MEDIAÇÃO SETEMBRO 2009 FINAL.p65 - Colégio Medianeira
MEDIAÇÃO SETEMBRO 2009 FINAL.p65 - Colégio Medianeira
MEDIAÇÃO SETEMBRO 2009 FINAL.p65 - Colégio Medianeira
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
evista de educação editada e<br />
produzida pelo colégio medianeira<br />
Diretor<br />
Pe. Rui Körbes, S.J.<br />
Vice-diretor<br />
Prof. Adalberto Fávero<br />
Coordenador Administrativo e Financeiro<br />
Gilberto Vizini Vieira<br />
Coord. Comunitário e de Esporte<br />
Prof. Francisco Alexandre Faigle<br />
Coordenação Editorial<br />
Nilton Cezar Tridapalli<br />
Luciana Nogueira Nascimento<br />
(MTB 2927/82v)<br />
Revisão<br />
Nilton Cezar Tridapalli<br />
Projeto Gráfico e Diagramação<br />
Sonia Oleskovicz<br />
Ilustrações<br />
Jessica Candal<br />
Ulisses Candal<br />
Sonia Oleskovicz (tratamento e edição)<br />
Colaboraram nesta edição<br />
Adilson Felício Feiler, SJ, Ana Paula Ferreira<br />
da Luz, Carlos Renato Moiteiro, Claudio<br />
Adriano Piechnik, Elenir Almeida Santos,<br />
Francisco Carlos Rehme, Geraldo Vieira de<br />
Magalhães, Guilherme Dal Moro, Leandro<br />
Guimarães, Mábile Borsatto, Marcelo Weber,<br />
Maria Célia Martirani, Patrícia Meyer, Rita<br />
Waldrigues e Vinícius Soares Pinto.<br />
Tiragem<br />
3000 exemplares<br />
Papel<br />
Reciclato Suzano 90g/m2 (miolo)<br />
Reciclato Suzano 240 g/m2 (capa)<br />
Número de Páginas<br />
52<br />
EQUIPE PEDAGÓGICA<br />
Educação Infantil e Ensino<br />
Fundamental de 1ª à 4ª séries<br />
Coordenadora<br />
Profª Silvana do Rocio Andretta Ribeiro<br />
Ensino Fundamental de 5ª e 6ª séries<br />
Coordenadora<br />
Profª Eliane Dzierwa Zaionc<br />
Ensino Fundamental de 7ª e 8ª séries<br />
Coordenadora<br />
Profª Roberta Uceda<br />
Ensino Médio<br />
Coordenador<br />
Prof. Marcelo Pastre<br />
Coordenador de Pastoral<br />
Pe. Guido Valli, S.J.<br />
Coordenador de Midiaeducação<br />
Nilton Cezar Tridapalli<br />
Assessoria de Comunicação e Marketing<br />
Luciana Nogueira Nascimento<br />
Os artigos publicados são de inteira responsabilidade<br />
dos autores e não refletem necessariamente<br />
a opinião dos editores e do <strong>Colégio</strong><br />
Nossa Senhora <strong>Medianeira</strong>. A reprodução parcial<br />
ou total dos textos é permitida desde que<br />
devidamente citada a fonte e autoria.<br />
Linha Verde • Av. José Richa, 10546<br />
Prado Velho • Curitiba • Paraná<br />
fone 41 3218-8000/ fax 41 3218-8040<br />
www.colegiomedianeira.g12.br<br />
mediacao@colegiomedianeira.g12.br<br />
ISSN 1808-2564<br />
CRÔNICA<br />
Olhos que sobem ao céu e estrelas que caem<br />
Francisco Carlos Rehme ............................................................................................................... 5<br />
O melhor presente<br />
Geraldo Vieira de Magalhães ...................................................................................................... 8<br />
É tudo culpa do Altair!<br />
Leandro Guimarães ......................................................................................................................10<br />
A experiência transmidiática<br />
Vinícius Soares Pinto ..................................................................................................................13<br />
Novas expectativas em Tempos de Paz ou por um<br />
humanismo sempre em xeque<br />
Carlos Renato Moiteiro ................................................................................................................. 16<br />
Como Albert se tornou Einstein<br />
Guilherme Dal Moro ....................................................................................................................19<br />
Meu lixo, teu lixo, nosso lixo, lixo deles<br />
Cláudio Adriano Piechnik ...........................................................................................................24<br />
A idade do lixo<br />
Elenir Almeida Santos ................................................................................................................28<br />
O jornal educa?<br />
Patrícia Meyer ................................................................................................................................ 32<br />
Nietzsche e a meditatio generis futuri<br />
Adilson Felicio Feiler, SJ ...........................................................................................................36<br />
O leite da pedra<br />
Maria Célia Martirani ...................................................................................................................39<br />
Educação Artística crítica como desconstrução<br />
Ana Paula Ferreira da Luz ............................................................................................................42<br />
É tudo novo de novo. A dança do leva e traz<br />
Mábile Borsatto .............................................................................................................................45<br />
CRÔNICA<br />
Almôndegas<br />
Marcelo Weber ............................................................................................................................... 48<br />
CRÔNICA<br />
O atraso<br />
Rita Waldrigues .............................................................................................................................. 50<br />
3
4<br />
Lixo: seus léxicos e seus nexos<br />
Alguns assuntos vêm aparecendo constantemente<br />
na pauta das discussões contemporâneas. O lixo<br />
é um deles. E, de tanto aparecer, às vezes pode nos<br />
dar a impressão de que já sabemos tudo. Mas, assim<br />
como apenas ler as manchetes do jornal não nos<br />
garante a informação e o conhecimento, também é<br />
importante uma leitura mais detida sobre esse tema<br />
que é despejado e reciclado a todo instante nas páginas,<br />
nas telas, nas ondas.<br />
É que são muitas as nuances. Do comportamento<br />
individual à ação - ou inação - das grandes corporações,<br />
ou seja, da micro à macropolítica, a reflexão<br />
acerca dos rastros residuais que deixamos pelo mundo<br />
afora se torna uma questão de importância gigantesca<br />
dentro da consciência planetária que buscamos.<br />
Ao falar de resíduos, ou lixo mesmo, podemos<br />
pensar em lixo cultural (existe?), em lixo eletrônico,<br />
em lixo orgânico, reciclável, pessoas tratadas<br />
como lixo (resíduo, sobra sem serventia....) etc.<br />
Quando falamos de conhecimento em rede, percebemos<br />
que também as questões ligadas aos problemas<br />
ambientais não são ilhas, mas entrecruzamentos<br />
de fatos interligados. É por isso que o consumo das<br />
reluzentes vitrines, embora não aparente, pode ter relação<br />
com a sujeira do rio, escondido, obscuro, mal<br />
cheiroso... Também a tecnologia, com sua vertiginosa<br />
- e, vamos e venhamos, fascinante - corrida de aperfeiçoamentos<br />
ininterruptos, tornando as pessoas felizes<br />
e sorridentes com novos brinquedinhos diários, pode<br />
ter relação com a intoxicação de crianças nigerianas...<br />
Por tudo isso, achamos importante dar destaque ao<br />
tema do lixo nesta edição da Revista Mediação. O que<br />
podemos fazer individual e coletivamente? Acreditamos<br />
que a discussão exaustiva do assunto seja um<br />
começo necessário.<br />
Mas, como você já está acostumado a ler aqui, Mediação<br />
sempre fala de assuntos variados. As formas<br />
como a tecnologia muda o comportamento de crianças<br />
e jovens e suas implicações no jeito como a escola<br />
se relaciona com isso é um tema que mais uma vez<br />
marca presença aqui. Do campo das artes, uma reflexão<br />
sobre Artes Plásticas e Dança, numa busca de inovações<br />
na forma de ensinar e na própria linguagem artística.<br />
Inovações, no entanto, jamais desvinculadas do<br />
diálogo com elaborações teóricas e práticas anteriores<br />
- é bom que se diga.<br />
Um gênio, mesmo gênio, ainda é humano. Na trilha<br />
de eventos tão catastróficos quanto grandiosos,<br />
saiba mais sobre Albert Einstein, esse sujeito que<br />
modificou radicalmente a forma de compreendermos<br />
o universo. Três belas crônicas também são destaque<br />
desse décimo quarto número da revista: temos<br />
uma cronista apaixonada por ensinar, um cozinheiro<br />
que explica solenemente a importância das almôndegas<br />
na história da humanidade e um caçador de<br />
estrelas cadentes, sempre à espreita, pronto para surpreendê-las.<br />
O cinema aparece com dois artigos falando da vida<br />
por meio de filmes: "O leite de pedra", apresentando o<br />
lírico filme italiano Nuovo Mondo e "Novas expectativas<br />
em Tempos de Paz ou Por um humanismo sempre<br />
em xeque", comentando a produção nacional Tempos<br />
de paz, mote para uma reflexão sobre iluminismo, civilização<br />
e barbárie.<br />
Parece que foi hoje que Nietzsche escreveu sobre a<br />
educação escolar. Comprove isso ao ler o artigo de Adilson<br />
Felício Feiler, SJ.<br />
Apenas levar o jornal para a sala de aula garante<br />
criticidade ou algum diferencial didático? Saiba como<br />
o jornal pode e deve fazer parte das estratégias metodológicas<br />
e o que ele tem a oferecer tanto para<br />
ganhos pedagógicos quanto democráticos ("O jornal<br />
educa?").<br />
Por fim, comportamento familiar, nas palavras<br />
do psicólogo Geraldo Vieira de Magalhães, que fala<br />
da presença dos pais como o melhor presente para<br />
seus filhos.<br />
Esperamos sempre ansiosos pelo contato de nossos<br />
leitores. Não deixe de escrever e de compartilhar suas<br />
impressões sobre nossa revista. Você pode fazer isso escrevendo<br />
para mediacao@colegiomedianeira.g12.br. Outra<br />
opção para trocar ideias conosco é visitando nosso site<br />
(www.colegiomedianeira.g12.br) e nosso blog, que diariamente<br />
traz reflexões, debates, sugestões de eventos, vídeos,<br />
etc (http://midiaeducacao.wordpress.com).<br />
Aliás, a revista Mediação agora está também online.<br />
Basta acessar nosso blog!<br />
Formas de contato não faltam.<br />
Vamos conversando.<br />
Nilton Cezar Tridapalli<br />
mediacao@colegiomedianeira.g12.br
Por Francisco Carlos Rehme<br />
Longe de ser uma desafinação no concerto do céu,<br />
a passagem de um meteoro<br />
é mais um acorde elétrico<br />
um allegro de rock'n'roll<br />
em meio aos sons de violinos e cellos<br />
ou<br />
o absolutamente inusitado<br />
algo encontrável, quem sabe,<br />
num disco dos mutantes<br />
5
6<br />
Eram mais de nove horas e o fuso no campo<br />
me parece adiantado em umas duas horas.<br />
Anoitece mais cedo na área rural de Rio Negro,<br />
a noite se delonga e ela mesma se desdobra<br />
entre um dedo a mais de prosa e uns muitos<br />
goles sorvidos de mate. Escolhemos um descampado<br />
para olhar - eu e meus filhotes - para<br />
o céu espirrado de estrelas. Via Láctea esparramada,<br />
deitada no divã, cabeça suavemente<br />
descansada sobre travesseiros de nebulosas.<br />
O natal se aproximava e sempre achei que as<br />
Plêiades lembram um pequeno pinheirinho com<br />
lâmpadas pisca-pisca. Pois, eis que apontava<br />
para esse agrupamento de jovens estrelas taurinas,<br />
dizendo aos pequenos que elas são conhecidas<br />
como as Sete Cabritinhas, quando<br />
vimos passar uma estrela cadente. Para as<br />
crianças tremenda surpresa: Uau! tem estrela<br />
arisca que foge, sai correndo! Para mim, foi bem<br />
mais que apenas ver outra estrela cadente.<br />
É que, de repente, me acenderam as lembranças<br />
das imagens de dezenas de meteoros<br />
que vi, sobretudo entre os dezesseis e os vinte<br />
e poucos, quando olhava - e vivia - mais para<br />
o céu do que para o chão em que caminhava.<br />
O céu parecia que brincava de estátua<br />
comigo. Ah... quantas vezes ganhei, pois<br />
quando ele não aguentava mais uma coceirinha,<br />
pronto! Extravasava a noite num riso estourado,<br />
meio disfarçado, é verdade. Ou seja:<br />
lá vinha escorregando, veloz, a estrela cadente...<br />
Vitória dos meus olhos que quase não<br />
se deixavam piscar para poder surpreender<br />
esse deslize do firmamento. Firmamento? Firmamento<br />
que nada: Afrouxamento...<br />
Então, se armava um curto circuito entre<br />
meus olhos, o coração e o cérebro. Descargas<br />
de alta voltagem, sinapses endoidecidas que<br />
me disparavam uma taquicardia... E, no ritmo<br />
acelerado das sístoles e diástoles, acho que via<br />
até o que não era possível ou, quem sabe, o<br />
que não era permitido aos demais mortais. Via<br />
nada, absor(via) aquele momento tão íntimo -<br />
e, diga-se de PASSAGEM, nesse espetáculo da<br />
estrela cadente tudo é tão passageiro, tão es-<br />
petacular - do meteoroide, que é quando ele<br />
é incinerado na atmosfera. Divinos fogos de<br />
artifício! Ou seriam fogos de artifício divinos?<br />
Enquanto meus olhos fotograficamente flagravam<br />
o furtivo show, um nó me apertava a<br />
garganta. A gravata apertada não me deixava<br />
gritar aos outros "Olha: a estrela cadente!" O ar<br />
subitamente me faltava, como se tivessem me<br />
golpeado na boca do estômago, uma mistura<br />
de sensações: insegurança, fascínio, fragilidade...<br />
uma coisa, cuja fusão é apenas a sensação<br />
de se (vi)ver a passagem da estrela cadente.<br />
Talvez porque, no rastro de sua inflamada<br />
visita pelos nossos ares, está a dolorosa compreensão<br />
da finitude de tudo. Da minha finitude,<br />
por mais que me achasse imortal naqueles<br />
adolescentes idos, na finitude da vida<br />
na Terra - que outras estrelas cadentes, meio<br />
crescidinhas, já a andaram regulando -, na<br />
finitude do cosmos.<br />
Pois teve aquela estrela cadente que eu vi,<br />
quando estava no mar. Era no Mar de Fora, lá<br />
na Praia de Encantadas, na doce Ilha do Mel.<br />
Ela sobreviveu alguns segundos, descendo<br />
quase perpendicularmente à linha do horizonte,<br />
e descia como quem alertasse "sai de baixo!!!"<br />
E aí, quando ela parecia que ia mergulhar<br />
no veludoso, negro e prateado oceano, ela<br />
se partiu em duas. E as duas, cada qual foi
para um canto, entre elas um ângulo de uns<br />
sessenta graus, deram seu último suspiro -<br />
que é quando elas subitamente parecem brilhar<br />
mais - e aí se apagaram. Isso tudo a poucos<br />
milímetros do horizonte, ao menos para<br />
os meus olhos e de quem mais viu. Alguém<br />
mais viu? Por pouco não sai aquele vapor do<br />
mar, que é quando algo incandescente beija<br />
a água. Mas que naquela noite farelos, cinzas<br />
da estrela cadente pousaram e repousaram<br />
em algum lugar, ah... isso aconteceu. Pela<br />
direção, foi sobre a África...<br />
Tem umas estrelas cadentes que passam<br />
"horizontalmente" sobre nós - na realidade,<br />
descrevendo uma curva tangencial, superficial<br />
ao planeta, descrevendo uma parábo... - basta,<br />
às favas os geômetras! - essas não deviam se<br />
chamar "estrelas cadentes"... Afinal, não parecem<br />
cair, apenas passar. São as estrelas viajantes!<br />
Outro dia - melhor seria dizer "outra noite"<br />
-, estava em minha casa, que era a dos meus<br />
pais e dos quatro irmãos, na Hugo Simas, deitado<br />
de costas sobre a calçada, como tantas<br />
outras noites. Olho para cima, mas não fixando<br />
um ponto, relaxando as pupilas, seguindo uma<br />
metodologia de autoria própria para caçar estrelas<br />
cadentes. É como aquele paciente pescador<br />
que não precisa pregar a vista na boia<br />
para perceber que alguém, no caso um peixe,<br />
está engatado no anzol. Ele sente o puxão e,<br />
quase simultaneamente, o confirma ao verificar<br />
o remexer da boia. Pois senti que algo me<br />
chamava; na verdade, berrava, esbranquiçado<br />
e brilhante que era contrastando com a noite<br />
de lua nova. Despontava no horizonte e parecia<br />
decolar. "Nossa, uma estrela levante!" - devo<br />
ter pensado, quando virei o rosto para aquele<br />
lado e distingui o meteoro. Era um bólido. Daqueles<br />
que dava para chamar quem estivesse<br />
próximo e nem apontar precisaria, todos veriam.<br />
Toda a família, porém, estava dentro de<br />
casa. Enquanto passavam-se quatro, cinco, seis<br />
segundos, a estrela - cadente ou o que quer que<br />
fosse, de branco passava a avermelhada. Cada<br />
vez mais vermelha, encarnada, sangue no carpete<br />
negro da noite. Passou sobre o meu corpo<br />
que, ao contrário do astro celeste, jazia estático<br />
como nunca estivera. Foi aí que, ainda<br />
7<br />
hoje, duas décadas depois, juro ter ouvido o<br />
bólido chiar. Tssssss... exatamente o som de<br />
algo que passa, rasgando o ar, ardendo em chamas.<br />
Como as setas incandescentes daqueles<br />
filmes sobre as guerras medievais que sempre<br />
duravam cem anos (as guerras e às vezes os<br />
filmes também!). A tocha, depois de lançada<br />
pelo arqueiro a oeste, cruzou a abóbada celeste<br />
que eu podia vislumbrar e afogou-se no horizonte<br />
oriental, enrubescida, mais furiosa do<br />
que envergonhada. Confesso que esperei por<br />
um rápido clarão, vindo de uma explosão lá do<br />
seu sumidouro. Mas ele não veio. Pensando<br />
bem... ainda bem!<br />
Houve outras também fantásticas, como<br />
aquela que se insinuou por detrás de um fino<br />
nevoeiro que vestia o anoitecer curitibano.<br />
Mas, muitas das lembranças já me passam escorregadias<br />
e não as consigo segurar. Pensamentos<br />
fugazes, meteóricos.<br />
Quanto à estrela cadente de ontem, com o<br />
perdão da redundância, ela foi - e se foi - muito<br />
rápida. Não chegou a um segundo. Tão logo o<br />
céu a cuspiu, ele mesmo a tomou de volta. Saiu<br />
por uma janela, entrou por outra, no instantâneo<br />
acender e apagar de uma lâmpada no velho<br />
sobrado celeste. Minha mulher me pediu:<br />
"Rápido, faça um pedido!" Fiz, não tão rápido,<br />
mas fiz. Não sei se valeu: a estrela já tinha desaparecido<br />
no céu. Da minha memória, não.<br />
(Comente este artigo em<br />
mediacao@colegiomedianeira.g12.br)<br />
Francisco Carlos Rehme (o Chicho) é<br />
geógrafo, professor da 6ª série do Ensino<br />
Fundamental e da 3a. série do Ensino<br />
Médio no <strong>Colégio</strong> <strong>Medianeira</strong>. Especialista<br />
em Geografia Física - análise ambiental,<br />
pela UFPR, em Currículo e Pratica<br />
Educativa (PUC-Rio) e mestre em<br />
Geografia pela UFPR.<br />
7
8<br />
O melhor<br />
PRESENTE<br />
Por Geraldo Vieira de Magalhães<br />
Quando o melhor<br />
presente é a presença...<br />
As necessidades, cobranças e pressões dos<br />
dias atuais acarretam, via de regra, encontros mais<br />
espaçados e desencontros mais constantes.<br />
O cadenciado estudo básico e sequencial passa<br />
a concorrer com os mais variados tipos de cursos.<br />
Os já tradicionais requerem outros, em paralelo,<br />
suplementares ou complementares.<br />
A profissão, imprescindível, necessita da especialização,<br />
e esta requer aperfeiçoamento constante.<br />
O trabalho, fator de subsistência, exige maior<br />
conhecimento, e tem de recorrer a complementos<br />
diversos.
E a concorrência exige tempo, que se dilui,<br />
no daqui pra ali, no ali pra lá, de lá para<br />
acolá e, quem sabe, de acolá para outra necessidade.<br />
São as exigências do mercado... Profissional<br />
capacitado, possibilidades mais elevadas.<br />
Melhor salário almejado, maior o esforço<br />
a ser despendido. Pessoa mais escolarizada,<br />
melhores chances oportunizadas.<br />
É a concorrência pela abertura do próprio<br />
espaço. É a necessidade de novas chances de<br />
crescimento profissional e pessoal, de novas<br />
funções ou cargos. É a necessidade de mais<br />
conhecimento e melhor aperfeiçoamento.<br />
E tudo isso, ao ser alcançado, proporciona<br />
mais estabilidade, mais segurança e confiança,<br />
mais satisfação...<br />
Inserida nesse contexto, a família moderna<br />
se esforça pela manutenção do conquistado<br />
ou pelo alcance de determinado padrão.<br />
E na busca desses objetivos, uma subjetividade<br />
é esquecida. Uma subjetividade que<br />
não entende muito a ausência, a distância...<br />
É a subjetividade infantil, dos filhos... Que<br />
podem ganhar grande variedade de brinquedos,<br />
roupas, calçados e outras utilidades, mas<br />
que não se equivalem, no entanto, ao melhor<br />
presente: a presença dos pais...<br />
É a creche para alguns, a babá para outros.<br />
São atividades as mais diversas, que lhes<br />
são proporcionadas com o intuito de preencher<br />
o tempo, para acelerar a preparação e<br />
familiarizá-los com a competitividade... E, assim,<br />
tudo pode ser ofertado e acrescido às<br />
crianças, amenizando-lhes o afastamento;<br />
porém nada substitui os exemplos, a referência,<br />
os valores legados pelos pais...<br />
É certo que progresso, prosperidade, ascensão<br />
são aspirações do adulto, pensando<br />
também nos filhos. Mas que essas aspirações<br />
não impeçam os pais de se lembrar da festinha<br />
na escola, da brincadeira espontânea, da<br />
pergunta que não quer ficar sem resposta.<br />
Não podem ainda se esquecer do momento<br />
da historinha, do tempo de brincar juntos,<br />
pois a hora dedicada à criança no presente<br />
será uma herança inesgotável, com a qual os<br />
filhos muito se beneficiarão ao longo da vida.<br />
Criança quer e necessita de atenção, de<br />
ser ouvida e entendida. Precisa de carinho,<br />
diálogo e compreensão, como também de<br />
regras e limites, tão necessários ao seu desenvolvimento.<br />
E a presença, tanto materna<br />
quanto paterna, é fundamental para lhes orientar<br />
e proporcionar confiança no porvir, já<br />
que o melhor futuro é alicerçado e construído<br />
com o melhor presente, e o melhor presente<br />
para as crianças é a tão importante, e<br />
insubstituível, companhia dos pais.<br />
(Comente este artigo em<br />
mediacao@colegiomedianeira.g12.br)<br />
Geraldo Vieira de Magalhães é<br />
psicólogo (CRP 08/06392).<br />
gvm.vieira@terra.com.br<br />
GRANDES AMIGOS - PAIS E FILHOS<br />
CARMEN LÚCIA CAMPOS<br />
E NÍLSON JOAQUIM DA<br />
SILVA (ORGS.)<br />
Editora Panda Books<br />
AO livro 'Grandes Amigos - Pais<br />
e Filhos', organizado por Carmen<br />
Lucia Campos e Nilson Joaquim<br />
da Silva, reúne famosos<br />
nomes da literatura brasileira<br />
que relembram aqui episódios de<br />
suas vidas que mostram como<br />
é mágica essa ligação. São vinte<br />
textos em que jornalistas, escritores, esportistas e<br />
educadores abrem as portas de suas memórias para<br />
falar do sentimento maior que os une a quem lhes<br />
deu a vida ou àqueles que trouxeram novo sentido<br />
às suas existências. São histórias de cumplicidade,<br />
de alegria e de dor que, certamente, vão mexer com<br />
as suas lembranças e emoções mais profundas.<br />
9
10<br />
Por Leandro Guimarães
Sim, é culpa dele, o Altair. Ele nasceu em 1974<br />
e seus filhos hoje estão espalhados pelo mundo<br />
todo. Provavelmente um deles deve estar em seu<br />
quarto agora, ou na sala. Vemos em quase todos<br />
os escritórios também. A verdade é que o mundo<br />
não "roda" mais sem os computadores. Foi<br />
graças ao Altair - que poderia ser chamado de<br />
pai do computador pessoal - que o planeta dinamiza<br />
as relações entre os indivíduos, rege o mercado<br />
financeiro, ajuda nos trabalhos escolares.<br />
Enfim, uma gama imensa de atividades está atrelada<br />
à computação.<br />
Na realidade, o Altair nasceu de uma evolução<br />
somente possível por causa do desenvolvimento<br />
de um microprocessador chamado 8080,<br />
da Intel. Nosso colega tinha apenas 256 bytes de<br />
memória - uma piada, menos de 1 KB! Ah, mas<br />
vinha com uma placa de expansão para incríveis<br />
4 KB! Era vendido como um kit pela revista Popular<br />
Electronics. Em valores atuais, equivaleria<br />
a cerca de U$ 4.000,00. Mesmo sendo bem caro,<br />
muitos se interessaram.<br />
E esse nome? Por que Altair? Bem, um belo<br />
dia, seu desenvolvedor (Edward Roberts) mostrou<br />
a geringonça para sua filha e pediu para que<br />
sugerisse um nome. Ela estava assistindo ao famoso<br />
seriado Jornada nas Estrelas e, naquele<br />
episódio, a nave Enterprise (do lendário capitão<br />
Kirk) estava indo em direção a uma estrela chamada<br />
Altair (Altha Equilae).<br />
Aliás, o parto do Altair não foi dos mais fáceis.<br />
Sua procura, como já foi dito, era grande e<br />
o primeiro lote destes computadores foi enviado<br />
para Nova Iorque por meio de um empresa<br />
chamada Railway Express Agency (REA). O detalhe<br />
é que, durante o transporte, a REA entrou em<br />
greve, pois passava por sérios problemas econômicos.<br />
Acabou falindo e até hoje não se sabe<br />
onde foram parar os primeiros Altair da história.<br />
A gente sabe que computador sem software<br />
é o mesmo que carro sem roda. Nosso colega<br />
Ed Roberts sofria para melhorar a performance<br />
do Altair, até que certo dia recebeu uma carta<br />
sugerindo o uso de um sistema chamado BA-<br />
SICS. Essa carta havia sido escrita por dois jovens<br />
que trabalhavam juntos: Paul Allen e Bill<br />
Gates. Hoje, dizem que o primeiro trabalha em<br />
um empresa chamada Apple e o segundo faz uns<br />
bicos numa tal de Microsoft, conhece? Segundo<br />
as más línguas, os dois ganham uns belos trocados<br />
e até conseguem sustentar suas famílias por<br />
causa desse ramo chamado de computação!<br />
Realmente podemos perceber que o desenvolvimento<br />
da computação foi galopante. Hoje,<br />
muitos acreditam ser impossível a realização de<br />
determinadas atividades sem o uso de computadores.<br />
O resultado disso é uma produção mundial<br />
eletrônico-informática gigantesca, mas somente<br />
há poucos anos tem ocorrido uma preocupação<br />
maior com o descarte dos mesmos.<br />
Muitas vezes o lixo resultante acaba sendo enviado<br />
para nações em desenvolvimento, como<br />
China e Índia, principalmente para o reaproveitamento<br />
de alguns componentes. Na Índia, existem<br />
casos em que pessoas derretem a solda dos<br />
componentes eletrônicos (podendo conter substâncias<br />
tóxicas, como estanho e chumbo - sem<br />
nos esquecermos de outras presentes em diversos<br />
outros componentes, como o arsênio e o<br />
mercúrio) para posterior venda. Até aí tudo bem.<br />
O problema é que a falta de conhecimento sobre<br />
os riscos de contaminação pelos vapores<br />
Maçã não tão verde: garota chinesa segura um teclado da Apple nas mãos. A<br />
empresa de Steve Jobs foi eleita a "menos verde" no ranking do Greenpeace,<br />
que avalia redução de elementos tóxicos e políticas de reciclagem dos<br />
fabricantes. FONTE: IDGNow!<br />
11
12<br />
deste derretimento, aliada à necessidade econômica,<br />
levam a população a derreter estas<br />
substâncias na mesma panela em que depois<br />
irão fazer o preparo de suas refeições. Isso sem<br />
contar impactos de maiores dispersões, como a<br />
absorção de substâncias tóxicas pelo solo, poluição<br />
atmosférica de vapores, acúmulo do lixo<br />
impedindo escoamento de água em ambientes<br />
urbanos, dentre outros inúmeros impactos que<br />
merecem atenção.<br />
Fogo e fumaça: crianças em Lagos, Nigéria, se expõem inadvertidamente aos<br />
efeitos dos gases liberados na queima do lixo eletrônico enviado por países<br />
desenvolvidos. FONTE: IDGNow!<br />
Monitor quebrado: mulher prestes a esmagar tubo de raio catódico de um monitor<br />
com martelo para remover cobre. O vidro quebrado é jogado em canais de<br />
irrigação que deságuam nos lençóis freáticos, contaminando a água, em Guiyu,<br />
na China. FONTE: IDGNow!<br />
O grande direcionamento que a sociedade<br />
mundial precisa envolve uma alteração em relação<br />
ao comportamento de consumo e da reciclagem<br />
dos descartes (e também de como e por<br />
quem este processo é realizado). Quantas pessoas<br />
compram produtos eletrônicos hoje apenas<br />
por serem meras inovações tecnológicas ou apresentarem<br />
um novo design, ao invés da necessidade<br />
em si? É só observarmos o atual estágio<br />
de consumo de celulares e aparelhos de TV e<br />
mp3. Todos somos responsáveis e agentes deste<br />
processo.<br />
(Comente este artigo em<br />
mediacao@colegiomedianeira.g12.br)<br />
Leandro Guimarães é professor de<br />
Geografia das 8ª séries e 1° Ano do<br />
Ensino Médio do <strong>Colégio</strong> <strong>Medianeira</strong>. É<br />
Mestre em Geografia pela UFPR.<br />
A SOCIEDADE DA DECEPÇÃO<br />
GILLES LIPOVETSKY<br />
Autores Manole<br />
Este livro trata de uma sociedade<br />
que vive de excessos,<br />
tem mania de consumo e,<br />
ao mesmo tempo, desperdiça<br />
tudo o que é possível.<br />
Gilles Lipovetsky - criador<br />
do conceito de hipermodernidade<br />
para definir os tempos<br />
de hoje - explica porque<br />
a sociedade vive um momento<br />
tão triste, com elevados<br />
índices de suicídios,<br />
depressão e dependências<br />
diversas.
A experiência<br />
TRANSMIDIÁTICA<br />
Por Vinícius Soares Pinto<br />
A escola não precisa necessariamente fazer uma adaptação<br />
total àquilo que o ufanismo do mercado profetiza. No<br />
entanto, abrir os olhos para importantes mudanças de<br />
comportamento por causa das tecnologias deve ser um<br />
horizonte sempre presente.<br />
13
14<br />
Passou o tempo em que a contemplação de<br />
uma obra de arte ou de entretenimento resumiase<br />
à plataforma para a qual foi produzida. No<br />
caso das artes, as obras que se encontravam<br />
exclusivamente em galerias, museus e espaços<br />
nobres, passaram pelo processo de reprodutibilidade<br />
- fruto da cultura de massa - e hoje suas<br />
respectivas imagens são exibidas por diversos<br />
meios, sendo tanto em réplicas fiéis como em<br />
estampas de camisetas e canecas. Como diria o<br />
pensador alemão Walter Benjamin, a aura - aquele<br />
"quê" de especial - contida apenas nas obras<br />
originais é perdida progressivamente conforme<br />
o aumento do número de cópias, empobrecendo<br />
assim a experiência estética entre a<br />
obra e o espectador.<br />
Quando pensamos na cultura do entretenimento,<br />
também é possível identificar<br />
mudanças na maneira de interagir e lidar com<br />
as obras. Os ícones da cultura pop, que antes<br />
eram construídos passo a passo, de uma plataforma<br />
a outra, de acordo com a aceitação do<br />
público, hoje transformaram-se em avalanches<br />
de itens de consumo destinados a todos os<br />
bolsos e gostos. Por exemplo, um tempo atrás<br />
não era raro vermos personagens do universo<br />
infanto-juvenil aparecer, primeiramente, nas revistas<br />
em quadrinhos, para anos depois virarem<br />
desenhos, brinquedos, filmes etc, evoluindo de<br />
acordo com a aceitação do público. No entanto,<br />
para que hoje um filme, um personagem seja<br />
sucesso de aceitação do público, torna-se necessário<br />
oferecer ao espectador uma continuação,<br />
extensão da obra original em diversas<br />
outras plataformas. Perceba, simultaneamente<br />
a um grande lançamento da indústria hollywoodiana<br />
nos cinemas, uma série de outros<br />
produtos relacionados ao filme também é lançada,<br />
como brinquedos, camisetas, conteúdo<br />
online, jogos para videogame, ou seja, o máximo<br />
de informação possível para que a pessoa<br />
se torne uma fã e dedique tempo - e dinheiro<br />
- a essa nova franquia. Acontece então<br />
o que pensadores denominam de "Experiência<br />
Transmidiática", que é o contato do espec-<br />
tador com a obra/conteúdo por diferentes interfaces,<br />
acompanhando, interagindo e participando<br />
das histórias e conteúdos aos quais é submetido.<br />
A continuação e a extensão das obras em<br />
outras plataformas tornou-se praticamente uma<br />
obrigação para a aceitação do público, principalmente<br />
quando falamos de nativos digitais, já que<br />
não se contentam mais em sentar diante de uma<br />
tela e receber de maneira passiva uma história<br />
pronta e finalizada. Sendo assim, "roteiristas e<br />
outros criadores pensam na narrativa, hoje,<br />
em termos de criação de oportunidades para a<br />
participação do consumidor. Ao mesmo tempo,<br />
os consumidores estão utilizando novas tecnologias<br />
midiáticas para se envolver com o conteúdo<br />
dos velhos meios de comunicação, encarando<br />
a internet como um veículo para<br />
ações coletivas - solução de problemas, deliberação<br />
pública e criatividade alternativa"<br />
(JENKINS, <strong>2009</strong>).<br />
Bom, a partir desta breve descrição das relações<br />
entre obra e espectador deste início do<br />
século XXI, quero trazer a discussão para o ambiente<br />
escolar. Pensar no desafio que é para a<br />
escola também desenvolver estratégias pedagógicas<br />
que alimentem e saciem essa necessidade<br />
de nativos digitais de participarem de<br />
maneira direta e coletiva na construção do saber,<br />
através da utilização de diferentes linguagens<br />
e plataformas de comunicação. Talvez o<br />
primeiro passo a ser dado é a aceitação do professor<br />
- também conhecidos como imigrantes<br />
digitais - de que a tecnologia é um grande aliado<br />
das salas de aula, ainda mais diante de uma<br />
massa de alunos enfastiados por uma avalanche<br />
de informação recheada de simulacros.<br />
Então, o computador, a internet, as redes<br />
sociais, o vídeo, a imagem, quando aliados às<br />
discussões e conteúdos trabalhados em sala de<br />
aula, tornam-se ferramentas tecnológicas importantes<br />
para estimular o educando a produzir,<br />
pesquisar e construir o saber não apenas na sala<br />
de aula, local onde está sob interferência direta<br />
do professor, mas também fora do ambiente<br />
escolar. Faz com que o jovem, aluno, deixe de<br />
apenas flutuar no dilúvio de informação que a
internet e os meios de comunicação lhe proporcionam,<br />
e aprenda a usar as ferramentas que<br />
estão a sua disposição - enciclopédias online,<br />
ferramentas de busca, redes sociais, gadjets etc<br />
- realmente como utensílios de produção e orientação<br />
na geração e localização de conteúdo<br />
para discussão e pesquisa. O filósofo francês<br />
Pierre Lévy defende a ideia de que nesta realidade<br />
em que a informação e o conhecimento<br />
estão propagados e acessíveis na internet por<br />
diversos veículos eficientes, o papel do professor<br />
não é mais de ser apenas um difusor de conhecimento,<br />
mas um incentivador e mediador<br />
da aprendizagem e do pensamento coletivo<br />
entre seus alunos não só na sala de aula, mas<br />
também nesta nuvem de conhecimento chamada<br />
de internet.<br />
No entanto, o papel do professor de ser<br />
mediador e incentivador do aprendizado numa<br />
interface - computador/internet - na qual, muitas<br />
vezes, ainda não se sente à vontade, pode<br />
ser que seja encarado com dificuldade. Porém,<br />
a falta de domínio das ferramentas não pode ser<br />
vista como um entrave, mas uma oportunidade<br />
para iniciar a participação dos alunos - que geralmente<br />
têm mais facilidade com as novas tecnologias<br />
- na elaboração de atividades em conjunto<br />
com o professor. Desta forma, o processo<br />
de inteligência coletiva, que é característico<br />
pela troca de conhecimento entre pessoas para<br />
HOMO ZAPPIENS - EDUCANDO<br />
NA ERA DIGITAL<br />
BEN VRAKKING E WIM<br />
VEEN<br />
Editora Artmed<br />
a construção de um saber, tem início na própria<br />
sala de aula para depois estender-se em ambientes<br />
virtuais na rede de computadores.<br />
Portanto, para o ambiente escolar saciar e<br />
superar expectativas desses alunos super conectados<br />
- nativos digitais - que, apesar da facilidade<br />
em lidar com a tecnologia, encontram-se,<br />
muitas vezes, perdidos e sem saber como utilizar<br />
e usufruir de maneira inteligente e construtiva<br />
os recursos a que têm acesso, torna-se necessário<br />
que educadores se aproximem e entendam<br />
essa realidade de múltiplos meios e plataformas<br />
com que os jovens estão em contato<br />
a todo momento. Com isso, além do desafio de<br />
escolas buscarem o saber construído e fundamentado<br />
na busca da Transdisciplinariedade,<br />
torna-se também necessário pensar de maneira<br />
Transmidiática, ou seja, além de buscar o encontro<br />
e o diálogo entre as diferentes disciplinas<br />
para a formação do indivíduo, procurar formas<br />
que integrem a difusão desse conhecimento<br />
pelas diferentes interfaces que estão à disposição<br />
de educadores e educandos.<br />
(Comente (Comente este este este artigo artigo em<br />
em<br />
mediacao@colegiomedianeira.g12.br)<br />
mediacao@colegiomedianeira.g12.br)<br />
mediacao@colegiomedianeira.g12.br)<br />
Vinícius Soares Pinto é formado em<br />
Comunicação Social/Publicidade e<br />
Propaganda. No <strong>Medianeira</strong>, trabalha<br />
no Laboratório Audiovisual.<br />
CULTURA DA CONVERGÊNCIA<br />
HENRY JENKINS<br />
Editora Aleph<br />
Henry Jenkins investiga o alvoroço<br />
em torno das novas mídias<br />
e expõe as importantes<br />
transformações culturais que<br />
ocorrem à medida que esses<br />
meios convergem. Ele nos introduz<br />
aos fãs de Harry Potter,<br />
que estão escrevendo suas próprias<br />
histórias, enquanto os executivos<br />
se debatem para controlar<br />
a franquia. Ele nos mostra como o fenômeno<br />
Matrix levou a narrativa a novos patamares, criando<br />
um universo que junta partes da história entre filmes,<br />
quadrinhos, games, websites e animações.<br />
15
16<br />
Novas expectativas em<br />
Tempos de Paz ou<br />
por um humanismo<br />
sempre em xeque<br />
Por Carlos Renato Moiteiro<br />
A fronteira entre a civilização e a barbárie, no mundo<br />
contemporâneo, está bem visível diante de nossos<br />
olhos? Veja como fatos, atos, comportamentos podem<br />
nos fazer questionar a "civilização" na qual vivemos.
Admito que o tema iluminista de um processo<br />
civilizatório em transcurso histórico incessante<br />
sempre me incutiu várias sombras.<br />
Afinal, não posso deixar de lado tudo aquilo<br />
que aprendi de Hobbes (filósofo do século XVII,<br />
autor de O Leviatã) e de Rousseau (século XVIII,<br />
autor de Emílio, ou Da Educação) - o homem<br />
lobo versus o homem bom por natureza; o<br />
homem vassalo versus o homem livre; homens<br />
e mulheres, de certa forma, existentes em todos<br />
nós e, por isso, sempre em contraposição...<br />
Inda mais com a crítica severa dos frankfurtianos<br />
- tais como Theodor Adorno e Max Horkheimer<br />
(ambos sociólogos do pós-segunda guerra)<br />
- à falência dos ideais civilizatórios frente à<br />
barbárie humana, que a Europa e o mundo todo<br />
presenciaram tantas vezes no decorrer do século<br />
que Hobsbawm define como o mais curto<br />
e mais impetuoso da história. Mas não posso<br />
negar também que o filme Tempos de Paz, brilhantemente<br />
dirigido em toda sua carga emocional<br />
e afetiva por Daniel Filho, com interpretações<br />
intensas de Toni Ramos (no papel de um<br />
ex-oficial da polícia política de Getúlio Vargas)<br />
e de Dan Stulbach (na figura de um ex-ator<br />
polonês que tenta recomeçar a vida no Brasil<br />
como agricultor após os horrores da cruzada<br />
hitlerista) comoveu - no sentido de provocar<br />
um terremoto - minhas expectativas em relação<br />
a um humanismo possível em pleno século<br />
XXI, o século das tecnologias e da lógica do<br />
indivíduo "logado" no virtual do mundo.<br />
A ambiguidade do título desse diálogo<br />
com o caro leitor revela, por um lado, a<br />
antítese dos sentimentos por mim experimentados<br />
durante o filme, e, por outro,<br />
do agonismo entre os personagens<br />
centrais da narrativa, Segismundo, o exoficial,<br />
e Clausewitz, o ex-ator polonês.<br />
Ambos expatriados, não apenas de sua<br />
terra natal (como é o caso de Clausewitz,<br />
emigrante empobrecido tais como tantos<br />
outros que chegaram naquela época<br />
nos portos brasileiros, mas também o<br />
de Segismundo, migrante gaúcho em<br />
plena capital federal - à época, Rio de Janeiro),<br />
mas de muitas outras pátrias: a família, a vida,<br />
a arte... Ambos sem saber se reconhecerem no<br />
espelho das memórias perdidas e contadas...<br />
Expatriados de suas próprias lembranças, que<br />
já não são mais recordações (do latim re-cordare,<br />
trazer novamente ao coração), mas meras<br />
experiências vividas. "Eu não vivi, apenas<br />
estive presente", lembra com certa distância no<br />
olhar o polonês Clausewitz. "Eu não fiz por ser<br />
melhor ou pior que você, apenas porque cumpria<br />
ordens", rememora Segismundo com certa<br />
frieza na voz.<br />
Pensei então como o mundo pode ser bárbaro,<br />
sem necessariamente estar em guerra ou<br />
ter passado por uma... Pensei nos quase 20 mil<br />
jovens que morrem por causas violentas no<br />
Brasil por ano. Pensei em Curitiba, a cidade com<br />
o segundo maior índice de vitimização juvenil<br />
do país - 53% do total de homicídios, perdendo<br />
apenas para o Recife -, enquanto cidade<br />
onde as fronteiras entre civilização e barbárie<br />
parecem se perder cada vez mais. Pensei nas<br />
40 mil crianças que são abusadas sexualmente<br />
por ano só na região Sul... Nos 42 pais, mães<br />
ou irmãos que não voltam para casa nos finais<br />
de semana no Paraná, vítimas da violência no<br />
trânsito. Pensei que não estamos tão longe da<br />
barbárie o quanto pensávamos estar, e que talvez<br />
o projeto iluminista de liberté, égalité, fraternité<br />
continue sendo só para uma minoria de<br />
"esclarecidos". Estaria Hobbes correto em sua<br />
afirmação, homo homini lupus ("o homem é<br />
lobo do homem")?<br />
Mas a arte me "esclareceu". Não só a<br />
arte do dramaturgo Bosco Brasil, autor<br />
da peça teatral que inspirou o<br />
filme - de cujo nome original, Novas<br />
Diretrizes em Tempos de Paz,<br />
recordo a inspiração - e que já foi<br />
encenada nos palcos brasileiros pelos<br />
mesmos atores, mas sobretudo<br />
a arte de representar a própria arte,<br />
desse feito meta-artístico tão bem<br />
desenhado por Bosco Brasil: talvez<br />
apenas a arte possa arrancar,<br />
em dez minutos, lágrimas<br />
de quem se acostumou com a<br />
17
18<br />
frieza da barbárie-pão, dessa barbárie cotidiana<br />
que se faz companheira de todos nós...<br />
E entendi então como pode ser simples a<br />
arte. Apenas um gesto, uma fala, uma cena,<br />
uma ausência pode ser suficiente para fazer<br />
saltarem lágrimas aos corações entorpecidos!<br />
E talvez reste tão só àqueles que, como Drummond<br />
cantava em “Mãos Dadas”, não querem<br />
ser "poetas de um mundo caduco", a arte de<br />
construir um mundo novo, pela magia da palavra,<br />
pelas mãos dadas em roda, pelo ofício<br />
do poeta, pela eterna dialética entre razão e<br />
sensibilidade...<br />
"O tempo é a minha matéria, o tempo<br />
presente, os homens presentes, a vida<br />
presente"<br />
(Comente este artigo em<br />
mediacao@colegiomedianeira.g12.br)<br />
(Carlos Drummond de Andrade).<br />
REFERÊNCIAS<br />
ADORNO, Theodor W. Educação e emancipação. 2.<br />
ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2000.<br />
ANDRADE, Carlos Drummond de. "Mãos Dadas". In:<br />
Sentimento do mundo. São Paulo: Círculo do Livro,<br />
1995.<br />
HOBBES, Thomas. O Leviatã: ou a matéria, forma e<br />
poder de um Estado eclesiástico e civil. São Paulo:<br />
Martins Fontes, 2003.<br />
HOBSBAWM, Eric J. Era dos extremos: o breve século<br />
XX: 1914-1991. São Paulo: Companhia das Letras,<br />
1995.<br />
HORKHEIMER, Max. Eclipse da razão. 5. ed. São Paulo:<br />
Centauro, 2003.<br />
ROUSSEAU, Jean-Jacques. Emílio, ou Da educação.<br />
3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2004.<br />
Carlos Renato Moiteiro é professor de<br />
Filosofia e Sociologia do <strong>Colégio</strong> <strong>Medianeira</strong>.<br />
Graduado em Filosofia pela PUCPR,<br />
atualmente cursa o Mestrado em Filosofia<br />
também pela PUCPR e a graduação em<br />
Farmácia pela UFPR, desenvolvendo pesquisa<br />
sobre as relações entre a ética antiga e seus<br />
resgates contemporâneos, bem como na área<br />
de Bioética. Faz parte da RedBioética da<br />
Unesco como ex-aluno e atua na articulação<br />
arquidiocesana da Pastoral da Juventude<br />
Estudantil (PJE) em Curitiba. Página na web:<br />
www.blogdonatao.blogspot.com<br />
EDUCAÇÃO E EMANCIPAÇÃO<br />
THEODOR W. ADORNO<br />
Editora Paz E Terra<br />
Em Emancipação e Educação,<br />
Theodor W. Adorno reafirma<br />
sua importância na<br />
discussão de temas em favor<br />
da cultura e contra a 'falsa<br />
cultura'. Contrariando a imagem<br />
de um pensador denso<br />
e de difícil acesso, Adorno<br />
reúne ensaios arrebatadores e atuais como<br />
"O que significa elaborar Auschwitz" e "Elaborar<br />
o passado", considerados verdadeiras<br />
aulas de dialética, além de textos como "A<br />
filosofia e os professores" e "Tabus acerca do<br />
magistério", "Televisão e formação", "Educação<br />
contra a barbárie", entre outros.<br />
ECLIPSE DA RAZÃO<br />
MAX HORKHEIMER<br />
Editora Centauro<br />
As reflexões contidas neste livro<br />
buscam relacionar o impasse<br />
atual do pensamento filosófico<br />
com o dilema concreto<br />
das perspectivas humanas<br />
para o futuro. Os problemas<br />
econômicos e sociais da<br />
hora atual já foram ampla e<br />
completamente enfocados por outros escritores em<br />
diversos países. A abordagem deste livro é diferente.<br />
Seu objetivo é indagar desde dentro o conceito<br />
de racionalidade subjacente em nossa cultura<br />
industrial contemporânea, a fim de descobrir<br />
se esse conceito não contém falhas que, essencialmente,<br />
o tornam vicioso.
Como<br />
Albert<br />
EINSTEIN<br />
Por Guilherme Dal Moro<br />
se tornou<br />
Einstein foi o protagonista de grandes<br />
eventos da humanidade, alguns deles<br />
catastróficos, é verdade, mas também<br />
da construção de uma nova percepção<br />
sobre o Universo.<br />
19
20<br />
EEm 27 de abril de 1900, um dos mais famosos<br />
cientistas da época, o escocês Willian<br />
Thompson (Lord Kelvin), enviou ao Instituto de<br />
Física da Grã-Bretanha uma carta afirmando que<br />
a Física do século XIX havia esclarecido quase<br />
todos os mistérios científicos da natureza. Para<br />
ele, as recentes teorias sobre a termodinâmica e<br />
o eletromagnetismo estavam quase todas bem<br />
estabelecidas. Nesta carta, intitulada "Nuvens<br />
sobre as teorias dinâmicas de calor e luz" (Nineteenth-Century<br />
Clouds over the Dynamical Theory<br />
of Heat and Ligh), Lord Kelvin revelou que<br />
pouco havia ainda para ser descoberto a respeito<br />
dos fenômenos físicos naturais e fez alusão a<br />
somente dois problemas - nas teorias do eletromagnetismo<br />
e da termodinâmica - que ainda precisavam<br />
de melhores explicações: o primeiro referia-se<br />
a experimentos sobre a velocidade da<br />
luz e suas propriedades; o segundo sobre o calor<br />
emitido pelos corpos.<br />
Cinco anos após a publicação de Kelvin, um<br />
(até então) desconhecido Físico alemão, chamado<br />
Albert Einstein, com 26 anos, realizou um feito<br />
histórico para a ciência ao publicar quatro trabalhos<br />
fantásticos e completamente revolucionários<br />
na revista científica Anais de Física de Berlin<br />
(Annalen der Physik scientific jounal). Destes,<br />
três estavam diretamente associados às previsões<br />
de Kelvin, mas revelavam que ao invés de<br />
pequenas "nuvens que obscureciam a beleza e<br />
clareza das teorias eletromagnéticas e do calor",<br />
deveriam ser comparadas a dois grandes<br />
icebergs, de natureza ainda totalmente oculta.<br />
Em seu primeiro artigo,<br />
de 1905, o ano miraculoso<br />
(milagroso) de Albert<br />
Einstein, publicado em<br />
17 de março ("Um Ponto<br />
de Vista Heurístico Sobre<br />
a Produção e Transformação<br />
da Luz” - “On<br />
a Heuristic Viewpoint<br />
Concerning the Production<br />
and Transformation<br />
of Light"), sobre<br />
o efeito fotoelétrico,<br />
o físico alemão apresenta uma nova<br />
concepção a respeito das propriedades da luz.<br />
Até então, entendia-se que a luz possuía uma natureza<br />
puramente ondulatória, isto é, a luz era<br />
compreendida como uma onda, bem como<br />
aquelas produzidas na água quando deixamos<br />
uma pedra cair sobre sua superfície. Einstein não<br />
podia refutar a teoria ondulatória da luz, pois inúmeros<br />
fenômenos e experimentos eram somente<br />
compreendidos com o auxílio desta teoria. Por<br />
outro lado, o chamado efeito fotoelétrico, correspondente<br />
às faíscas produzidas por um objeto<br />
de metal dentro do forno de micro-ondas, não<br />
era bem contemplado pela teoria ondulatória.<br />
Com enorme coragem e ousadia, Einstein propôs<br />
uma compreensão revolucionária da luz, na<br />
qual sua natureza é formada por corpúsculos, ou<br />
pacotes de energia denominados quantum. Em seu<br />
entendimento, a luz ora se comporta como onda,<br />
ora como partícula, ou melhor, ela possui uma natureza<br />
dualística: a dualidade onda-partícula.<br />
O trabalho de Einstein forneceu elementos<br />
para a construção das bases da mecânica quântica,<br />
e deu subsídios para a ruptura da visão de<br />
precisão e localidade da mecânica de Newton.<br />
A mecânica quântica, que rege as leis da dinâmica<br />
do microcosmo (de átomos e moléculas),<br />
parecia um mundo fantasioso que Albert Einstein<br />
e outros cientistas acessavam. Neste mundo,<br />
as partículas, como elétrons, não poderiam<br />
ser localizadas com precisão absoluta. Esta perda<br />
de localidade deve-se a dois motivos: o primeiro,<br />
em acordo com o princípio da incerteza<br />
de Heisenberg, refere-se ao fato de que para a<br />
medida da localização do elétron a própria presença<br />
do instrumento de mensuração afeta o<br />
estado de localidade do elétron; o segundo se
deve ao princípio de De Broglie, e ao caráter de<br />
onda que as partículas assumem na mecânica<br />
quântica. Este segundo motivo, em particular,<br />
ressoou como um enorme absurdo que a mecânica<br />
quântica trazia à tona. A ideia de que não<br />
somente a luz, mas a própria matéria é uma mistura<br />
dualística de onda-matéria custou para ser<br />
aceita na comunidade científica, mesmo após<br />
experimentos que validassem a teoria.<br />
Embora Einstein tenha recebido o prêmio<br />
Nobel de Física em 1921 pelo seu trabalho sobre<br />
o efeito fotoelétrico, sua maior contribuição<br />
científica revelou-se no segundo artigo de seu<br />
ano milagroso, publicado em 30 de junho de<br />
1905 e intitulado "A Eletrodinâmica de corpos<br />
em movimento" ("On the Electrodynamics of<br />
Moving Bodies") e que originou o princípio da<br />
Relatividade Especial.<br />
O princípio da Relatividade está associado às<br />
realidades macrocósmicas, e passa a reger os<br />
fenômenos em que as grandes dimensões de<br />
espaço e de velocidade são observadas. Na teoria<br />
de Einstein, o tempo e o espaço não são mais<br />
propriedades absolutas da natureza, mas sim<br />
uma entidade contínua chamada tempo-espaço.<br />
O universo de Einstein não é tridimensional: consiste<br />
de três dimensões espaciais associadas a<br />
uma quarta dimensão, o tempo.<br />
Até mesmo a astronomia ganhou novo sentido<br />
com as novas interpretações que a relatividade<br />
proporcionou às propriedades da luz. As palavras<br />
do professor do Instituto de Física Universidade<br />
Federal do Rio de Janeiro, Luiz Davidovich,<br />
descreve precisamente as implicações das<br />
ideias de Einstein: "A luz que nos traz<br />
a imagem de uma estrela distante,<br />
pode ser a estrela de milhões de<br />
anos atrás; um acontecimento<br />
ocorrido na Terra há<br />
milhares de anos só agora<br />
poderia estar sendo presenciado<br />
por um observador em outro<br />
planeta, que, por conseguinte,<br />
o considera como um episódio atual.<br />
O que é hoje em nosso planeta,<br />
pode ser ontem num outro planeta, e<br />
amanhã em um terceiro, pois o tempo é<br />
uma dimensão do espaço, e o espaço é<br />
uma dimensão do tempo."<br />
Einstein propõe um novo entendimento da<br />
própria relação entre a matéria e o espaço. Para<br />
Newton, um objeto cai ao chão porque existe<br />
uma força gravitacional que o acelera e o faz cair.<br />
É assim que aprendemos quando estudamos a<br />
segunda lei de Newton, a lei das Forças, ou o princípio<br />
fundamental da dinâmica. Einstein, por outro<br />
lado, cria um novo conceito revolucionário<br />
para a gravidade, no qual a presença de um objeto<br />
produz modificações permanentes no espaço<br />
ao seu redor, provocando uma curvatura espacial.<br />
Isto é, a gravidade é resultado de uma deformação<br />
no espaço proporcionada pela presença<br />
de um objeto.<br />
Em "A inércia de um corpo depende de sua<br />
energia de repouso?" ("Does the Inertia of a<br />
Body Depend Upon Its Energy Content?"), publicado<br />
em 27 de Setembro, Einstein apresenta<br />
uma nova relação entre matéria e energia. Neste<br />
pequeno artigo de três páginas, ele demonstra<br />
a equivalência entre energia e matéria através<br />
sua mais famosa equação, E=mc2, na qual<br />
a energia de repouso de um corpo é proporcional<br />
a sua massa multiplicada pela velocidade da<br />
luz ao quadrado. Esta simples expressão evi-<br />
21
22<br />
dencia que uma pequena<br />
quantidade<br />
de matéria pode resultar<br />
em quantias<br />
enormes de energia,<br />
em virtude da<br />
magnitude elevada<br />
da velocidade da luz<br />
(300.000.000m/s).<br />
A comprovação<br />
prática da equivalência<br />
entre massa e<br />
energia proposta<br />
teoricamente por<br />
Einstein em 1905<br />
ocorreu em 1945,<br />
quando duas bombas nucleares foram detonadas<br />
nas cidades de Hiroshima e Nagazaki. No processo<br />
de fissão nuclear, que ocorre na bomba atômica,<br />
átomos de Urânio enriquecido se rompem,<br />
quando colapsados por nêutrons com grande velocidade.<br />
A ruptura do urânio libera três ou quatro<br />
outros nêutrons que atingem outros átomos provocando<br />
uma reação em cadeia. No entanto, a liberação<br />
de energia se deve à transformação de<br />
parte da matéria - no processo de ruptura do átomo<br />
- em energia. A soma da massa dos átomos<br />
restantes e das partículas remanescentes não se<br />
equivale à massa do átomo de Urânio inicial. Quatrocentos<br />
e cinquenta gramas de Urânio enriquecido<br />
produzem a liberação de energia equivalente<br />
à explosão de 3.785.412 litros de gasolina.<br />
Albert Einstein, que já vivia nos Estados Unidos<br />
durante a segunda Guerra Mundial, não participou<br />
do projeto Manhattan, destinado à construção<br />
das duas ogivas nucleares (Fat Man e Little<br />
Boy), mas escreveu, em 2 de agosto de 1939,<br />
uma carta ao então presidente norte-americano<br />
Roosevelt. Nesta, o físico alemão alerta o político<br />
para a possibilidade de construção de uma<br />
bomba nuclear com uso de Urânio enriquecido.<br />
Einstein também ressalta a exploração de Urânio<br />
na Tchecoslováquia pelos alemães, e aconselha<br />
Roosevelt a "manter permanente contato<br />
com grupos científicos americanos que pesquisam<br />
sobre reações em cadeia" e a "acelerar as<br />
pesquisas experimentais sobre o assunto, que<br />
no presente momento estão limitadas pelo orçamento<br />
dos laboratórios universitários".<br />
Alguns anos após a explosão das bombas nucleares<br />
no Japão, Einstein se defendeu e justificou<br />
sua iniciativa em escrever a carta a Roosevelt.<br />
Minha responsabilidade na questão da bomba atômica<br />
se limita a uma única intervenção: escrevi uma<br />
carta ao Presidente Roosevelt. Eu sabia ser necessária<br />
e urgente a organização de experiências de grande<br />
envergadura para o estudo e a realização da bomba<br />
atômica. E o disse. Conhecia também o risco universal<br />
causado pela descoberta da bomba. Mas os<br />
sábios alemães se encarniçavam sobre o mesmo<br />
problema e tinham todas as chances de resolvê-lo.<br />
Assumi, portanto, minhas responsabilidades.<br />
Em síntese, Einstein foi o protagonista de<br />
grandes eventos da humanidade, alguns deles<br />
catastróficos, é verdade, mas também da construção<br />
de uma nova percepção sobre o Universo.<br />
O brilhantismo destes seus três trabalhos<br />
científicos, produzidos em apenas um ano, foi capaz<br />
de ofuscar as teorias da mecânica clássica e<br />
o próprio paradigma racionalista que Nicolau<br />
Copérnico, Galileu Galilei, Isaac Newton e René<br />
Descartes haviam construído e que durava mais<br />
de 200 anos. Enquanto a teoria da Relatividade<br />
reinventou os conceitos de tempo, espaço, matéria<br />
e gravidade, e pôs em xeque a exatidão das<br />
leis naturais daqueles pensadores, a teoria da<br />
mecânica quântica reconstruiu uma nova visão<br />
sobre o micro mundo, sustentado no princípio<br />
da incerteza, na dualidade natural da luz e matéria<br />
e na probabilidade de localização das partículas<br />
subatômicas.<br />
Vale encerrar este breve artigo com a resposta<br />
de Einstein quando, em 1952, foi convidado<br />
oficialmente pelo primeiro ministro de Israel,<br />
David Ben Gurion, para o cargo de presidente:<br />
"não posso aceitar o convite, pois nada sei de<br />
relações sociais. Sei somente um pouco de Matemática<br />
e Física".<br />
(Comente este artigo em<br />
mediacao@colegiomedianeira.g12.br)<br />
Guilherme Dal Moro é ex-aluno do colégio<br />
<strong>Medianeira</strong>. Formou-se em Física na UFPR e<br />
atualmente faz mestrado na UTFPR, em<br />
fotônica. No <strong>Medianeira</strong>, é professor de Física<br />
do 1º. Ano do ensino Médio.
COMO VEJO O MUNDO<br />
ALBERT EINSTEIN<br />
Editora Nova Fronteira<br />
Einstein trata dos problemas fundamentais do ser humano -<br />
nos campos social, político, econômico e cultural - e torna<br />
clara sua posição diante deles - a de um sábio radicalmente<br />
consciente de que, sem a liberdade de ser e agir, o homem,<br />
por mais que conheça e possua, não é nada.<br />
NOTAS AUTOBIOGRÁFICAS<br />
ALBERT EINSTEIN<br />
Editora Nova Fronteira<br />
Considerado 'O Homem do Século XX' pela revista Time, Albert<br />
Einstein faz neste livro um retrato do desenvolvimento<br />
de sua mente e do modo como evoluiu sua visão dos problemas<br />
da física. Nestas notas, o leitor encontrará uma personalidade<br />
crítica, marcada pela coragem e pela coerência de quem<br />
nunca se submeteu.<br />
A EVOLUÇÃO DA FÍSICA<br />
ALBERT EINSTEIN E LEOPOLD INFELD<br />
Editora Jorge Zahar<br />
Este livro foi publicado originalmente na década de 1930, com<br />
a finalidade de divulgar a teoria da relatividade. Mas as criações<br />
e conceitos expostos aqui conservam plena validade. O<br />
texto é escrito por Einstein e explica os fundamentos essenciais<br />
da física, por meio de gráficos e diagramas. Traça um esboço<br />
das tentativas feitas pela mente humana para encontrar<br />
uma conexão entre o mundo das idéias e o dos fenômenos.<br />
23
24<br />
MEU lixo,<br />
TEU lixo,<br />
NOSSO lixo,<br />
lixo DELES<br />
Por Cláudio Adriano Piechnik<br />
Quando o assunto é lixo,<br />
uma preocupação nossa é<br />
com o destino dele. Mas por<br />
que não podemos pensar<br />
melhor sobre como evitar<br />
que ele seja produzido?
O maior perigo e o maior trunfo da ecologia<br />
podem estar em sua popularização. Esta frase<br />
soa estranha. Estamos acostumamos aos discursos<br />
ecológicos apresentados pela mídia assim<br />
como nos acostumamos à violência, à corrupção<br />
na política, ao vírus H1N1. Tudo não passa<br />
de mais uma notícia veiculada por um programa,<br />
noticiário, revista ou jornal qualquer. Por<br />
outro lado, a partir da problemática ambiental<br />
vivida a cada dia pelas pessoas nos grupos e<br />
espaços de convivência e na busca humana da<br />
felicidade, constrói-se a consciência ecológica<br />
e inicia-se a mudança de mentalidade. A vida<br />
diária é o lugar do sentido da ecologia, pois a<br />
condição humana passa inevitavelmente por ela.<br />
A ecologia implica uma mudança radical de<br />
mentalidade em relação à qualidade de vida e<br />
ao meio ambiente, que está diretamente ligada<br />
ao tipo de convivência que mantemos com nós<br />
mesmos, com os outros e com a natureza.<br />
A definição de sociedade sustentável se opõe<br />
à produção de lixo. Em uma floresta ou um oceano<br />
não temos a produção de lixo. Na verdade, o<br />
lixo é realmente apenas subutilização de recursos;<br />
é como enterrar dinheiro no chão. Há uma<br />
tendência mundial em legislar a redução, a reci-<br />
clagem, e a reutilização de produtos e embalagens<br />
com a criação de protocolos para reduzir o<br />
fluxo de resíduos até chegarmos ao virtual zero<br />
de lixo. Isso mesmo, esta ideia já é realidade em<br />
muitas cidades canadenses e europeias.<br />
A questão do lixo é erroneamente deixada<br />
sob responsabilidade da política local (municipal),<br />
quando deveria estar dentro do âmbito<br />
estadual, federal e internacional de jurisdição.<br />
Um município não será capaz de chegar ao zero,<br />
sem lixo, delegando ao produtor a responsabilidade<br />
da legislação. O que isto quer dizer na<br />
prática? Sabe aquela garrafa de refrigerante<br />
pet jogada no terreno baldio da sua rua? Ela deixa<br />
de ser responsabilidade de quem a jogou e<br />
passa a ser responsabilidade da empresa que concebeu<br />
e colocou à venda aquele refrigerante no<br />
mercado e não pensou em o que fazer com a<br />
garrafa após o refrigerante ser consumido. Ou,<br />
como já acontece no Brasil, a responsabilidade<br />
das empresas de telefone celular em receber e<br />
reciclar aparelhos e baterias já utilizadas.<br />
Protocolos internacionais que regulamentam<br />
a concepção dos produtos são parte inevitável<br />
da solução para o lixo. Todos os produtos<br />
e as embalagens devem ser concebidos<br />
- desde o início da cadeia produtiva - para serem<br />
reparáveis, reutilizáveis e recicláveis, reembolsáveis<br />
ou compostáveis.<br />
O que estou falando é que devemos rever<br />
todos os nossos processos produtivos para poder<br />
chegar a 100% sem lixo através do desenvolvimento<br />
de um bom design. Ou seja, nos<br />
acostumamos à ideia de que o lixo é um problema<br />
a ser resolvido no final da cadeia produtiva.<br />
Nos acostumamos ao fato de que devemos ter<br />
lixeiras separadas por cores para poder colocar<br />
metais, vidros, orgânicos e papel. Não no início,<br />
antes que um produto ou serviço seja posto<br />
no mercado. Não pensamos no porquê de<br />
termos que nos livrar de objetos que nem solicitamos<br />
ter. Para pensar em processo produtivo,<br />
é preciso planejamento, é preciso design.<br />
Design é um processo espiral de coleta de<br />
informação, criação de conceitos, tomada de<br />
decisões e avaliação de resultados. Concepção<br />
sustentável significa que todos os produtos ou<br />
25
26<br />
materiais que dão entrada em meu processo não<br />
são tóxicos, toda a energia utilizada é renovável,<br />
os processos de fabrico são seguros para os trabalhadores<br />
e os produtos finais não acabam em<br />
aterros. Isso vale para tudo, desde escovas de<br />
dente até veículos e edifícios. Expandir os lixões<br />
ou aterros sanitários existentes ou iniciar novos<br />
já não é solução viável. As comunidades rurais<br />
não devem ser forçadas a aceitar o cheiro, o tráfego<br />
de caminhão, as moscas, as doenças, a ameaça<br />
às águas subterrâneas e a redução dos valo-<br />
res de suas propriedades, coisas que o lixo pode<br />
trazer.<br />
Pode-se pensar em incineração. Mesmo<br />
hoje, os incineradores não são mais limpos do<br />
que no passado, as emissões continuam a conter<br />
partículas tóxicas, mesmo com os mais modernos<br />
dispositivos de controle da poluição. E<br />
o que não é liberado na atmosfera acaba virando<br />
cinzas ácidas, o que é um composto<br />
tóxico, o que representa 30% da massa inicial,<br />
que deve ser enterrado em um local para<br />
resíduos perigosos representando um perigo<br />
adicional para a água subterrânea. Além disso,<br />
a incineração tem o dobro do custo em<br />
relação à deposição em aterros. Ou seja, se<br />
não revermos o desenho de nossos processos,<br />
continuaremos a varrer a sujeira pra debaixo<br />
do tapete.<br />
Anseio por aqueles tempos que não vivi (ou<br />
vivi parcialmente), de viver em harmonia com<br />
a natureza. Claro, sei também do cuidado de<br />
não cair num falso sentimentalismo. Tempos em<br />
que o leite e iogurte vinham em recipientes de<br />
vidro, que eram levados de volta para o comerciante.<br />
Muitas das frutas e hortaliças vinham dos<br />
quintais. É claro que existia comércio, compras.<br />
Mas neste caso tudo era embalado em sacos de<br />
papelão ou apenas finos sacos de papel. As sobras<br />
diárias da cozinha eram transportadas e<br />
dadas como lavagem aos animais e, por incrível<br />
que pareça, este era praticamente o único<br />
resíduo gerado em nossas cozinhas. Nada de<br />
embalagens de plástico, isopor, sacolas.<br />
A vida na fazenda, no campo era extremamente<br />
difícil para os nossos avós e gerações<br />
anteriores. Porém, como os problemas e necessidades<br />
impostas, as soluções também eram<br />
mais simples. Hoje podemos rir quando vemos<br />
a recente multiplicação de livros, glorificando a<br />
força de voltar para a terra, e as velhas formas<br />
de viver. Simplesmente porque eram formas<br />
sustentáveis e que garantiram nossa existência<br />
até bem pouco tempo atrás.<br />
(Comente este artigo em<br />
mediacao@colegiomedianeira.g12.br)<br />
Cláudio Adriano Piechnik é biólogo, com MBA<br />
em Gestão Ambiental e mestrado em Biologia<br />
Celular e Molecular (UFPR). No <strong>Medianeira</strong>, é<br />
professor de Biologia do 3º. ano do Ensino<br />
Médio. É pesquisador do projeto Evolução e<br />
Biodiversidade na Antártica: a resposta da<br />
vida a mudanças (PROANTAR).
Se você se interessou por estas ideias e quer começar a fazer algo, uma dica é implementar pelo menos<br />
uma dica para um "Consumo Ecoético". (A lista abaixo é uma adaptação do material de Patrícia Abuhab e<br />
Guilherme Blauth, do Instituto Harmonia da Terra - http://www.harmonianaterra.org.br).<br />
Pense muito antes de comprar algo, reflita se<br />
é realmente necessário.<br />
Compre produtos cujas embalagens possam<br />
ser reutilizadas.<br />
Compre produtos de limpeza concentrados e<br />
que podem ser diluídos em água, dê preferência<br />
aos biodegradáveis.<br />
Leve a sua própria sacola na feira, no mercado ou<br />
na padaria se for usar a sacolinha plástica, coloque<br />
o máximo de produtos na mesma sacola.<br />
Evite comprar e consumir produtos descartáveis<br />
como copos ou canudinhos.<br />
Adote uma caneca para não consumir copos<br />
plásticos descartáveis.<br />
Procure comprar pilhas e baterias recarregáveis;<br />
após o uso devolva-as ao fabricante pois ele é<br />
responsável pelo destino final destes materiais.<br />
Compre produtos que tenham refil.<br />
Evite comprar frutas e verduras embaladas.<br />
PESCADORES DE LIXO: GLOBALIZAÇÃO E<br />
EMPRESAS BRASILEIRAS<br />
ANTONIO ALBERTO<br />
PRADO<br />
Editora SENAC/SP<br />
O que podem fazer as empresas<br />
brasileiras diante dos<br />
desafios da Globalização?<br />
Este ensaio do jornalista Antonio<br />
Alberto Prado que,<br />
através de entrevistas com<br />
empresários e administradores traça um panorama de<br />
uma situação que, segundo o autor, apesar de tantas<br />
dificuldades, pode evoluir para 'uma retomada do desenvolvimento<br />
brasileiro como nossa gente participando<br />
do desenho de nosso destino'.<br />
Prefira consumir sucos naturais e chás aos<br />
refrigerantes. Para as crianças essa recomendação<br />
é ainda mais importante.<br />
Caso você tenha um quintal em casa, recicle o<br />
seu lixo orgânico e faça uma horta com o<br />
composto (adubo) produzido.<br />
Preste atenção aos programas de TV que você<br />
"consome". Quais deles contribuem para a<br />
melhoria de sua vida?<br />
Troque a TV por um bom livro ou um bom papo.<br />
Atenção sempre ao consumir água e energia,<br />
evite desperdícios. Para que estes bens<br />
cheguem até a sua casa uma grande quantidade<br />
de recursos naturais é utilizada.<br />
Sempre que possível, locomova-se a pé, de<br />
bicicleta ou utilize o transporte coletivo.<br />
Seja um consumidor ativo e crítico, questionando<br />
aos fabricantes sempre que houver<br />
alguma dúvida em relação ao produto ou<br />
embalagem.<br />
DESIGN SUSTENTÁVEL:<br />
CAMINHOS VIRTUOSOS<br />
VÁRIOS AUTORES<br />
Editora SENAC/SP<br />
Este livro explora as linhas de<br />
reflexão e as diretrizes de progresso<br />
inerentes à problemática<br />
das embalagens, propondo<br />
para elas soluções em<br />
matéria de ecodesign e de<br />
concepção ecológica.<br />
Sugerimos ainda o ótimo blog Sustentopia<br />
(http://sustentopia.wordpress.com), do<br />
designer curitibano Nelson Smith Jr.<br />
27
28<br />
A<br />
idade do<br />
LIXO<br />
Por Elenir Almeida Santos<br />
Quando falamos de consciência planetária,<br />
muitas coisas estão interligadas. Você verá<br />
aqui, por exemplo, qual a relação entre<br />
consumo exagerado, lixo jogado em<br />
qualquer canto, contaminação da água e<br />
propagação de doenças.
Se todos os refugos humanos e animais que o mundo perde fossem devolvidos à terra, em vez de<br />
serem lançados na água, seriam suficientes para nutri-la.<br />
Os montes de lixo jogados nas esquinas, os barris de lodo transportados aos trancos pelas ruas<br />
durante a noite, os carros nojentos empregados na limpeza, os fétidos esgotos subterrâneos encobertos<br />
pela pavimentação das ruas, sabeis o que são?<br />
São os prados floridos, a erva verde, o limo, a lavanda, a sálvia perfumada; são os pássaros e os<br />
animais dos bosques; são os rebanhos, os mugidos alegres que os bois emitem; são o feno perfumado,<br />
a espiga loira, o pão sobre a mesa, o sangue quente que corre nas veias, a saúde, a felicidade, a vida...<br />
Aquela misteriosa criação quer que na Terra tudo seja transformação e no Céu, transfiguração.<br />
Devolvam tudo ao grande cadinho e dele sairá a abundância. A nutrição dos vegetais produz a<br />
alimentação dos homens.<br />
Vós sois livres para perder essa riqueza e, acima de tudo, para julgar-me ridículo; será a obra-prima<br />
de vossa ignorância. "<br />
As grandes cidades têm responsabilidade<br />
muito grande sobre os problemas ambientais<br />
globais, especialmente em função dos impactos<br />
que causam aos vários ecossistemas, não só<br />
onde estão localizadas, mas também nos lugares<br />
de onde importam recursos ou para onde<br />
exportam seus resíduos.<br />
É sobre os resíduos que gostaria de fazer uma<br />
breve reflexão.<br />
Resíduo sólido urbano pode ser considerado<br />
sinônimo de lixo. Trata-se de uma designação<br />
mais técnica e que surgiu no início da década<br />
de 60. "O lixo é todo e qualquer resíduo que<br />
resulte das atividades do homem em sociedade"<br />
(LIMA, 1986), mas, diferenciar seus tipos ou<br />
analisá-los é uma atividade mais facilmente desenvolvida<br />
se comparada à busca de uma definição<br />
precisa. Em parte, isso se deve à complexidade<br />
dos fatores envolvidos na sua origem e formação<br />
e até mesmo dos processos relacionados<br />
com a sua disposição final. O conceito de utilidade<br />
pode ser inversamente proporcional ao que<br />
se considera como lixo. Esta preceituação não é<br />
de todo válida e há como justificar: a partir de<br />
que momento se deixa de considerar útil um<br />
objeto qualquer e se passa a considerá-lo como<br />
lixo? Alguns aspectos, como o tempo e formas<br />
de uso, influem nesta categorização. Assim, o<br />
Victor Hugo (1802 - 1885): Os Miseráveis<br />
conceito de utilidade é fundamental na compreensão<br />
deste processo.<br />
Muitas definições encontradas na literatura especializada<br />
sobre lixo consideram este material<br />
sem valor para reaproveitamento. Exemplo é a<br />
definição encontrada no trabalho intitulado "A Coleta<br />
e Disposição de Lixo no Brasil", realizado para<br />
a Fundação Getúlio Vargas, citado em Aisse et alii:<br />
"Lixo são objetos que não possuem mais valor ou<br />
utilidade, são porções de materiais sem importância<br />
econômica, sobras de processamentos industriais<br />
e domésticos a serem descartadas e qualquer<br />
outro material que tenha igual destino".<br />
O mesmo ocorre na literatura não especializada,<br />
a exemplo dos dicionários de língua portuguesa,<br />
que geralmente se referem ao lixo como<br />
sendo "tudo que não presta e se joga fora". Estas<br />
definições sobre o lixo são desatualizadas e inapropriadas<br />
para a atual época e o futuro da humanidade.<br />
29
30<br />
A maior ou menor relevância do problema<br />
dos resíduos sólidos nas cidades, quanto aos<br />
aspectos sanitários, físicos, ecológicos, sociais,<br />
econômicos ou políticos está relacionada diretamente<br />
com a execução completa ou incompleta<br />
das fases que integram o processo de exclusão<br />
e/ou eliminação dos mesmos. Estas fases compreendem<br />
a coleta, transporte e tipo de tratamento<br />
final implantado, que pode ser mais de um.<br />
Uma quarta fase pode ser incluída, e se relaciona<br />
com as consequências advindas do destino final<br />
impróprio, ou seja, das repercussões sobre o<br />
ambiente.<br />
Por muitos anos, as administrações públicas<br />
acomodaram-se na confortável e falsa alternativa<br />
do "custo zero" para a disposição dos resídu-<br />
Poluição e contaminação do aquífero e lençol freático conferindo patogenicidade e toxidade<br />
às águas subterrâneas;<br />
Redução da fauna e flora do solo e das águas superficiais;<br />
Poluição e contaminação de bacias hidrográficas;<br />
Permanência de produtos não biodegradáveis no ambiente;<br />
Eutrofização (acúmulo de nutrientes minerais no solo e nas águas);<br />
Acúmulo de vetores* (artrópodes, roedores) que, eventualmente, pode constituir veículos<br />
de doenças em cães, suínos, aves e população carente;<br />
Poluição atmosférica;<br />
Detrimento de aspectos estéticos (visuais do meio ambiente).<br />
os sólidos. Ou seja, aparentemente era mais barato<br />
jogar o lixo de forma e em locais inadequados,<br />
deixando de investir em sistemas compatíveis<br />
para seu recebimento. Mas o "custo zero"<br />
não existe. Quem dispõe o lixo inadequadamente<br />
deve ter consciência de que está transferindo<br />
o custo ambiental diretamente para a sociedade,<br />
onerando-a, pois além de se constituir em prática<br />
ilegal, é passível de penalização (multas) de<br />
acordo com a legislação ambiental vigente, pois<br />
seus danos futuros são inevitáveis. Um exemplo<br />
é o caso de um lixão que, ao estar inadequado,<br />
poderá contaminar o manancial da cidade, acarretando<br />
prejuízos inestimáveis.<br />
Os impactos ambientais causados pela disposição<br />
de resíduos sólidos no meio urbano são:<br />
* Trata-se dos chamados macro-vetores, onde se incluem os ratos, baratas, moscas e animais de maior porte e os micro-vetores, que são<br />
os vermes, bactérias, fungos, actinomicetes e vírus. São uma ameaça constante à saúde da população, das comunidades, porque as<br />
possibilidades de transmissão de doenças são inúmeras (febre tifóide, leptospirose e as infecções de pele), além de que constituem-se<br />
também, em agentes potenciais de contaminação dos recursos hídricos, pedológicos e atmosféricos - neste último recurso, referindo-se<br />
principalmente aos artrópodes.
A discussão acerca dos resíduos, assim como<br />
as questões sociais e ambientais mais amplas,<br />
remete-nos a uma análise mais profunda do paradigma<br />
atual, entendido aqui como o conjunto<br />
de valores que norteiam as várias sociedades e<br />
suas relações. Portanto, muito antes da discussão<br />
tecnológica, a questão deve ser analisada a<br />
partir de suas raízes, discutindo-se os estilos de<br />
desenvolvimento e as estruturas de consumo<br />
das sociedades, a distribuição espacial das populações,<br />
as limitações materiais e a sustentabilidade<br />
ambiental do planeta, as desigualdades sociais<br />
entre os povos e suas implicações na exportação<br />
de processos produtivos residuosos, a visão<br />
utilitária do ambiente, entre outros temas.<br />
(Comente este artigo em<br />
mediacao@colegiomedianeira.g12.br)<br />
REFERÊNCIAS<br />
AISSE, M.M. et alii. Aproveitamento de Resíduos Sólidos.<br />
Curitiba, PUC, LHISAMA, 1981. 18-22 pp.<br />
LIMA, L.M.C. Tratamento de Lixo. São Paulo, Hemus,<br />
1986. 240 p.<br />
OBS. Este texto é parte da monografia de graduação<br />
intitulada "O Município de Curitiba e a Política de<br />
Gerenciamento de Resíduos Sólidos Urbanos". Elenir<br />
Almeida Santos- USP-1999.<br />
Elenir Almeida Santos bacharel é licenciada<br />
em Geografia pela Universidade de São Paulo.<br />
No <strong>Medianeira</strong>, é professora de Geografia da<br />
7ª. série desde 2003.<br />
LIXO - TRATAMENTO E BIORRE<strong>MEDIAÇÃO</strong><br />
LUIZ MÁRIO QUEIROZ LIMA<br />
Editora Hemus<br />
Luiz Mário Queiroz Lima descreve<br />
em detalhes e com grande rigor<br />
científico as técnicas que hoje estão<br />
sendo aplicadas em diversos<br />
lugares do mundo para o aproveitamento<br />
físico-químico e biológico<br />
do lixo, o que se apresenta de<br />
utilidade imediata para técnicos,<br />
engenheiros e autoridades responsáveis<br />
pelo saneamento público,<br />
assim como para todos aqueles interessados em<br />
soluções para os graves problemas que ameaçam<br />
o equilíbrio de nosso ecossistema. Sumário<br />
- 1) Origem e produção do lixo no meio urbano,<br />
classificação, características e análise; 2) Lixo e<br />
poluição; 3) Aterro sanitário; 4) Compostagem;<br />
5) Incineração 6) Pirólise; 7) Conversão biológica<br />
do lixo com recuperação de energia; 8) Alimento<br />
a partir do lixo.<br />
GESTÃO COMPARTILHADA DOS<br />
RESÍDUOS SÓLIDOS NO BRASIL<br />
PEDRO JACOBI (ORG.)<br />
Editora Annablume<br />
Os trabalhos apresentam um panorama<br />
atual da problemática destacando<br />
o caso de São Paulo, Belo<br />
Horizonte, Porto Alegre, Londrina<br />
e um consórcio no Estado de Santa<br />
Catarina, e trazem ao leitor experiências<br />
inovadoras de gestão<br />
compartilhada, um exemplo muito<br />
elucidativo das possibilidades<br />
de obter resultados relevantes em<br />
programas municipais de coleta seletiva em parceria<br />
com catadores de materiais recicláveis organizados.<br />
a partir do lixo.<br />
31
32<br />
O JORNAL<br />
EDUCA?<br />
Por Patrícia Meyer<br />
Se a escola se incumbir da<br />
responsabilidade de ensinar<br />
pela e para a comunicação, os<br />
veículos deixarão de ser<br />
estranhos e se tornarão aliados<br />
na formação dos cidadãos.
Antes mesmo de encerrar a faculdade de jornalismo,<br />
especulava se a elaboração de um jornal<br />
por estudantes de ensino fundamental ou<br />
médio poderia contribuir para a formação de<br />
sujeitos mais críticos. Entendia criticidade como<br />
a capacidade de o indivíduo analisar e construir<br />
uma opinião própria sobre diferentes temas.<br />
Apesar de ter estas questões sempre presentes<br />
em minhas reflexões sobre meu "papel<br />
no mundo", nunca imaginei que elas pudessem<br />
compor uma pesquisa científica. Por isso, me<br />
surpreendi quando me deparei com uma produção<br />
acadêmica vasta que interligava comunicação<br />
e educação.<br />
Como jornalista, acredito que o acesso à<br />
informação por meio de notícias veiculadas<br />
pela mídia abre a qualquer indivíduo uma infinidade<br />
de oportunidades. Uma delas é a de<br />
realizar associações com diferentes conteúdos<br />
e novas informações e, a partir disto, construir<br />
um olhar próprio sobre um objeto específico<br />
ou sobre qualquer questão presente na sociedade.<br />
Para que isso ocorra, no entanto, é necessário<br />
um despertar para a importância do<br />
consumo consciente das informações; o que<br />
pode começar na escola.<br />
O olhar com criticidade para as informações<br />
é uma lição que se leva para toda a vida.<br />
É como se cada indivíduo desenvolvesse uma<br />
metodologia própria para decodificar as informações<br />
que recebe e aplicar em seu contexto,<br />
gerando conhecimento e, simultaneamente,<br />
sua identidade como cidadão. Abrese<br />
ainda outra oportunidade: além de<br />
(re)interpretar o mundo, o sujeito pode romper<br />
com a ilusão de que ele é apenas um receptor<br />
de informações e passar a elaborar<br />
conteúdos e publicá-los, divulgando suas ideias,<br />
pensamentos e valores.<br />
Educomunicação - De forma sintética, é<br />
este o conceito de Educomunicação. No Brasil,<br />
a definição é atribuída a Ismar Soares, professor<br />
e pesquisador da USP. Entretanto, Soa-<br />
res assegura que apenas se apropriou e ampliou<br />
o conceito de Mário Kaplun, que falava<br />
de "educación a los medios" ou comunicação<br />
educativa. O educador Mário Kaplun foi um dos<br />
pioneiros do campo da Comunicação da América<br />
Latina e a considerava uma ferramenta básica<br />
para a cidadania e a inserção social.<br />
Soares define educomunicação como "conjunto<br />
de ações com objetivo de integrar às práticas<br />
educativas o estudo dos sistemas de comunicação".<br />
A educomunicação tem o intuito<br />
de tornar a educação mais "pragmática, eficiente,<br />
formadora e crítica" e a mídia "mais comprometida,<br />
séria e cidadã".<br />
Mais do que inserir a tecnologia nas mãos<br />
dos professores para melhorar a relação ensino<br />
aprendizagem, Soares defende a educomunicação<br />
como capaz de transformar a escola e a<br />
sociedade contemporânea. Quando falamos em<br />
tecnologia, lembramos de mídias novas e outras<br />
já não tão recentes assim, como televisão,<br />
rádio, DVD e as diferentes possibilidades da Internet,<br />
como blogs, Orkut, Twitter e outras mais.<br />
Na prática, ainda há uma crença bastante<br />
enraizada nas escolas brasileiras de que o jornal<br />
só serve para educar nas aulas de português.<br />
Seria um recurso interessante para incentivar<br />
a leitura, a produção de textos, a<br />
exemplificação de diferentes gêneros textuais<br />
e a oralidade.<br />
Esta visão - de que o jornal motiva a leitura<br />
e a escrita - foi defendida pelo francês Celestin<br />
Freinet. Ele desenvolveu a técnica da<br />
imprensa na escola e o conceito "jornal educação"<br />
nos anos 20 do século XX. Segundo<br />
Freinet (1974), "só faremos educação se deixarmos<br />
que cada criança realize a sua própria<br />
experiência e adquira os mecanismos em<br />
estreita ligação com a elaboração do seu pensamento".<br />
Por isso, defendia que o envolvimento<br />
das crianças na produção de jornais<br />
ou mesmo cartas era uma maneira natural de<br />
desenvolver a escrita.<br />
Esta consciência de que o jornal na escola<br />
não serve apenas para forrar as mesas das<br />
salas de artes é essencial, porém, a sua pro-<br />
33
34<br />
posta de integração precisa ir além.<br />
As profundas modificações que têm ocorrido<br />
na tecnologia, no mundo do trabalho e<br />
nos costumes, vêm trazendo novos desafios<br />
para a educação. Desafiada, a educação escolar<br />
tenta se renovar para não se tornar obsoleta<br />
em seus métodos e os professores em<br />
suas práticas.<br />
Taxada várias vezes de desinteressante, diante<br />
da competição cruel com a velocidade das<br />
tecnologias da comunicação e informação, a<br />
escola deve se renovar para se manter capaz<br />
de formar indivíduos para o trabalho e para a<br />
vida. E para isso, a comunicação pode ser uma<br />
aliada e não uma inimiga.<br />
Para os educomunicadores, não basta uma<br />
adaptação à sociedade da informação. É preciso<br />
construir um novo modelo de comunicação.<br />
Neste sentido, não se pretende apenas promover<br />
o conhecimento sobre como a comunicação<br />
funciona, mas propor ações voltadas para<br />
a construção, no espaço da educação, de uma<br />
nova prática comunicativa.<br />
Neste contexto, o jornal amplia suas possibilidades.<br />
Torna-se capaz de desenvolver<br />
múltiplas inteligências, adota um papel transformador<br />
possibilitando a construção da autonomia,<br />
criticidade e autoestima. Pode ainda<br />
resgatar o gosto pela aprendizagem e relacionar<br />
as disciplinas.<br />
Uma experiência de educomunicação - Há<br />
oito anos, a Prefeitura Municipal de Curitiba possui<br />
um projeto denominado "Extra, extra". Trata-se<br />
de um jornal eletrônico escolar, desenvolvido<br />
em dezenas de escolas públicas, que<br />
veicula, por meio da Internet, notícias e reportagens<br />
produzidas por alunos do ensino fundamental.<br />
O projeto possibilita o desenvolvimento<br />
de um jornal online e pretende estimular os<br />
professores a simular, em sala de aula, um<br />
ambiente de redação de jornal. Há, portanto,<br />
um momento para definir os assuntos<br />
(pautas) que serão tratados, reunião de equipes<br />
para levantamento de informações e redação<br />
dos textos, produção de imagens (fotos<br />
ou ilustrações), até a revisão e publicação<br />
na Internet. Todas as etapas da atividade<br />
são realizadas com acompanhamento do<br />
professor regente ou do laboratório de informática.<br />
Os pesquisadores Muniz, Rodrigues e Vosgerau<br />
(2007), após analisarem relatos de atividades<br />
desenvolvidas pelos professores utilizando<br />
o projeto "Extra, extra", apontam para o fato de<br />
que a produção de textos visando um público<br />
leitor torna os alunos mais cuidadosos em relação<br />
à ortografia, pontuação, gramática e vocabulário.<br />
Há, portanto, maior atenção dos alunos na<br />
redação e mais qualidade quando o texto é produzido<br />
não apenas para a correção do professor,<br />
mas dentro de seu verdadeiro contexto: comunicar<br />
algo para um público específico.<br />
Os professores que aplicam o jornal eletrônico<br />
em sala de aula também afirmam que os<br />
alunos passam a expor com mais clareza suas<br />
ideias, tem a curiosidade despertada e melhoram<br />
a autoconfiança e autoestima.<br />
O jornal também respeita as diferenças entre<br />
os alunos. Eles identificam no veículo a<br />
possibilidade de publicar textos sobre os<br />
mais diversos assuntos. Além disso, ao tornar-se<br />
"repórter", o aluno se envolve com a<br />
proposta. Estudantes afetivamente envolvidos<br />
com as atividades tornam para si o aprendizado<br />
mais prazeroso.
É importante destacar que o aluno tem a<br />
consciência de que a notícia veiculada no jornal<br />
eletrônico transpõe os portões da escola,<br />
chegando até a comunidade e a todo e qualquer<br />
"internauta" que acesse o conteúdo disponibilizado.<br />
Não há fronteiras territoriais.<br />
Entretanto, existem obstáculos. Para que<br />
o jornal efetivamente eduque, os professores<br />
precisam estar sensibilizados para as possibilidades<br />
da utilização da comunicação na educação.<br />
Para manter a participação dos alunos,<br />
é preciso um intenso envolvimento. Também<br />
é indispensável coragem e ousadia para se<br />
transpor a visão conteudista e permeada por<br />
preconceitos. Mais do que discursar, é necessário<br />
crer firmemente no aluno como sujeito<br />
de sua aprendizagem, capaz de gozar de autonomia.<br />
E principalmente, além de rechaçar, é<br />
necessário utilizar a própria mídia para desenvolver<br />
indivíduos críticos, capazes não apenas<br />
de consumir informações de forma consciente,<br />
mas com excelente capacidade de comunicar.<br />
Desta forma, o jornal educa e as novas gerações<br />
construirão uma nova mídia.<br />
(Comente (Comente este este artigo artigo em<br />
em<br />
mediacao@colegiomedianeira.g12.br)<br />
mediacao@colegiomedianeira.g12.br)<br />
REFERÊNCIAS<br />
FREINET, Célestin. O jornal escolar. Lisboa: Estampa,<br />
1974.<br />
MUNIZ, C, P ; RODRIGUES, Márcio de Oliveira; VOS-<br />
GERAU, D. S. A. R. O jornal eletrônico e a função<br />
social da escrita na Rede Municipal de Educação de<br />
Curitiba. In: IV Conegov - Conferência Sul-Americana<br />
em Ciência e Tecnologia Aplicada ao Governo<br />
Eletrônico, 2007, Palmas. Anais da conferência sul<br />
americana em ciência e tecnologia aplicada ao governo<br />
eletrônico. Curitiba: Revista Pontogov, 2007.<br />
v. Ano IV. p. 56-63.<br />
SOARES, Ismar de Oliveira. Mas, afinal, o que é educomunicação?<br />
Disponível em: http://www.usp.br/<br />
nce/educomunicacao/saibamais/textos. Acesso em:<br />
26 de abril de 2008.<br />
SOARES, Ismar de Oliveira. Uma educomunicação para<br />
a cidadania. Disponível em: Http://www.usp.br/nce/<br />
educomunicacao/saibamais/textos Acesso em: 26 de<br />
abril de 2008.<br />
SOARES, Ismar de Oliveira. A Educomunicação como<br />
processo de gestão comunicativa. In: FÍGARO, Roseli<br />
(org). Gestão da Comunicação: no mundo do<br />
trabalho, educação, terceiro setor e cooperativismo.<br />
São Paulo: Atlas, 2005. p. 53-60.<br />
Patrícia Meyer é jornalista e ex-aluna do<br />
<strong>Medianeira</strong>. Tem pós-graduação em<br />
Planejamento Estratégico e também em<br />
Jornalismo Empresarial e Comunicação<br />
Corporativa. Atualmente, é mestranda em<br />
Educação na PUC/PR.<br />
GESTÃO GESTÃO DA DA COMUNICAÇÃO:<br />
COMUNICAÇÃO:<br />
NO NO MUNDO MUNDO DO DO TRABALHO TRABALHO, TRABALHO , EDUCAÇÃO EDUCAÇÃO, EDUCAÇÃO EDUCAÇÃO<br />
TERCEIRO TERCEIRO SET SETOR SET OR E E COOPERA COOPERATIVISMO<br />
COOPERA COOPERATIVISMO<br />
TIVISMO<br />
ROSELI FÍGARO (ORG.)<br />
Editora Atlas<br />
Esta obra reúne um elenco<br />
de especialistas em suas respectivas<br />
áreas, com visão<br />
ampla sobre temas e problemas<br />
envolvidos com a gestão<br />
da comunicação, contribuindo<br />
em aspectos fundamentais<br />
para o planejamento<br />
da comunicação e que<br />
devem fazer parte da formação do comunicador.<br />
A obra, com 15 capítulos organizados em quatro<br />
partes, trata de temas, como - cultura da organização,<br />
mudanças no mundo do trabalho, subjetividade<br />
no mundo do trabalho, OMC e educação,<br />
mídias e educação, comunicação e educação, definições<br />
e experiências sobre o terceiro setor e<br />
cooperativismo.<br />
JORNAL JORNAL JORNAL ESCOLAR ESCOLAR E E VIVÊNCIAS<br />
VIVÊNCIAS<br />
HUMANAS: HUMANAS: UM UM ROTEIRO ROTEIRO DE DE DE VIAGEM<br />
VIAGEM<br />
JORGE KANEHIDE IJUIM<br />
Editora Edusc<br />
O livro apresenta a proposta<br />
e os resultados de uma ação<br />
pedagógica que aproxima o<br />
Jornalismo da Educação,<br />
através da abordagem sóciohistórica,<br />
para a qual o sujeito<br />
do conhecimento se<br />
constrói, historicamente pelo<br />
precesso de interação com o<br />
outro e o meio. O autor defende a prática do "Jornalismo<br />
humanizado", na produção do jornal escolar,<br />
que venha garantir ao aluno direito à informação<br />
e à opinião, preparando-o para a cidadania<br />
crítico-participativa.<br />
35
36<br />
NIETZSCHE<br />
e a meditatio<br />
generis futuri<br />
Uma reflexão<br />
sobre os<br />
estabelecimentos<br />
de ensino<br />
Por Adilson Felicio Feiler, SJ<br />
Friedrich Nietzsche, embora<br />
tenha vivido na distante segunda<br />
metade do século XIX, parece<br />
estar se questionando sobre a<br />
educação atual, tamanha é a<br />
contemporaneidade dos<br />
assuntos levantados por ele.<br />
36
Em sua crítica à cultura ocidental, Nietzsche<br />
aponta a educação como uma das razões de sua<br />
decadência, já que ele conta os "(...) estabelecimentos<br />
de ensino entre as instituições consagradas<br />
à verdadeira cultura" (NIETZSCHE, Sobre o<br />
futuro de nossos estabelecimentos de ensino, 2ª<br />
Conferência). O imediatismo e o tecnicismo são<br />
apresentados pelo filósofo como dois elementos<br />
responsáveis pela decadência dos estabelecimentos<br />
de ensino. O gosto pela leitura meditada<br />
e refletida dá espaço à produtividade, ao lucro<br />
econômico e ao progresso. O nosso ensino<br />
está proporcionando uma formação que leve em<br />
consideração a dinamização da capacidade reflexiva<br />
de nossos aprendizes? Nietzsche coloca em<br />
primeiro lugar a "(...) necessidade de filosofia"<br />
(NIETZSCHE, Sobre o futuro de nossos estabelecimentos<br />
de ensino, 5ª Conferência). Como é<br />
possível fazer da filosofia um veículo de libertação<br />
e conscientização tendo em vista o desenvolvimento<br />
de uma cultura superior pautada sobre<br />
uma prática solidária?<br />
"Não queríamos significar nada, nada representar,<br />
nada nos propor, queríamos não ter futuro,<br />
não queríamos ser úteis para nada, confortavelmente<br />
estendidos no limiar do presente -<br />
e estávamos. Como éramos felizes!" (NIETZS-<br />
CHE, Sobre o futuro de nossos estabelecimentos<br />
de ensino, Primeira Conferência). Para além<br />
de um resultado utilitário e imediato que se<br />
pode adquirir das coisas, a reflexão nietzschiana<br />
nos leva a mergulhar na plenitude do instante.<br />
Experimentando o transbordar daquilo que<br />
se realiza num momento dado; como se passado,<br />
presente e futuro estivessem percorrendo<br />
uma multiplicidade de epiciclos. Esta perspectiva<br />
do produzir hoje para usufruir amanhã, própria<br />
da lógica da indústria e do mercado modernos,<br />
passa a se desmantelar. O que resta não é<br />
mais nada senão o instante, o dado sustentado<br />
pela infinda capacidade anímica.<br />
Ao invés do resultado utilitário, Nietzsche introduz<br />
o júbilo afirmativo e proativo. Neste sentido,<br />
tais reflexões aplicadas ao âmbito educacional<br />
nos trazem importantes pistas para repensar<br />
a prática pedagógica própria dos estabelecimentos<br />
de ensino de hoje e de amanhã. Nietzsche<br />
realiza isto dentro de um contexto em que<br />
eram emergenciais as mudanças. Mas tais pistas<br />
e mudanças apontadas pelo filósofo alemão não<br />
seriam válidas ainda hoje? A cultura e a educação<br />
que presidem a nossa vivência atual não respiram<br />
enfado e conformismo?<br />
As reflexões sobre a educação que se depreendem<br />
do conjunto da literatura nietzschiana nos<br />
colocam diante da imperiosa necessidade de<br />
revisão do atual modelo educativo. Aquela "mediocrização",<br />
fruto de um conformismo e de<br />
uma reprodução de um modelo de organização<br />
de sociedade pré-determinado, continua a campear,<br />
deixando atrás de si as marcas da inanição,<br />
do rebaixamento e da miséria humana, cultural<br />
e material.<br />
Tal quadro parece se reproduzir ainda hoje,<br />
de tal modo que a felicidade, ao invés de estar<br />
identificada com a capacidade de reinventar, de<br />
criar sempre mundos novos, está sempre mais<br />
identificada à utilidade e ao dinheiro a fim de responder<br />
às demandas de um mercado exigente e<br />
competitivo. Este espírito do progresso e do<br />
desenvolvimento, da especialização e da técnica<br />
irá repercutir na formação de um homem dividido,<br />
segmentado e, por isso, sujeito a uma visão<br />
de mundo compartimentada e limitada.<br />
Urge então para Nietzsche a necessidade premente<br />
do resgate de uma visão de conjunto do<br />
ser humano, que, por sua vez, pode ser viabilizada<br />
pela filosofia. Por essa razão, cabe uma revisão<br />
dos estabelecimentos de ensino de então.<br />
Que modelo educacional favoreceria a promoção<br />
de um ensino mais aberto, voltado para a<br />
totalidade da existência humana? A nossa época<br />
já dispõe de tal modelo? Ou continuamos a fortalecer,<br />
promover e a defender um modelo que<br />
assegure a passividade e o conformismo?<br />
A tendência moderna uniformizadora e particularizadora,<br />
em seu esforço de dissecação, acaba<br />
enfraquecendo o organismo e reduzindo a<br />
disponibilidade anímica, minando a cultura clássica<br />
a partir de suas bases. O resultado deste processo<br />
acaba sendo o estreitamento de horizonte,<br />
razão essa pela qual só uma ciência dotada de<br />
uma capacidade de visão ampla sobre a realidade<br />
fornece as condições necessárias para o estabelecimento<br />
da verdadeira cultura. Desse<br />
modo, como vimos, a filosofia em seu esforço<br />
de pensar a realidade sem se deter por uma ou<br />
outra determinação é capaz de atingir o cerne das<br />
37
38<br />
questões sobre as quais se assentam os baluartes<br />
da erudição e da criação. É, por isso, central<br />
o papel da filosofia dentro dos estabelecimentos<br />
de ensino, enquanto a única ciência capaz de<br />
pensar a totalidade num plano que vai muito além<br />
daquele promovido pela moderna ciência segmentada<br />
e especializada. Permite ela libertar-se<br />
das amarras do imediatismo eficientista. Ao invés<br />
do presente imediato eficiente, o futuro impreciso<br />
e criador. Aí sim mudanças poderão ser<br />
esperadas. Só homens que experimentaram um<br />
programa educacional erudito são promessa de<br />
anúncios cataclismáticos na cultura. Só estes possuem<br />
as condições necessárias para refletir sobre<br />
a geração futura, pois estão livres das amarras<br />
do instante imediato e eficiente.<br />
Somente pela capacidade de um uso acertado<br />
dos meios que se nos dispõem para o aprendizado<br />
possibilitarão a capacitação necessária<br />
para uma agudeza de olhar que veicule a passagem<br />
de tudo o que é baixo, pequeno, fechado<br />
para uma altura, grandeza e abertura, promotores<br />
da verdadeira cultura. E, ao se falar em meios<br />
de aprendizado, Nietzsche não está tocando em<br />
outra coisa senão no uso adequado da educação,<br />
pois, assim, como a educação pode trazer mediocridade,<br />
escravizar, da mesma forma, por ela<br />
também se é capaz de libertar, dando razão ao<br />
poderoso arsenal crítico, próprio do humano. Tal<br />
é, pois, o papel do filósofo, daquele que tem<br />
como princípio fundamental o "sensus meditationis",<br />
aquele que ousa pensar o distante e inaudito,<br />
o para além de toda a estabilidade e inércia,<br />
aquele cujo interesse é o constante desmantelar<br />
pelo poder prodigioso de ser extemporâneo,<br />
tendo o gênero do futuro como meta.<br />
Oxalá os nossos estabelecimentos de ensino<br />
promovam, pela reflexão filosófica, homens que,<br />
despreocupados pela utilidade imediata e apenas<br />
pragmática, próprios do mundo e da indústria atuais,<br />
encarem tudo o que pronto se apresenta como<br />
uma possibilidade sempre aberta e dinâmica.<br />
(Comente este artigo em<br />
mediacao@colegiomedianeira.g12.br)<br />
Adilson Felicio Feiler, SJ, é formado em Filosofia pela FAJE -<br />
Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia de Belo Horizonte.<br />
É mestre em Filosofia pela Unisinos. No <strong>Medianeira</strong>, trabalha<br />
no Serviço de Orientação Religiosa, com 7ª. e 8ª séries.<br />
ESCRITOS ESCRITOS SOBRE SOBRE EDUCAÇÃO<br />
EDUCAÇÃO<br />
FRIEDRICH NIETZSCHE<br />
Editora Loyola<br />
Escritos sobre Educação é<br />
uma reunião de cinco conferências<br />
- proferidas pelo filósofo<br />
na época em que era um<br />
jovem professor no Paedagogium,<br />
na Universidade da Basiléia<br />
- e do texto 'Schopenhauer<br />
educador', em sua<br />
versão completa. Esta publicação<br />
pretende contribuir<br />
com as discussões contemporâneas acerca dos rumos<br />
do ensino brasileiro. Os textos abordam a importância<br />
dada por Nietzsche à educação e ao ensino<br />
dos jovens para a formação e para o desenvolvimento<br />
do pensamento e da cultura. Ele propunha<br />
uma educação que formasse e não apenas<br />
profissionalizasse o estudante. Nas Conferências<br />
proferidas na Basileia ele aponta os objetivos, os<br />
métodos, os conteúdos e as formas da educação<br />
dos jovens, considerando especificamente as relações<br />
didáticas entre professor e aluno.<br />
NIETZSCHE, NIETZSCHE, DAS DAS FORÇAS FORÇAS FORÇAS CÓSMICAS<br />
CÓSMICAS<br />
AOS AOS VALORES VALORES HUMANOS<br />
HUMANOS<br />
SCARLETT MARTON<br />
Editora UFMG<br />
Esta obra, em sua 2ª edição,<br />
constitui-se num referencial<br />
para aqueles que se interessam<br />
pela filosofia nietzschiana. Reconstrói,<br />
de forma precisa e rigorosa,<br />
um estudo sistemático<br />
do texto de Nietzsche, ao elaborar<br />
uma visão de conjunto<br />
da sua obra, refazendo a trama<br />
dos conceitos nela presente e reconstituindo<br />
o percurso intelectual do filósofo. Conduzido pelo<br />
fio de uma escrita elegante e equilibrada, o leitor<br />
de 'Nietzsche- das Forças Cósmicas aos Valores<br />
Humanos tem, enfim, acesso a uma excelente elucidação<br />
de um universo filosófico conseqüente,<br />
que mantém, ainda hoje, vivos e plausíveis seus<br />
desafios à cultura ocidental.
da<br />
O<br />
PEDRA<br />
Por Maria Célia Martirani<br />
LEITE<br />
Palavras e imagens unidas para dar sentido<br />
e significado a experiências da vida, do<br />
mundo. Essa parece ser uma das funções<br />
do cinema. Acompanhe uma leitura lírica<br />
do filme italiano Novo Mundo.<br />
39
40<br />
A primeira cena que abre o filme Novo Mundo,<br />
de Emanuele Crialese, é impactante. Dois<br />
homens, pai e filho, sobem uma montanha altíssima<br />
de pedra. Hábeis, pisam a aridez daqueles<br />
rochedos apenas com a planta dos pés, que sangram,<br />
habituados, desde sempre, à dureza daquele<br />
chão. E é, também, pedra o que carregam nas<br />
bocas totalmente cerradas. Estão sós e sua solidão<br />
é ampliada num mundo de calcário branco<br />
acinzentado, a se perder de vista, nesta espécie<br />
de agreste siciliano. Os dois escalam o cume escarpado.<br />
A única música que se ouve é a dos ruídos<br />
dos corpos em movimento, quase como a<br />
batida compassada de seus corações aflitos e<br />
dos pios de aves agourentas.<br />
Para onde estarão indo essas criaturas abandonadas,<br />
que palmilham aquelas pedras com tamanha<br />
desenvoltura, carregando, no olhar, apenas,<br />
urgências? O que se descobrirá, após esse árduo<br />
trajeto, é que estão indo ao alto, em direção a um<br />
Santuário. Lá depositam as pedras que retiram da<br />
boca, em oferecimento ao Senhor, em penitência,<br />
para que Ele os oriente, dando-lhes um sinal qualquer<br />
que indique a melhor escolha: ficar ou partir.<br />
E o veredicto será o mesmo que impulsionou tantas<br />
levas de italianos meridionais a se aventurarem<br />
nos navios, que os levariam à América, ao<br />
Novo Mundo, na esperança de uma vida digna.<br />
Com uma tomada de cena em que a câmera,<br />
lentamente, se afasta dos dois e flagra-os do alto,<br />
cria-se uma plasticidade singular. Os dois homens<br />
vão se tornando diminutos, até a diluição total no<br />
relevo silencioso e absoluto das pedras.<br />
E a partir daí terá início a travessia de Salvatore<br />
Mancuso, seus dois filhos e a mãe, além de<br />
duas moças, que ele se incumbe de fazer chegarem<br />
à América.<br />
Aparentemente estamos diante de mais um<br />
filme sobre a saga de imigrantes, como por exemplo,<br />
os dos irmãos Taviani: Caos ou Bom Dia Babilônia,<br />
o de Tornatore: A lenda do pianista do<br />
mar, ou de Gianni Amelio: America.<br />
Mas o que parece excepcional, neste caso, é a<br />
nova linguagem com que Crialese traduz esse tema.<br />
Rompe o previsível já de saída, apresentando<br />
uma figura feminina de cabelos vermelhos, muito<br />
elegante, uma inglesa, que não se sabe ao certo o<br />
que estaria fazendo ali, em meio àqueles italianos<br />
rudes, desprovidos de qualquer refinamento. Ela<br />
destoa dos demais, como um estranho no ninho.<br />
Trata-se de uma mulher errante, uma prostituta,<br />
que precisava do respaldo de um marido,<br />
para poder entrar na América. Percebendo a disponibilidade<br />
de Mancuso, vai se aproximando<br />
dele, para que consiga alcançar seu objetivo.<br />
Ela encarna uma espécie de luminosidade, não<br />
apenas pelas tonalidades acobreadas dos cabelos<br />
contrastantes com a alvura da pele, mas principalmente<br />
por aquilo que lhe é único, numa complexidade<br />
feminina de mistério e sedução. Luce<br />
representa o diferente, o que, desde o início, também<br />
seduz - talvez como o próprio sonho americano<br />
- com promessas de renovação e beleza.<br />
Como tudo que é novo, atrai e amedronta...<br />
Não é à toa a rejeição por parte da velha mãe de<br />
Salvatore, Fortunata, em relação a Luce. Simbolicamente,<br />
teríamos, por trás das máscaras do preconceito,<br />
a rigidez de um velho mundo arcaico, que se<br />
fecha a qualquer possibilidade de mudança.<br />
Fortunata decide voltar sozinha à terra natal.<br />
Naquele novo mundo, não há lugar para ela, signo<br />
fidedigno de uma Sicília longínqua, tão rígida<br />
como o teor das pedras que a constituem.<br />
Na cena da partida, apenas o apito doloroso<br />
do navio que, lentamente, se afasta do porto. Uma<br />
nesga de mar se interpõe entre a multidão de<br />
homens que fica e a outra que parte, como se a<br />
integridade de um corpo fosse cindida ao meio.<br />
A tênue linha de água que os separa se amplia,<br />
dando conta do decisivo afastamento dos que<br />
vão para nunca mais voltar. Quase como morrer<br />
um pouco, nessa despedida. Quase como deixar<br />
pra trás toda uma vida, uma história, em que<br />
só resta o apego obstinado à ideia da reinvenção<br />
do ser no novo mundo que se anuncia. E o<br />
navio, um ventre gigante que abriga a todos, irmãos<br />
transitórios da mesma embarcação.<br />
A travessia, então, assume o papel de prota-
gonista e aqueles homens, antes dispersos, passam<br />
a se reconhecer. Tocante, a cena da tempestade<br />
em alto mar retrata corpos desgovernados,<br />
jogados de um lado para o outro, acompanhando<br />
a fúria das ondas que oscilam impetuosas.<br />
Finalmente, a chegada: o Golden Gate, a porta<br />
de entrada à América. Os imigrantes que chegam<br />
a Ellys Island são submetidos a uma série<br />
de exames e testes para que possam ser admitidos<br />
no novo mundo.<br />
Percebe-se profunda arrogância e postura<br />
extremamente preconceituosa dos "civilizados",<br />
em relação aos pobres ignorantes "bárbaros" que<br />
acabam de chegar. Toca-se aqui, de modo explícito,<br />
na ferida, ainda aberta e muito atual, das teorias<br />
xenófobas de Eugenia, sustentadas pelos<br />
regimes nazi-fascistas.<br />
A ferrugem corrosiva do preconceito e da<br />
política de higienização, camuflada no Portão<br />
Dourado de entrada às facilidades da nova terra<br />
e o preço para nadar nos amenos rios de leite da<br />
Califórnia é muito mais alto do que, de longe, se<br />
poderia supor. Têm-se a ânsia e a necessidade<br />
de sair da terra de origem e a integração esforçada,<br />
na difícil assimilação dos novos padrões da<br />
terra de chegada.<br />
Na última cena, quase surreal, a câmera se<br />
aproximará, num close, de Mancuso, Lucy e os<br />
dois filhos, de quem só veremos as cabeças, já<br />
que os corpos estão submersos no grande mar<br />
de leite em que nadam.<br />
A câmera vai se distanciando em movimento<br />
de ascensão, como se os sobrevoasse e o que<br />
NOVO NOVO MUNDO MUNDO MUNDO (NUOVOMONDO)<br />
(NUOVOMONDO)<br />
DIREÇÃO DE EMANUELE CRIALESE<br />
se nos apresenta é um imenso fundo branco, o<br />
oceano de leite em que milhares de cabeças, com<br />
seus chapéus negros, nadam.<br />
Na abertura e no final, de modo coincidente, os<br />
peregrinos sicilianos diluem-se no universo montanhoso<br />
das pedras, que parece absorvê-los por<br />
completo. Ao final, também, como que se diluem<br />
na imensidão branca do mar de leite da América.<br />
Talvez, a diferença resida em que, no primeiro<br />
momento, sejam ainda seres autênticos que<br />
integram aquele ambiente, meio homens meio<br />
pedras, num íntimo convívio com a terra que só<br />
se conhece por meio da raiz umbilical da identidade<br />
e do reconhecimento.<br />
Nadando no mar de leite, ao contrário, ainda<br />
que com as facilidades da nova vida, os Mancuso<br />
deixam a pedra ancestral e correm o risco de<br />
não saber mais quem, de fato, são, na multidão<br />
anônima dos que perambulam errantes, talvez,<br />
na eterna busca de uma simples, mas verdadeira,<br />
identidade.<br />
(Comente este artigo em<br />
mediacao@colegiomedianeira.g12.br)<br />
Maria Célia Martirani é escritora, autora dos livros de<br />
contos Recontando e Para que as árvores não tombem de<br />
pé. Pós-graduanda da Faculdade de Filosofia, Letras e<br />
Ciências Humanas da USP, da área de Língua e Literatura<br />
Italiana, desenvolve sua pesquisa em torno da obra do<br />
escritor italiano contemporâneo Alessandro Baricco, a<br />
quem entrevistou, em material bilíngue Português-Italiano<br />
publicado pela Travessa dos Editores, na Revista de<br />
Literatura e Arte Etcetera n. 9: Alessandro Baricco: à<br />
procura do velho narrador que habita em cada um de nós.<br />
É mãe de aluno do <strong>Colégio</strong> <strong>Medianeira</strong>.<br />
Novo Mundo é um filme que conta a história da família Mancuso, originaria das<br />
montanhas da Sicilia, e que vende todos seus bens e abandona sua terra natal para<br />
embarcar numa viagem em busca de uma terra sonhada e nunca vista, que promete<br />
a conquista de riqueza e uma nova vida, o Novo Mundo, os EUA. Durante a<br />
viagem uma jovem inglesa, de origem misteriosa, Lucy, se junta à família Mancuso<br />
nesta longa jornada. Chegando lá as leis de imigração se tornam tão restritas que a<br />
família seria quase que certamente separada e enviada de volta para a Itália, e<br />
assim nem todos terão o privilégio de atravessar as portas do paraíso.<br />
41
42<br />
Educação<br />
Artística<br />
CRÍTICA<br />
como<br />
DESCONSTRUÇÃO<br />
Por Ana Paula Ferreira da Luz<br />
"A educação artística, como um<br />
processo colaborativo, emerge e se<br />
desenvolve através de espaços<br />
interdiscursivos, desenvolve a partir daí<br />
um crescimento crítico, um 'apoderarse'<br />
de todos os agentes envolvidos<br />
como elementos produtores de<br />
conhecimento e de cultura".
A partir da Pedagogia Crítica 1 se gerou uma<br />
grande quantidade de investigações e textos que<br />
tentam fundamentar o caráter institucional, político<br />
e cultural que engloba e define os diversos<br />
centros educativos e, desta maneira, as diversas<br />
práticas que surgem a partir daí. É notável a ênfase<br />
que se coloca cada vez mais na necessidade<br />
de gerar investigações e práticas que surjam da<br />
realidade dos alunos, de suas próprias experiências<br />
culturais e de um contexto social que<br />
finalmente possa refletir a identidade de diversas<br />
comunidades.<br />
Atualmente, a partir do campo da<br />
filosofia, assistimos a uma revisão da<br />
Teoria Crítica e sua posterior diversificação<br />
ou ramificação em tendências de<br />
corte crítico que estão afetando igualmente<br />
o mundo educativo (Tadeu da<br />
Silva, 2002; Gore, 1996; Giroux, McLaren<br />
e Peters, 1996). A partir da contribuição<br />
de determinadas investigações,<br />
como a feminista, a ética radical, a hermenêutica<br />
crítica e o pós-colonialismo, estamos<br />
assistindo a uma mudança de paradigma nas tendências<br />
da Teoria Crítica. Estas absorvem e se<br />
posicionam de uma maneira interessante, mesclando<br />
e desenvolvendo novas perspectivas que<br />
propõem novos modelos de ressignificar e conceber<br />
as práticas culturais.<br />
Existem revisões da Teoria Crítica recentes<br />
que propõem novas formas de (re)pensar a<br />
atuação dentro destas perspectivas: uma genealogia<br />
do poder aplicada ao corpo como espaço<br />
de atuação (Butler, 1993): a sociedade civil<br />
como espaço de resistência (Asheden, 1998);<br />
o paradigma comunicativo e a autonomia da<br />
arte (Wellmer, 1992), e as condições de ação<br />
do indivíduo ou grupos culturais a partir de<br />
uma dimensão de cultura performativa (Yúdice,<br />
2002). Perspectivas, todas elas, que estão<br />
organizando novas estruturas e comportamentos<br />
frente ao fenômeno da institucionalização,<br />
instrumentalização e absorção de práticas culturais<br />
por parte dos artefatos de poder ou de<br />
determinados discursos. As práticas críticas<br />
subversivas já não aparecem mais como resis-<br />
tência aos discursos em relação aos centros de<br />
poder dominantes ; agora se complementam e<br />
se articulam a partir do interior dos mesmos<br />
sistemas. Esta perspectiva pode redefinir e posicionar<br />
as periferias como centros nevrálgicos<br />
onde as diferenças são assimiladas e articuladas<br />
como formas de resistência dentro dos parâmetros<br />
performativos dos sistemas políticos.<br />
Esta mudança de atitude deve ser entendida<br />
através dos parâmetros da pedagogia crítica,<br />
e em concreto pela pedagogia crítica da arte.<br />
Partindo desta perspectiva, a educação artística<br />
deve estabelecer-se dentro de um processo<br />
de co-construção de condições de<br />
visibilidade de sujeitos e suas culturas.<br />
Isso quer dizer que a educação<br />
artística deve atender a construção<br />
de sua tecnologia do olhar (Haraway,<br />
1995), de seu poder de visualização<br />
e subversão como arma crítica<br />
para poder apropriar-se e gerar<br />
seus próprios modos de produção<br />
e distribuição cultural, da mesma<br />
forma em que se criam e desenvolvem<br />
suas próprias narrativas.<br />
O fenômeno educativo passa a ser a estruturação<br />
de condições específicas de performatividade<br />
e da construção de relações, produção e<br />
distribuição das vozes que representam a comunidade<br />
participante na ação educativa.<br />
Educação artística como<br />
desconstrução: o surgimento de<br />
micronarrativas articuladas<br />
O conceito de educação artística como desconstrução<br />
parte da perspectiva pragmatista de<br />
educação artística, assim como propõe Eva Sturm<br />
(2002). Esta professora parte da experiência prática<br />
como condição inicial e essencial de qualquer<br />
atividade de educação artística. O lema de Sturm<br />
é "a arte não existe a menos que não seja aplicada"<br />
(2002), assim que o que está em jogo é o conhecimento<br />
da arte, é necessário revê-lo desde<br />
um modo de ser, desde uma forma de atuação.<br />
Aqui é precisamente onde Eva Sturm propõe a<br />
educação artística como a busca constante de reinterpretações<br />
e suas aplicações constantes desde<br />
o discurso da arte. Esta autora compreende<br />
43
44<br />
a desconstrução como uma estratégia crítica de<br />
aproximação a textos (obras de arte) que permitem<br />
a possibilidade de visualizar relações intertextuais<br />
e diversas aplicações e perspectivas diferentes<br />
a partir da mesma obra de arte.<br />
As possibilidades de interpretar a educação<br />
artística como um fenômeno desconstrutivo deveriam<br />
não só se limitar a uma metodologia ou<br />
aplicação crítica da arte em determinados discursos,<br />
mas sim analisar as consequências e as novas<br />
relações que se estabelecem nos discursos.<br />
Por isso, a desconstrução potencializa a emergência<br />
de olhares periféricos e a aplicação do discurso<br />
da arte em outros discursos, rompendo e<br />
dilatando barreiras.<br />
A desconstrução é entendida como uma reconstrução<br />
polifônica de todos os processos<br />
colaborativos do sistema cultural chamado educação<br />
artística. Os sujeitos ou participantes não só<br />
discutem sobre arte como também analisam, representam<br />
e materializam uma forma de distribuição<br />
que se infiltra nos mesmos espaços de poder<br />
que o sistema da Arte como instituição constrói.<br />
A educação artística, como um processo colaborativo,<br />
emerge e se desenvolve através de espaços<br />
interdiscursivos, desenvolve a partir daí um<br />
crescimento crítico, um "apoderar-se" de todos os<br />
agentes envolvidos como elementos produtores<br />
de conhecimento e de cultura.<br />
(Comente este artigo em<br />
mediacao@colegiomedianeira.g12.br)<br />
ANGELA CARRANCHO DA SILVA<br />
Editora Mediação<br />
Referências:<br />
ESCOLA ESCOLA COM COM ARTE ARTE - - MUL MUL MULTICAMINHOS MUL TICAMINHOS P PPARA<br />
P PARA<br />
ARA A A TRANSFORMAÇÃO<br />
TRANSFORMAÇÃO<br />
BUTLER, Judith. Bodies that Matter. On the Discursive<br />
Limits of "Sex". Nova York: Routlege, 1993.<br />
FOUCAULT, Michael. Microfísica del poder. Madrid: La<br />
Piqueta, 1992.<br />
GIROUX, Henry. Escola crítica e política cultural. São<br />
Paulo: CORTEZ : AUTORES ASSOCIADOS, 1987<br />
GORE, Jennifer, M. Controversias entre las pedagogías.<br />
Discursos críticos y feministas como regímenes<br />
de verdad. Madrid: Morata, 1996.<br />
HARAWAY, Donna. Ciencia, cyborgs y mujeres. Madrid:<br />
Cátedra, 1995.<br />
STURM, Eva. Give a voice. Patcicipación educative en<br />
projeto na Normandia. En Posch, Herbert R. y Sturm,<br />
Eva (ed.). Viena: Turia Kant Verlag, 2000.<br />
SILVA, Tomaz Tadeu. Espacios de identidad. Nuevas<br />
visiones sobre el currículum. Barcelona: Octaedro,<br />
2001.<br />
YÚDICE, George. El recurso de la cultura. Usos de la<br />
cultura en la era global. Barcelona: Gedisa, 2002.<br />
Ana Paula Ferreira da Luz é mestranda no<br />
programa de pós-graduação Artes Visuais e<br />
Educação: um enfoque construcionista, na<br />
Universidade de Barcelona (2008 - <strong>2009</strong>).<br />
Possui licenciatura em Educacão Artística -<br />
hábilitacão Artes Plásticas, pela Faculdade de<br />
Artes do Paraná (2004). É especialista em<br />
História da Arte Moderna e Contemporânea<br />
pela Escola de Música e Belas Artes do<br />
Paraná (2005). Atualmente, é professora de<br />
Artes do <strong>Colégio</strong> <strong>Medianeira</strong>.<br />
anapaulaluz@hotmail.com<br />
O que o leitor tem nas mãos, diz Alberto Tornaghi, no prefácio deste livro, não é um<br />
texto sobre educação, são vários. Vários autores, artigos, temas, abordagens e focos<br />
distintos, mas cujo traço-de-união fica por conta de uma mesma luta - tratam todos<br />
eles dos desafios do ensino da arte na educação básica e das artes em suas variadas<br />
manifestações. Os autores deste livro lutam contra o tolo desperdício de riqueza e de<br />
força transformadora que ocorre na escola quando as artes não fazem parte dos<br />
currículos escolares. O livro traz os seguintes temas - Um hipertexto sobre arte na<br />
educação; Ensino da arte na escola; do abracadabra ao abre-te sésamo; A arte entra<br />
em cena na escola; O teatro de Brecht - Prazer e transformação social; Cirandas<br />
virtuais - Tradição e tecnologia parceiras de um novo tempo; TV e multiculturalidade<br />
na escola; O começo é o fim pelo avesso; crianças ilustrando narrativas.<br />
Nota:<br />
1 A Pedagogia Crítica recusa a tese de que o conhecimento<br />
e a escola são neutros e que, portanto, os<br />
professores devem ter uma atitude neutra. "A escola<br />
é um processo político, não apenas porque contém<br />
uma mensagem política ou trata de tópicos políticos<br />
de ocasião, mas também porque é produzida<br />
e situada em um complexo de relações políticas e<br />
sociais das quais não pode ser abstraída". (GIROUX,<br />
1987)
É<br />
tudo<br />
NOVO<br />
de NOVO<br />
A dança do<br />
leva e traz<br />
Por Mábile Borsatto<br />
Assim como na reciclagem dos<br />
resíduos sólidos (lixo), também a<br />
arte não joga fora o saber<br />
acumulado pelas tendências<br />
artísticas do passado.<br />
45
46<br />
Na arte pós-moderna, encontramos novas<br />
versões para o conceito de repertório corporal,<br />
ou seja, agora se fala que modernizar o passado<br />
é atualizar-se através de processos artísticos, utilizando<br />
o passado para valorizar seu produto.<br />
Mas reciclar produtos culturais não é exatamente<br />
como reciclar detritos sólidos. Na reciclagem<br />
de lixo, os produtos serão utilizados novamente,<br />
com novas funções, novos formatos com<br />
praticamente a totalidade de aproveitamento<br />
desse material. Na reciclagem artística, há o risco<br />
de efeito inverso. Como o procedimento é<br />
amplo, podendo ser utilizado nos mais diversos<br />
contextos, serão consideradas pertinentes à cultura<br />
da reciclagem apenas as práticas criativas<br />
que exploram a materialidade das linguagens,<br />
manipulando com postura crítica o material tratado,<br />
especialmente nos casos em que isso acontece<br />
na dança.<br />
Isso é justamente uma tentativa de entender<br />
que as relações são possíveis entre momentos<br />
e estudos passados e a formulação do conhecimento<br />
que se oferece nas produções presentes<br />
em dança. É o retrato de um processo que envolve<br />
análises e principalmente consciência do<br />
que se está utilizando em um novo contexto.<br />
A favor dessa relação, um conceito aparece<br />
como um dos grandes temas da dança contemporânea,<br />
o hibridismo das manifestações artísticas.<br />
Talvez a questão central esteja presente no<br />
eixo evidente de sua organização, o uso de estudos,<br />
movimentos, técnicas desenvolvidas ante-<br />
riormente às nossas produções, obrigando-nos<br />
no bom sentido à leitura de uns poucos parágrafos<br />
resultantes da busca das motivações para a<br />
tentativa adiante, buscando nas raízes encontrar<br />
inúmeras manifestações de igual importância e<br />
relevância cultural.<br />
O presente artigo sugere então que a reciclagem,<br />
um dos exemplos de como o ideário<br />
dessa cultura se insere progressivamente em<br />
setores sociais cada vez mais amplos, acontece<br />
também na arte. Por isso, o símbolo de uma<br />
sociedade preocupada em preservar suas reservas<br />
naturais e reaproveitar os detritos sólidos<br />
pode também ser apontado nos valores<br />
artísticos. Assim, parece razoável aproximar a<br />
dança do universo em que a pesquisa entre corpo,<br />
espaço e tempo faz-se extremamente im-<br />
portante para construções coerentes capazes<br />
de (re)viver sua história, corporificar conceitos<br />
e equilibrar pesquisas passadas/presentes que<br />
dialogam. Reciclar é um estímulo constante na<br />
troca de experiências e conhecimentos. A troca<br />
é feita não apenas na apreciação dos espetáculos,<br />
mas também na criação de espaços<br />
de diálogo, sejam eles teóricos ou práticos.<br />
Essa aproximação implica um novo tipo de<br />
relação de autoria, resultado do diálogo frágil<br />
entre criadores. O grande problema dessa reciclagem<br />
é que na grande maioria não acontecem<br />
grandes mudanças na estrutura coreográfica<br />
e na organização cênica, que geralmente<br />
aparecem apenas com uma nova roupa sem<br />
qualquer relação com o tempo e espaços atuais.<br />
Apenas reproduções desfocadas com o propó-
sito fraco de manter vivos os ideias de outra<br />
geração distante das nossas problemáticas.<br />
A recontextualização de objetos e obras dos<br />
mais diversos tipos não pode favorecer as idéias<br />
de reprodução. Ainda que isso aproxime a prática<br />
das diversas formas de intertextualidade, é<br />
preciso deixar claro que só há reciclagem com<br />
intuito de renovação quando existe um reaproveitamento<br />
dos materiais e conceitos que compõem<br />
o texto de partida, mas com transformações<br />
e práticas de reutilização coerentes com o<br />
que o presente pretende comunicar. Nesse contexto,<br />
reciclar é marca de uma sociedade em que<br />
o excesso, a velocidade, e a multiplicidade interessam<br />
porque são nossos.<br />
Vivemos mais as sujeiras e as belezas do passado<br />
buscando na diversidade o direito de exercer<br />
autonomia, aceitando e re-configurando todos<br />
os padrões e pré-conceitos sobre o corpo<br />
e, simultaneamente, sobre arte e sociedade. A<br />
articulação das ações desenvolvidas pela reciclagem<br />
artística aponta para a sua consistência. A<br />
ampliação do diálogo potencializa as ações de<br />
intercâmbio e disseminação de conhecimento no<br />
terreno da dança. A manutenção dessa rede de<br />
trocas entre passado/presente/futuro resulta em<br />
bons frutos para a cena que ganha espaço de difusão<br />
para criação em dança.<br />
Enfim, a dança do leva e traz é a novidade antiga<br />
que, feita de maneira consciente, guarda continuidade,<br />
pois possibilita a troca, o diálogo e<br />
principalmente o caráter mutável tão presente na<br />
arte e na sociedade. E assim trabalhamos com a<br />
dança como uma expressão de um corpo sóciopolítico-cultural.<br />
Pesquisa-se então a arte que trabalhe<br />
com os significados e que trace relações<br />
diretas entre dança e contexto, formando uma<br />
imensa rede de relações. Ligações intimamente<br />
unidas na produção de conhecimento e novos<br />
questionamentos de mundo. Desse modo, reciclar<br />
é realmente preciso.<br />
(Comente este artigo em<br />
mediacao@colegiomedianeira.g12.br)<br />
Mábile Borsatto é professora de Dança do<br />
<strong>Colégio</strong> <strong>Medianeira</strong>. É formada em<br />
Bacharelado e Licenciatura em Dança pela<br />
FAP (Faculdade de Artes do Paraná), mesma<br />
instituição onde faz especialização em Artes e<br />
Ensino das Artes. Pesquisadora em Dança<br />
Contemporânea na Attraverso Cia de Dança.<br />
O O O F FFAZER-DIZER<br />
F FAZER-DIZER<br />
AZER-DIZER DO DO CORPO CORPO: CORPO<br />
DANÇA ANÇA E E E PERFORMA PERFORMATIVID<br />
PERFORMA TIVID TIVIDADE TIVID ADE<br />
JUSSARA SOBREIRA<br />
SETENTA<br />
Editora da UFBA<br />
O livro parte da premissa<br />
de que dança e política<br />
compartilham o mesmo<br />
processo de constituição<br />
das propostas e idéias artísticas<br />
e coletivas. Afirma<br />
que, é possível pensar a<br />
dança como um fazer que<br />
é dizer, onde, dança e política co-existam e acionem<br />
outros modos de agir artisticamente, capaz<br />
de discutir, com o seu fazer, qual o "lugar" da dança<br />
na sociedade atual. Para isso, divide-se em três<br />
capítulos: o primeiro e o segundo abordam o corpo<br />
que dança com ênfase na organização da fala<br />
do corpo e nas questões de poder contidas nesses<br />
corpos. Já o terceiro revela as implicações<br />
políticas provenientes do fazer-dizer performativo.<br />
A obra possui, ainda, diversas ilustrações que fazem<br />
uma conexão direta com o texto escrito e que<br />
facilitam a compreensão do leitor.<br />
47
48<br />
ALMÔNDEGAS<br />
Saiba mais sobre a<br />
importância histórica,<br />
sociológica, filosófica<br />
e gastronômica das...<br />
almôndegas. Ah, e<br />
aprenda como fazêlas,<br />
é claro.<br />
Por Marcelo Weber<br />
Não adianta subestimar a importância e a<br />
superioridade da cultura árabe em vista da cultura<br />
cristã da Europa medieval. O árabe ensinou<br />
o europeu a tomar banho, fazer cálculos,<br />
geometria, gostar de arte, cozinhar decentemente,<br />
barbear-se, curar doenças, ver estrelas,<br />
fazer fontes e regaços, escrever história, fazer<br />
amoníaco, Al-kool, poesia e também... almôndegas.<br />
Al-bundqa, ou al-bondoca, como eles<br />
chamavam, o que quer dizer bolinha, bolinha<br />
de carne picada.<br />
Já se roíam almôndegas nas caravelas durante<br />
a epopeia portuguesa. Pero Vaz de Caminha<br />
relata a El Rei Don Manuel, na carta do Achamento<br />
do Brasil, que dois índios levados a bordo<br />
experimentaram biscoitos e fugiram de uma galinha,<br />
mas esqueceu-se de dizer que estes dois<br />
pioneiros foram recebidos primeiro às almôndegas<br />
- que mastigaram e cuspiram fora, contorcendo-se<br />
em caretas de desgosto. Maior sucesso<br />
fizeram os espelhinhos, anzóis, bugigangas de<br />
1,99 e finalmente as hóstias dos batismos. Pero<br />
Vaz não sabia que os índios seriam por mais de<br />
600 anos adiante bacamarteados, arcabuzados e<br />
espingardeados, resfriados, sifilizados, dizimados<br />
e, os que sobrassem, civilizados.<br />
A Carta, aliás, é muito vaga, visto que não<br />
nos dá notícia de receita alguma.<br />
As almôndegas mudaram muito com o passar<br />
do tempo, acompanhando a evolução dos<br />
povos. No princípio eram duras, indigestas,<br />
grandes, secas, de carne picada, sal, pimenta<br />
do reino, ovo, farinha, mas com o advento das<br />
navegações - e o ouro, a prata e principalmente<br />
os tomate de Potosi - os europeus puderam<br />
experimentar a almôndega umedecida, navegando<br />
em molhos vermelhos nunca dantes
mergulhados. Era o requinte, era a Renascença....<br />
e as almôndegas ganharam com isso. Por<br />
que não ganhariam?<br />
As raspas de noz moscada, ou uma pitada<br />
de chili, ou pimenta calabresa ou murupi são<br />
algumas das tantas benesses da circunavegação<br />
e da modernidade penetrando no seio da<br />
civilização arcaica Greco-romana, Católica<br />
Apostólica, através, também, da almôndega.<br />
Do mesmo modo que o pintor Masaccio e o<br />
arquiteto Brunelleschi deram corpo ao espírito<br />
renascentista imprimindo os cânones da nova<br />
Almondêgas<br />
RECEITA PARA 4 PESSOAS:<br />
400 g. carne moída de primeira<br />
(um dia ensino como comprar carne<br />
e como se comportar no açougue)<br />
¼ de linguiça Blumenau<br />
1 molho salsinha<br />
1 cebola ralada<br />
1 tomate<br />
Dois pães amanhecidos<br />
Queijo parmesão<br />
Dois dentes d'alho<br />
Folha de louro<br />
Noz moscada raspada<br />
Raspas de limão<br />
Dois ovos<br />
Leite<br />
Farinha de rosca fresca<br />
estética em todos os cantos da terra onde houvesse<br />
civilização, Parma estigmatizou com seu<br />
queijo as velhas almôndegas da Idade Média, o<br />
pão as tornou macias, o molho as elevou a esferas<br />
supra-lunares, o macarrão as platonizou.<br />
La divina pasta con polpette, diria Dante Alighieri<br />
no relato do paraíso... mas o coitado morreu antes<br />
de conhecer o molho de tomates...<br />
Hoje, crianças, mulheres grávidas, idosos,<br />
místicos, artistas plásticos, reitores, bacharéis<br />
comem e recomem almôndegas. Índios comem<br />
almôndegas com Lévi-Strauss e dançam e cantam<br />
com Sting.<br />
MODO DE PREPARAR:<br />
Misture a carne moída com a linguiça Blumenau, e o<br />
alho picado e a salsinha e a pimenta do reino. Acrescente<br />
o pão descascado e molhado no leite, mas espremido<br />
na mão para que saia o excesso. Acrescente<br />
à noz moscada as raspas de limão e o queijo ralado.<br />
Faça bolinhos com ajuda de farinha de rosca ou de trigo.<br />
Deve ficar firme.<br />
Não precisa passar no ovo e farinha, nem fritar.<br />
Prepare um molho refogando uma cebola, dois dentes<br />
de alho com uma folha de louro, e acrescente 3 ou<br />
4 tomates maduros e sem pele. Deixe apurar e coloque<br />
mais salsinha e cebolinha. Terminada esta operação,<br />
coloque as almôndegas com cuidado para não<br />
desmanchar e abaixe o fogo.<br />
Veja que as almôndegas soltarão água. Se o molho não<br />
estiver previamente apurado, ele fica muito líquido.<br />
Na próxima edição, tem mais.<br />
Marcelo Weber é artista no seu sentido mais amplo, renascentista. Ex-aluno do <strong>Medianeira</strong> e agora pai de<br />
aluna, é autor do Mural do Conhecimento, obra em azulejo em exposição na entrada principal do <strong>Colégio</strong>.<br />
49
50<br />
O ATRASO<br />
Amanheceu o dia, escutei o barulho do avião,<br />
do cachorro e dos carros. Tenho cinco minutos<br />
para chegar à escola, passei a mão no pente, batom<br />
e perfume, saí em disparada ao encontro dos<br />
meus alunos. O cabelo todo bagunçado precisou<br />
sair enlaçado. Calça desbotada, um tênis nos pés<br />
e muitos sonhos na cabeça. Ah, este dia foi todo<br />
atrapalhado, mas um dia inesquecível, ganhei<br />
mais beijinhos do que imaginava e todos sentiram<br />
o cheiro forte da minha correria, que estava<br />
com gosto de quero ensinar, quero dar o meu<br />
melhor a vocês.<br />
No desespero de chegar no horário, senti que<br />
o momento era bom, dividir o que aprendi e sonhei<br />
com meus alunos é muito mais que sentir a<br />
brisa bater nos meus pensamentos, e esta trouxe<br />
todos os sonhos da noite passada, agora entendi<br />
porque dormi demais, sonhei tanto com as<br />
minhas aulas que compreendi que uma noite era<br />
pouco para sentir o brilho dos olhos da Gabriele,<br />
enfrentar os desafios do Reginaldo, entender<br />
o choro da Ale, compreender as queixas do Washington,<br />
em meu sonho deu tudo certo, mas a<br />
realidade transcendeu!<br />
Sentir o cheiro da infância, do espaço escolar,<br />
das perguntas de todos os dias, das conclusões<br />
incertas, certas e apressadas que me fazem querer<br />
sonhar todos os dias com as minhas aulas e<br />
entender que sem sonhos não existe aula, e sem<br />
aula não existe sonho!<br />
Por Rita Waldrigues<br />
Que saudade da turma de 2005, um ano difícil<br />
para enfrentar, um ano de coragem pessoal e um<br />
desafio a conquistar, ensinar o significado das<br />
letras, construir os "sentidos" de que podemos<br />
expressar nossas emoções por meio dos nossos<br />
desenhos, palavras, frases e textos, e com<br />
muita ternura e sabedoria expressar a emoção<br />
de sempre. De chorar escondida no banheiro, de<br />
falar que está com os olhos brilhantes cheios de<br />
tanta emoção e da saudade que sentirei quando<br />
a aula terminar... E quando o sonho da vida real<br />
acabou... O jeito é continuar a sonhar...<br />
Ufa! Cheguei antes do sinal bater, e o sonho<br />
se tornou realidade, ainda penso e entro em conflito,<br />
pois vivi todas as emoções que o sonho<br />
permitiu, assim como as perguntas, as traquinagens,<br />
as macaquices que fizemos para chamar<br />
atenção daqueles amontoados de letrinhas coladas<br />
na parede, que quando estão juntinhas revelam<br />
concretamente os nossos sonhos e desejos<br />
de ensinar sempre da melhor forma. Ainda me<br />
atraso, ainda sonho e ainda ensino com emoção.<br />
E continuo ganhando muiiiiiitos beijinhos.<br />
Rita de Cassia Gomes Waldrigues é formada<br />
em Pedagogia (PUCPR), especialista em<br />
Psicopedagogia (UTPPR) e mestranda em<br />
Educação (PUCPR). É pedagoga da rede<br />
municipal e, no <strong>Medianeira</strong>, atua no<br />
Acompanhamento de Aprendizagem com 2° e<br />
3° anos nas áreas de Língua Portuguesa e<br />
Matemática, no período da tarde.