novo presidente, velha miséria - Centro de Documentação e ...
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Maria Tereza Ni<strong>de</strong>lçoff, educadora argentina, inicia um<br />
diálogo com os mestres, educadores e professores; co-<br />
loca e distingue a questío do "mestre-policial" ou<br />
"mestre-povo" e a polêmica existente entre uma atitu<strong>de</strong> *'poli-<br />
cialesca e castradora" <strong>de</strong> ensino ou uma criativa <strong>de</strong> "engaja-<br />
mento" na cultura do educando. £ um trabalho consciente das<br />
atuais mudanças nos relacionamentos professor aluno do ensi-<br />
no <strong>de</strong> primeiro grau dos setores menos privilegiados. Livro diri-<br />
gido principalmente àqueles que atuam em favelas, bairros ope-<br />
rários e periferia, questiona os.métodos do ensino vigentes.<br />
Fala-se muito sobre a necessi-<br />
da<strong>de</strong> <strong>de</strong> cooperação entre pais e<br />
mestres. Na prática, no entanto,<br />
as relaçOes muitas vezes estSo<br />
freqüentemente longe <strong>de</strong> serem<br />
harmônicas.<br />
Muitos professores se quei-<br />
xam da incompreensão dos pais.<br />
E muitos pais emitem juízos<br />
pouco favoráveis em relaçío aos<br />
.mestres <strong>de</strong> seus filhos.<br />
Quais sío os motivos <strong>de</strong>ssa<br />
falta <strong>de</strong> entendimento?<br />
Além das razOes que po<strong>de</strong>ría-<br />
mos chamar <strong>de</strong> psicológicas - li-<br />
gadas aos distintos papéis que<br />
pais c mestres têm diante das<br />
crianças e as maneiras diferentes<br />
<strong>de</strong> vc-las —. existem também ra-<br />
zões <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m sócio-cultural li-<br />
gadas à forma <strong>de</strong> interpretar a<br />
realida<strong>de</strong> social c histórica.<br />
Muitos dos atritos provem da;<br />
atitu<strong>de</strong>s que os mestres adotan<br />
diante dos pais. nos bairros ondi<br />
trabalham. Detrás <strong>de</strong>ssas atitu<strong>de</strong>;<br />
encontra-se uma tomada <strong>de</strong> pusi<br />
çfo diante da realida<strong>de</strong>, uma ma<br />
neira <strong>de</strong> ver a socieda<strong>de</strong> c sua:<br />
classes. Às vezes, trata-se <strong>de</strong> pos<br />
tura nío conscientemente assu<br />
midas; mas <strong>de</strong> fato, existe um:<br />
<strong>de</strong>finição implícita em suas cx<br />
pressões e atos.<br />
Quais sío as <strong>de</strong>finições i<strong>de</strong>c<br />
lógicas que caracterizam o qu<br />
po<strong>de</strong>mos chamar <strong>de</strong> um "pre<br />
fessor policial"?<br />
"— Mudaram a fulana par<br />
a escola tal..."<br />
"— Coitada. ... Essa escol<br />
tem uma fama."<br />
As expressões típicas "esce<br />
Ias <strong>de</strong> boa fama" e "escolas d<br />
má fama", conforme sejam es-<br />
colas <strong>de</strong> classe média ou mais<br />
(on<strong>de</strong> os professores preferem<br />
trabalhar) ou <strong>de</strong> classe baixa<br />
(on<strong>de</strong> eles lamentam ter que le-<br />
cionar), tudo isso supõe uma<br />
postura i<strong>de</strong>ológica: a i<strong>de</strong>ntifica-<br />
ção com as classes e a cultura<br />
dominantes.<br />
Essa opção costuma estar<br />
camuflada, <strong>de</strong> forma que não<br />
seja advertida em toda a sua<br />
crueza: trabalhar nas escolas<br />
<strong>de</strong> "má fama" é "<strong>de</strong>salentador",<br />
os pais são "ignorantes", "não<br />
se preocupam", "não colabo-<br />
ram", etc...<br />
Além disso, po<strong>de</strong> haver com-<br />
paixão pelas condições <strong>de</strong> vida<br />
das crianças.<br />
Mas a opção pelo dominador<br />
ou — o que dá ao mesme — o<br />
ato <strong>de</strong> encolher os ombros ante<br />
a sorte do oprimido, <strong>de</strong> fato res-<br />
pon<strong>de</strong>m a outras atitu<strong>de</strong>s: não se<br />
vai até as raízes <strong>de</strong> situação; não<br />
se trabalha <strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro da escola<br />
Dezembro/89 - Janeiro/90<br />
Nossas relações com<br />
os pais <strong>de</strong> alunos<br />
para ajudar a tomar consciência<br />
<strong>de</strong> tal situação e suas causas;<br />
conünua-se acreditando que a<br />
solução é assimilar essas crianças<br />
às condições e à i<strong>de</strong>ologia da es-<br />
cola.<br />
Consi<strong>de</strong>ra-se a escola como<br />
algo apolítico, quer dizer, não se<br />
vêem as «onotações políticas <strong>de</strong><br />
seus conteúdos e <strong>de</strong>. sua organi-<br />
zação.<br />
Tal postura acrítica, frente a<br />
i<strong>de</strong>ologia que a escola transmite,<br />
converte o professor — ainda que<br />
ele não queira — num instrumen-<br />
to do opressor para manter a do-<br />
minação sobre os setores mais<br />
pobres, já que se transformou<br />
num dos principais difusores da<br />
i<strong>de</strong>ologia da classe dominante.<br />
— Sua mentalida<strong>de</strong> classe mé-<br />
dia impe<strong>de</strong>-o <strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar os<br />
pais dos alunos como compa-<br />
nheiros trabalhadores. Também<br />
lhe é difícil sentir-se a si mesmo<br />
como trabalhador. No geral, ten-<br />
<strong>de</strong> a supervalorizar seu papel <strong>de</strong><br />
"apóstolo", mas um apóstolo<br />
"incompreendido".<br />
Sente que seu trabalho é mui-<br />
to sacrificado, e que esse sacrifí-<br />
cio não é valorizado pelos pais<br />
<strong>de</strong> seus alunos - e se esquece<br />
que essas pessoas trabalham em<br />
condições e horários excessiva-<br />
mente duros, sem serem reco-<br />
nhecidas.<br />
Também se sente injustiçado<br />
quanto à responsabilida<strong>de</strong> que<br />
seu trabalho supõe - mas na prá-<br />
tica, essa responsabilida<strong>de</strong> não é<br />
assumida com profundida<strong>de</strong><br />
diante dos alunos, na medida em<br />
que ele se limita a fazer o míni-<br />
mo exigido.<br />
O fato <strong>de</strong> não se consi<strong>de</strong>rar<br />
como um trabalhador a mais da-<br />
lhe um ar <strong>de</strong> superiorida<strong>de</strong> dian-<br />
te dos pais.<br />
Mais do que no trato indivi-<br />
dual <strong>de</strong> professor a pai, a rela-<br />
ção mais plena entre o professor<br />
e os pais trabalhadores dar-se-á<br />
na relação professor-classe ope-<br />
rária em luta pela libertação dos<br />
oprimidos, através <strong>de</strong> dois ca-<br />
minhos: o mestre cidadão e -o<br />
mestre sindicalista.<br />
Aqui seria necessário per-<br />
guntar ao professor se, em seu<br />
compromisso político, está jun-<br />
to ao povo, se está trabalhando<br />
para construir a socieda<strong>de</strong> nova<br />
e liberada, se está possibilitando<br />
— fora das ativida<strong>de</strong>s escolares<br />
- o surgimento da nova escola<br />
com que sonha.<br />
É claro que tal postura con-<br />
tradiz o apoliticismo que al-<br />
guns querem dar à profissão<br />
<strong>de</strong> professor:<br />
- porque, perceber que a<br />
socieda<strong>de</strong> impe<strong>de</strong> o pleno <strong>de</strong>-<br />
senvolvimento humano <strong>de</strong> seus<br />
alunos e não trabalhar para<br />
mudar as circunstâncias <strong>de</strong>ssa<br />
socieda<strong>de</strong>, seria prova <strong>de</strong> muito<br />
pouco amor aos alunos:<br />
— porque as melhores inten-<br />
ções <strong>de</strong> renovar a escola se cho-<br />
cam contra as barreiras da sub-<br />
alimentação, da habitação pre-<br />
cária, da falta <strong>de</strong> material para<br />
trabalhar, etc...<br />
— porque — c isso é muito<br />
importante — o apoliticismo do<br />
professor toma-se anti-educati-<br />
vo, se consi<strong>de</strong>rarmos a impor-<br />
tância <strong>de</strong> um mestre como ima-<br />
gem do homem, na gestação das<br />
atitu<strong>de</strong>s dos alunos.<br />
No nível <strong>de</strong> professor sindica-<br />
lista, ele será "professor-povo"<br />
na medida em que não se isole<br />
nas reivindicações meramente<br />
salariais, e não apenas entre edu-<br />
cadores; antes dos salários <strong>de</strong>ve<br />
reivindicar a escola do povo e<br />
integrar sua ação nas lutas da<br />
classe trabalhadora.<br />
Texto do livro "UMA ESCOLA<br />
PARA O POVO" - Maria<br />
Teresa Nidclcoff - (pág. 96)<br />
Editora Brasilicnsc - 16. a Ed -<br />
1983.<br />
As esquerdas e a<br />
<strong>de</strong>mocracia<br />
por Carlos Emilio Viegas<br />
Fica evi<strong>de</strong>nte que as<br />
esquerdas, hoje no<br />
Brasil, ainda pous-<br />
suem uma gran<strong>de</strong> dificulda<strong>de</strong><br />
em lidar com a <strong>de</strong>mocracia.<br />
Isto se dá em função do pró-<br />
prio processo histórico e a<br />
puerilida<strong>de</strong> que se refletem na<br />
ação das esquerdas além, é<br />
claro, <strong>de</strong>las se sentirem como<br />
um estranho num ninho que é<br />
este complexo sistema cons-<br />
truído pelos nossos quatro<br />
séculos <strong>de</strong> vida e aprofundado<br />
pela ditadura militar nas últi-<br />
mas décadas.<br />
Terminadas as apurações<br />
do I. 0 turno po<strong>de</strong>mos tirar<br />
algumas conclusões tais como<br />
o fato do discurso revolucio-<br />
nário, <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminados seto-<br />
res das esquerdas, ter ficado<br />
trancado nas gavetas dos<br />
"aparelhos".<br />
É claro também que o Leo-<br />
nel Brizola <strong>de</strong>sponta como a<br />
gran<strong>de</strong> li<strong>de</strong>rança nacional (pe-<br />
la esquerda) e que o Partido^<br />
dos Trabalhadores indubita-<br />
velmente prima pela organiza-<br />
ção, até porque oi. 0 turno<br />
possibilitou um mapeamento<br />
Pág. 11<br />
Enfim, coloca-se diante<br />
das esquerdas uma esfinge:<br />
"Ou se <strong>de</strong>cifra este enigma<br />
(a questão da UNIDADE) ou<br />
seremos todos <strong>de</strong>vorados".<br />
Quanto aos revolucionários,<br />
po<strong>de</strong>m <strong>de</strong>s<strong>de</strong> já pensar na or-<br />
ganização do seu próximo<br />
evento: "Uma guerra <strong>de</strong> ma-<br />
mona com seus bodoques".<br />
E, se ficarem zangados, nos<br />
encontraremos no próximo<br />
Congresso da CUT para o<br />
enterro dos ditos grupelhos<br />
i<strong>de</strong>ológico-eleitoral do país.<br />
Vença ou perca, a candidatu-<br />
ra LULA, o qge po<strong>de</strong> ficar <strong>de</strong><br />
mais importante nestas elei-<br />
ções é o MARCO ZERO DA<br />
CONSTRUÇÃO DA UNIDA-<br />
DE DAS ESQUERDAS. Po-<br />
<strong>de</strong>rão então as esquerdas<br />
"palmar <strong>de</strong>mocraticamente"<br />
a nação, a partir das eleições<br />
<strong>de</strong> 1990, "tomando" os prin-<br />
cipais estados brasileiros e se<br />
fortalecendo no Legislativo,<br />
isto se a serieda<strong>de</strong> se sobrepu-<br />
ser ao sectarismo.<br />
- CARLOS EMÍLIO DE<br />
NAZARÉ GÓES VIEGAS<br />
Professor <strong>de</strong> Matemática<br />
e Músico.<br />
Reflexões quilombolas<br />
em um estado <strong>de</strong><br />
calamida<strong>de</strong> pública<br />
por Togo lomba<br />
O acúmulo <strong>de</strong> renda, o<br />
controle da produção<br />
e o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> consumo,<br />
contribuíram para a formação<br />
<strong>de</strong> uma oligarquia hereditária,<br />
branca, cristã e proprietária. Es-<br />
ta minoria dominante, <strong>de</strong>termi-<br />
na há quatrocentos anos a cons<br />
trução <strong>de</strong> dois brasis: Um, ex-<br />
presso por um estado que se<br />
confun<strong>de</strong> com uma aristocracia<br />
etnocêntrica. O outro, represen-<br />
tado por uma pluralida<strong>de</strong> cultu-<br />
ral — <strong>de</strong> maioria afro-brasileira —<br />
significando povos, cujo traço<br />
comum é a exploração secular a<br />
que estão submetidos os não<br />
brancos, pelos proprietários da<br />
oitava economia mundial.<br />
Deste modo, os discursos do<br />
tipo "comunida<strong>de</strong> nacional" ou<br />
"<strong>de</strong>mocracia racial" não bastam<br />
para abafar a realida<strong>de</strong> dos ex-<br />
clu<strong>de</strong>ntes dos direitos <strong>de</strong> cidada-<br />
nia. Po<strong>de</strong>-se dizer que o sonho li-<br />
beral nascido em 26 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong><br />
1779, na Assembléia dos Estados<br />
Gerais da França, com a Declara-<br />
ção Universal dos Direitos do Ci-<br />
dadão, quando invadiu a Casa<br />
Gran<strong>de</strong> e a Senzala, não foi sufi-<br />
ciente para evitar que hoje, 101<br />
anos após a Abolição, ainda o<br />
povo negro continue em luta pa-<br />
ra ter os seus direitos garantidos.<br />
Os eventos da liberda<strong>de</strong>, igual-<br />
da<strong>de</strong> e fraternida<strong>de</strong>, entraram<br />
em calmaria, diante do genocí-<br />
dio das nações indígenas, <strong>de</strong>ixan-<br />
do duzentos e vinte mil índios a<br />
questionarem a tutela do Estado<br />
com direito a folclorização, ou a<br />
ren<strong>de</strong>r-se à or<strong>de</strong>m e ao progres-<br />
so, assumindo o papel social <strong>de</strong><br />
cidadãos, mas <strong>de</strong> terceira catego-<br />
ria.<br />
Estas questões não se esgota-<br />
rão, enquanto o lidar com a coi-<br />
sa pública se resumir na fabrica-<br />
ção <strong>de</strong> um exército cultural <strong>de</strong><br />
reserva, atenuado por represen-<br />
tações do oprimido, legitimando<br />
apenas a estrutura coercitiva dos<br />
donos dos negócios e <strong>de</strong> algumas<br />
almas.