Marcus Tulius Franco Morais O FASCÍNIO DA FILICIDA - PGET ...
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teatro Edgar Gross cuspiu fogo e quis destruir a edição (o que<br />
posteriormente seria levado a cabo por soldados da SS); para Emil<br />
Faktor, redator-chefe do diário “Berliner Börsen-Courier”, a obra de<br />
Jahnn era um “soco contra os bons costumes e a tradição”; Franz<br />
Servaes, dramaturgo, jornalista e crítico de teatro da “Vossische<br />
Zeitung”, referiu-se ao Pastor falando de “desnudamento da alma”;<br />
Oskar Loerke, poeta do Expressionismo e do Mágico Realismo,<br />
perambulou semanas sentindo os membros lassos e um fogo queimando<br />
as próprias vísceras. Alfred Döblin, escritor que trinta anos mais tarde<br />
convidaria Jahnn para participar da fundação da Academia das Ciências<br />
e da Literatura, em Mainz, disse, em 1923, que não havia na literatura<br />
alemã nada mais expressivo atravessando esses novos e contraditórios<br />
tempos. Ainda segundo palavras de Döblin, estava livre dos grilhões “o<br />
gigante do entre-guerras”, cuja aparição ele, diferentemente da “matilha,<br />
que acreditava ter direito de me espancar” (Jahnn, 1932), deu-lhe as<br />
boas-vindas. Perplexidade, perturbação e revolta marcaram a obra<br />
dramática desse homem setentrional.<br />
Depois de concluir suas duas próximas peças, O médico, sua<br />
mulher, seu filho (Der Arzt / sein Weib / sein Sohn, 1922), e O Deus<br />
roubado (Der gestohlene Gott, 1924), Jahnn transpõe sua constelação<br />
dramática para a tragédia grega e escreve Medeia, situada numa Grécia<br />
cultivada, com organização patriarcal e sóbria de poder. Medeia reclama<br />
de Jasão o amor incondicional, mas Jasão a recusa; no abandono, ela<br />
libera sua revolta passional contra o mundo grego endurecido pela<br />
normalidade e nacionalismo.<br />
A revolta passional de rituais violentos, que Jahnn anteriormente<br />
apresentara contra o poder enclausurado na razão, é agora estrangulada<br />
pelo ódio que se descarrega sadicamente no Outsider. O “coro dos<br />
linchadores” sabe o que significa queimar seres humanos, arrancar<br />
testículos, abrir entranhas de animais, fazer experimentos em<br />
laboratório. Uma morte nova estende-se exigindo cada vez mais vítimas.<br />
A morte individual torna-se supérflua; em vez disso, reina a morte<br />
automática. Contra a morte abundante, que dança nas filas, aparece o<br />
castigo desastroso da normalidade – uma confrontação, o centro da<br />
reflexão de Jahnn na peça Nova dança da morte de Lübeck (Neuer<br />
Lübecker Totentanz) escrita em 1931.<br />
Em 1933, Jahnn, na mira do Nacional-Socialismo, deixa a<br />
Alemanha em direção a Zurique. Lá escreve o mais exaltado dos seus<br />
dramas: Pobreza, riqueza, ser humano e animal (Armut, Reichtum,<br />
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