novo presidente, velha miséria - Centro de Documentação e ...
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Pág.6 De2embro/89 - Janeiro/90 Jornal Maioria Falante<br />
A Esquerda que o Negro quer<br />
/\ concepção <strong>de</strong> alguns sociólogos, a partir <strong>de</strong> um distanciamento brecthianiano<br />
é a <strong>de</strong> ser o Brasil, a "Belíndia", ou seja, uma mistura <strong>de</strong> "Bélgica" e "índia", on<strong>de</strong><br />
uma parte é branca e rica e a outra, não branca e miserável. Logo, po<strong>de</strong>-se afirmar que<br />
o escravocrata, mesmo <strong>de</strong>stituído pelo liberalismo industrial, orientou a realida<strong>de</strong> da<br />
"fndia", pelo simples fato <strong>de</strong> que tanto o escravocrata quanto o liberalismo industrial,<br />
discriminavam os não brancos.<br />
por Togo lomba<br />
A esquerda atual é bisneta do libera-<br />
lismo, mentor do projeto racial-econômi-<br />
co que privilegiou a mão-<strong>de</strong>-obra branca<br />
operariado importado — em <strong>de</strong>trimento<br />
<strong>de</strong> um projeto social mais amplo, capaz<br />
<strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r também a população negra,<br />
saída da escravidão.<br />
O movimento negro daquela éjKKa,<br />
teve projetado alguns nomes como José<br />
do Patrocínio, Luiz Gama, enquanto a<br />
maioria continuou comprimida nos saco-<br />
lões da <strong>miséria</strong>. Como se po<strong>de</strong> ver, na<br />
confrontação entre escravocratas e libe-<br />
rais quem saiu per<strong>de</strong>ndo foram os negros,<br />
índios, mestiços e os brancos pobres,<br />
na época uma espécie <strong>de</strong> "inocentes<br />
úteis" do expansionismo europeu.<br />
Agora, 100 anos <strong>de</strong>pois da Proclamação<br />
da República, após o jejum presi<strong>de</strong>ncial<br />
pelo voto direto <strong>de</strong> 29 anos, tivemos<br />
mais um confronto: Luís Inácio Lula<br />
da Silva (esquerda) versus Collor <strong>de</strong><br />
Mello (direita) ou ainda, o branco nor-<br />
<strong>de</strong>stino, filho da "fndia", contra o<br />
branco carioca, filho da "Bélgica". De<br />
um lado, o branco pobre, torneiro me-<br />
cânico, garantindo o sucesso do instru-<br />
mento i<strong>de</strong>ológico do industrialismo, (sin-<br />
dicato) contando com o apoio das forças<br />
liberals-progressistas, inclusive da igreja<br />
daTeologia da Libertação. Do outro lado,<br />
o branco rico, nível <strong>de</strong> escolarida<strong>de</strong> su-<br />
perior, apoiado pelos ex-escravocratas e<br />
com o respaldo da igreja da teologia da<br />
dominação. Neste embate, a propaganda<br />
capitalista, faturou a ocasião <strong>de</strong>mocrá-<br />
tica, resgatando o discurso da revolução<br />
do operariado, não por conta do socia-<br />
lismo europeu, mas por obra das matrei-<br />
rices do capitalismo. Paralelo à isso,<br />
como se fosse uma oferta <strong>de</strong> verão, o<br />
noticiário da mídia dos megabanqueiros<br />
internacionais, divulgaram com estarda-<br />
lhaço os resultados eleitorais da elite<br />
negra americana, ganhando prefeituras<br />
e governos estaduais nos E.U.A., ou pro-<br />
palando a capitulação dos países socia-<br />
listas, diante da vitória do capitalismo<br />
mundial. Isso é que é. Junto a tudo<br />
isso, se constata que apesar das idéias <strong>de</strong><br />
Leonardo Boff, ou Frei Beto, o Vaticano,<br />
continuará contabilizando o lucro polí-<br />
tico, <strong>de</strong>monstrando que a Igreja Católiica<br />
Apostólica Romana é tão <strong>de</strong>mocrática<br />
que convive com o antagonismo daTeo-<br />
logia da Libertação. Na verda<strong>de</strong>, a sis-<br />
temática da cultura dominante, tem asse-<br />
gurado a centralização da renda, da pro-<br />
dução, do consumo a da proprieda<strong>de</strong><br />
privada, em prejuízo das necessida<strong>de</strong>s<br />
vitais dos povos da "índia". À esta, cabe<br />
e nem sempre - apenas votar nas <strong>de</strong>cisões<br />
elaboradas pela "Bélgica", amenizadas<br />
pela representação <strong>de</strong> seus filhos mais<br />
prósperos, recém entrados nas regras do<br />
jogo da "Bélgica", ou contentar-se com<br />
o contrato social, dos assalariados, ter-<br />
mômetro ainda eficiente para subverter<br />
a <strong>de</strong>sobediência civil dos habitantes da<br />
"fndia".<br />
Como consolo a guerra entre Esquer-<br />
da X Direita, recuperou as perdas da<br />
mão-<strong>de</strong>-obra branca e barata, trazida no<br />
início do capitalismo, projetará novas<br />
elites, saídas da "índia", agora contando<br />
com a participação <strong>de</strong> índios, negros e<br />
mestiços, fortalecendo assim, as leis dos<br />
dominantes.<br />
O maquiavelismo da dominação i<strong>de</strong>o-<br />
lógica, arma outra cilada contra o incon-<br />
formismo da esquerda e do movimento<br />
negro, <strong>de</strong> tal maneira, que já se permite<br />
aos po<strong>de</strong>res judicial, legislativo e executi-<br />
vo, receberem até não brancos ou qual-<br />
quer outro <strong>de</strong>scontente, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que não<br />
se mu<strong>de</strong> as regras da peleja. Quem so-<br />
breviver verá.<br />
SOCIALISMO AFRO-INDfcENA<br />
O crime <strong>de</strong> Zumbi e <strong>de</strong> todos os<br />
quilombolas, foi o <strong>de</strong> tentarem criar<br />
estados in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes e com outras<br />
regras, que não as do mo<strong>de</strong>lo da cul-<br />
tura dominante.<br />
renda.<br />
O comuniano afro-<br />
A formulação das culturas<br />
afro-indígenas, ainda não mereceram o<br />
<strong>de</strong>vido respeito pelos intelectuais, tan-<br />
to da direita quanto da esquerda.<br />
O motivo é o puro preconceito<br />
etnocentrista, uma seqüela do expan-<br />
sionismo europeu dos séculos XIV<br />
XV... XXI(?)<br />
Por isso, ainda não foi possível<br />
pensar e elaborar um projeto social,<br />
on<strong>de</strong> a experiência da comunização<br />
dos quilombos, permitisse a socializa-<br />
ção dq bem estar comtemporâneo.<br />
Os afro-indigenas sabem que o dis-<br />
curso sobre a cidadania, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 26 <strong>de</strong><br />
agosto <strong>de</strong>. 1789, quando foi assinada a<br />
Declaração Universal dos Direitos <strong>de</strong><br />
Cidadania, na França, não passou <strong>de</strong><br />
Jogo <strong>de</strong> cena, beneficiando apenas a<br />
população branca. A responsabilida-<br />
<strong>de</strong> social do movimento negro, em<br />
particular é significativa porque é uma<br />
minoria organizada e politizada, com<br />
passagem comprada para o fechadís-<br />
simo clube da "Bélgica" e está éom o<br />
direito adquirido <strong>de</strong> falar em nome <strong>de</strong><br />
45% da população.<br />
Somente uma radical transforma-<br />
ção na estrutura cultural e econômica,<br />
po<strong>de</strong>ria igualar as condições da<br />
'índia", às da "Bélgica". Entretanto,<br />
seria possível a "índia" obter o mesmo<br />
estágio <strong>de</strong>senvolmcntista da "Bélgica",<br />
sem a castração sócio-econômica <strong>de</strong><br />
outros povos? Seria preciso criar filiais<br />
da "fndia", para garantir o mo<strong>de</strong>lo<br />
contemporâneo <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento?<br />
Por isso, o movimento negro, poten-<br />
cialmente ao lado do movimento in-<br />
dígena e sem terras, significam a<br />
ponta <strong>de</strong> lança do oprimido.<br />
É justamente aí, on<strong>de</strong> resi<strong>de</strong> a ques-<br />
tão: o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong>mocrático por represen-<br />
tação nos mol<strong>de</strong>s atuais, tem fabricado<br />
elites e provocado cada vez mais o distan-<br />
ciamento da massa. Há ainda que supe-<br />
rar os ranços conservadores na compre-<br />
ensão racial da esquerda clássica; mesmo<br />
a igreja progressista, ainda não aproxi-<br />
mou-se do movimento negro, fora <strong>de</strong> sua<br />
própria sacristia. São inúmeros os <strong>de</strong>sdo-<br />
bramentos que po<strong>de</strong>rão ser extraídos da<br />
peleja esquerda X direita.<br />
Estes questionamentos são vitais para<br />
os próximos anos e tanto os militantes<br />
partidários, como os militantes em geral,<br />
<strong>de</strong>verão respon<strong>de</strong>r: como elevar a condi-<br />
ção <strong>de</strong> vida dos povos da "índia", com<br />
os riscos previsíveis para a "Bélgica"?<br />
Um outro dado possível <strong>de</strong> ser utiliza-<br />
do pelos i<strong>de</strong>ólogos, po<strong>de</strong> ser constatado<br />
no livro "Política e Relações Raciais",<br />
da autora Ana Lúcia E.F. Valente/<br />
FFLCH/USP-SP, on<strong>de</strong> a escritora <strong>de</strong>-<br />
núncia que "o prestígio <strong>de</strong>ntro do mo-<br />
vimento negro, dá prestígio no partido e<br />
vice-versa". Por isso, como os movi-<br />
mentos tidos como específicos, vão no<br />
roldão da dinâmica da socieda<strong>de</strong>, tem<br />
levado muitos militantes, <strong>de</strong>vido ao maior<br />
apelo promocional, para a estrutura e dis-<br />
ciplina partidária. ^