong>do</strong> a ficção cômica<br />

evidencia, questiona e ridiculariza os valores, pode vir a torná-los ainda mais<br />

intensos. Os satiristas têm um desejo enorme de ensinar e moralizar através <strong>do</strong> riso.<br />

Para isso não hesitam em impressionar nossa vontade e alterar o nosso gosto. Se o<br />

gosto é um retrato de nossas hierarquias de valores, para modificá-lo será preciso<br />

mudar os valores ou, então, a forma como hierarquizamos esses valores. O satirista<br />

não suporta a impassibilidade, a inércia mental (e cultural) <strong>do</strong>s indivíduos, por isso é<br />

capaz de provocá-los insistentemente, de injuriá-los e atacá-los, se for o caso, até<br />

que se consiga o efeito ou a ação desejada.<br />

A obsessão da sátira pelos exotismos (absur<strong>do</strong>s, aberrações, caricaturas,<br />

desvios, estereótipos, perversidades, vícios e circunstâncias fora de padrão) não é<br />

gratuita. Aquilo que foge à regra consegue tornar mais visível a própria regra, o que<br />

escandaliza pode criar o ridículo, e o ridículo é uma das principais maneiras de<br />

deixar à mostra certas opiniões socialmente aceitas (ou reprimidas) e de evidenciar<br />

4 NERUDA, Pablo. Confieso que he vivi<strong>do</strong>. In: ______. Obras Completas V: Nerudiana dispersa II<br />

1922-1973. Barcelona: Galaxia Gutenberg: Círculo de Lectores, 2002. p. 455.<br />

174

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!