Tese Delson Biondo.pdf - Universidade Federal do Paraná
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apenas e tão-somente como a busca da beleza. Não consigo entender o prazer<br />
estético da escrita como mero prazer estático, para mim ele é antes de tu<strong>do</strong> um<br />
importante e hábil mecanismo de persuasão, portanto, merece ser estuda<strong>do</strong> e<br />
analisa<strong>do</strong> como tal. Os estu<strong>do</strong>s de Chaïm Perelman sobre a retórica persuasiva<br />
alertam para algo aparentemente óbvio, mas muitas vezes negligencia<strong>do</strong>: que as<br />
figuras retóricas aptas a produzir beleza são poderosas estratégias de<br />
convencimento, justamente porque possuem a capacidade de dissimular o ato<br />
persuasivo, fazen<strong>do</strong> com que não consigamos mais enxergá-las como argumentos.<br />
Assim, quan<strong>do</strong> uma idéia qualquer é transmitida com esmero através de uma figura,<br />
tornamos-nos, enquanto especta<strong>do</strong>res, muito mais suscetíveis de concordar com<br />
essa idéia, muito mais predispostos a darmos nossa adesão a essa idéia.<br />
A chamada nova retórica perelmaniana aporta noções que me parecem<br />
extremamente significativas para reavaliarmos melhor a função <strong>do</strong>s discursos<br />
literários, discursos que, segun<strong>do</strong> o filósofo, são responsáveis por reforçar a<br />
comunhão <strong>do</strong> auditório em torno de certos valores comunitários, responsáveis por<br />
garantir a adesão <strong>do</strong>s indivíduos a certas hierarquias valorativas, sejam elas mais ou<br />
menos convencionais e aceitas ou intencionalmente inova<strong>do</strong>ras e contestatórias.<br />
As sátiras se valem de uma espécie de pedagogia da irreverência para<br />
evidenciar quaisquer transgressões aos valores sociais e freqüentemente para<br />
fortalecer esses mesmos valores. Outras vezes, porém, as sátiras utilizam a retórica<br />
<strong>do</strong> riso para contestar a supremacia de certos valores ou propor modificações na<br />
forma como costumamos hierarquizá-los.<br />
Como a ironia, o riso tem sempre uma rebarba, uma aresta de<br />
agressividade. Rir pode ser um mo<strong>do</strong> de intimidar o interlocutor e, ao mesmo tempo,<br />
de aliciá-lo. Sob muitos aspectos, o riso é um méto<strong>do</strong> efetivo de adesão (adesão<br />
intelectual, emocional e sobretu<strong>do</strong> moral). Quan<strong>do</strong> rimos, partilhamos informações,<br />
crenças e valores tácitos com aquele que produziu a dicção cômica. Quan<strong>do</strong> rimos<br />
entramos em conluio com o autor, assim, nos espaços silenciosos abertos por ele,<br />
como diria Wayne C. Booth, experienciamos o prazer de decifrar, de colaborar e de<br />
comungar secretamente com os seus valores. 1<br />
O auditório que ri, da mesma forma que o auditório que vaia, que aplaude ou<br />
ovaciona, é um auditório em flagrante esta<strong>do</strong> de comunhão, de comunhão intelectual<br />
1 BOOTH, Wayne C. A retórica da ficção. Lisboa: Editora Arcádia, 1980. p. 314-323.<br />
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