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Sérgio Araújo

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Introdução<br />

Congresso Internacional de Turismo<br />

Leiria e Oeste<br />

A competição inter-comunitária como factor de diferenciação da oferta turística<br />

<strong>Sérgio</strong> <strong>Araújo</strong>ª<br />

ªDoutor em Turismo pela Universidade de Perpignan<br />

Num mundo marcado pela Globalização, há uma tendência para uma abordagem de<br />

senso comum, imediatista, em torno de uma espécie de massificação inevitável, segundo a<br />

qual, estamos quase irremediavelmente condenados a beber Coca-Cola, a comer<br />

hambúrgueres ou a ver a CNN.<br />

Só que este processo que dá pelo nome de Globalização ou Mundialização, 1 apresenta<br />

uma outra face, menos explorada: a valorização crescente das especificidades locais e/ou<br />

regionais, a valorização da diferença, do simbólico. Podemos dizer que em determinada<br />

medida, a Globalização “alimenta-se” da diferença. Tudo o que é único é notícia e como<br />

defende Carlos Fortuna, os chamados novos intermediários culturais 2 não escapam a esta<br />

perspectiva sistémica da Globalização, assumindo a responsabilidade de promover e vender à<br />

escala planetária “santuários” da diferença que nos ajudam depois a refugiar de uma alegada<br />

massificação. Estando globalizados, gostamos de assumir as nossas diferenças, ou seja a<br />

nossa identidade.<br />

Geram-se assim lucros assinaláveis, sendo mais fácil mediatizar um “paraíso turístico”<br />

mesmo que à posteriori seja mais um espaço massificado. O que importa nesta matéria é<br />

destacar o poder do imaginário colectivo inicial definido em parte pelos referidos “novos<br />

intermediários culturais”. Não será de estranhar que a sedução turística passe em grande<br />

medida pelo Imaginário, (em torno da expectativa que antecede a experiência turística) pela<br />

Autenticidade (o valor do genuíno) e pela Nostalgia (que nos remete para tempos que<br />

julgávamos passados e que reflectem as nossas raízes).<br />

1 O conceito Globalização é oriundo da Escola Anglo-Saxónica enquanto o termo Mundialização é oriundo da<br />

Escola Francesa. Ambos assumem o mesmo significado;<br />

2 Grandes órgãos de comunicação social, grandes eventos mundiais, o cinema, o desporto, vedetas reconhecidas<br />

internacionalmente, a Internet, etc;<br />

1


As comunidades locais e as suas especificidades culturais e naturais podem entroncar<br />

nestes conceitos, inserindo-se nos fluxos do transnacionalismo. Devemos reconhecer que<br />

nunca foi tão fácil exportar, por exemplo, o produto “rojões à moda do Minho, os hábitos<br />

culturais dos monges tibetanos ou o Bacalhau à Braga” como nos tempos que correm.<br />

A Globalização é também esta realidade. E neste sentido, as comunidades locais<br />

vivem uma oportunidade única de afirmação identitária. Reside aqui em grande medida “O<br />

Poder da Identidade” 3 e a “Assumpção Identitária” das comunidades locais que enfrentam<br />

um desafio crucial: assumir nas suas mãos os seus próprios destinos.<br />

Coloca-se desta forma a questão de quem deve assumir a identidade e a resposta mais<br />

pragmática, parece ser aquela que aponta para as próprias comunidades locais, dado que, são<br />

elas em primeira instância que estão em condições de apresentar um conceito essencial à<br />

atractividade do destino turístico: a autenticidade.<br />

A autenticidade (dos valores naturais e culturais) deverá pois ser assumida pelas<br />

comunidades locais e promovida depois pelos instrumentos da Globalização. Contudo, as<br />

comunidades locais, enfrentam por um lado, problemas comuns e por outro problemas muito<br />

próprios que variam de caso para caso. Falta de apoios da mais variada ordem, o isolamento,<br />

falta de know-how e escassez de recursos em linhas gerais, são alguns dos obstáculos que<br />

dificultam a desejada inserção das comunidades nos fluxos do transnacionalismo.<br />

Na gestão deste trabalho complexo e transversal à sociedade, surgirão quase<br />

inevitavelmente as entidades oficiais, tais como autarquias e mesmo o poder central, como<br />

constatamos nos casos de estudo observados neste domínio e que iremos expor mais adiante.<br />

A mobilização e envolvimento das comunidades locais em torno dos seus valores<br />

naturais e culturais, a assumpção identitária local e regional, colocam-se como uma mais valia<br />

promocional, cujo potencial está ainda longe de um aproveitamento desejado em termos<br />

nacionais.<br />

Local e pontualmente existem casos de sucesso, pelo que importa questionar quais as<br />

motivações deste sucesso. Desde logo coloca-se uma série de questões sobre as quais<br />

devemos reflectir, designadamente importa equacionar mecanismos de mobilização e<br />

envolvimento das comunidades locais. E aqui, em função das observações realizadas, surgem<br />

as tradições, as culturas locais e numa fase posterior a competição entre comunidades que<br />

partilham os mesmos sistemas de valores.<br />

3 CASTELLS, Manuel - O Poder da Identidade. S. Paulo: Paz e Terra, 1999.<br />

2


Em Portugal são conhecidas as rivalidades em Montalegre por um pedaço de terreno.<br />

A imagem de que no Barroso “se mata” por um metro de terreno, não é propriamente um<br />

grande exagero, havendo casos registados de conflitos que resultaram em tragédias. Há entre<br />

as comunidades do barroso uma relação muito especial que assenta, por um lado, em fortes<br />

rivalidades e por outro lado, numa solidariedade e num orgulho colectivo perante o exterior<br />

do “sermos barrosãos”.<br />

Competir através das tradições populares para mobilizar e envolver, afirmando a<br />

cultura regional, inserindo-a nos instrumentos da Globalização, estimulado assim a<br />

assumpção da identidade e promovendo um ciclo vicioso pela positiva é a dinâmica registada<br />

em determinadas comunidades dos concelhos de Montalegre, Chaves e Boticas.<br />

O “Fumeiro” e “as Chegas de Bois”<br />

“As Chegas de Bois” são um exemplo de competição entre comunidades do Barroso<br />

que se consubstancia numa promoção identitária regional. Cada aldeia tem o seu “Boi”. O<br />

“Boi do Povo” atesta o orgulho colectivo da aldeia que faz questão de mostrar a sua<br />

“superioridade” face ao Boi da aldeia vizinha e vice-versa.<br />

São os “Bois do Povo" porque são um bem das comunidades, das aldeias. Os animais<br />

alimentam-se em pastos que pertencem a todos, recebem feno, centeio e água que são de<br />

todos, e pernoitam numa casa ("corte") que faz parte do património de todos os aldeões.<br />

Todos os anos, um pastor resgata o boi que cuida durante um ano, dando início a uma<br />

competição com outros bois. É contudo uma competição saudável, não há mortes, o boi luta<br />

naturalmente pela sua posição de macho, sendo que, no Barroso, os Bois do Povo são afinal<br />

motivo de orgulho para todos, mesmo na hora da derrota.<br />

O Boi reúne entretanto uma característica fundamental de agregação da aldeia: o<br />

animal é agressivo apenas perante desconhecidos. Não deixa de ser interessante o facto de se<br />

tratar de uma competição que leva à união e não à discórdia como acontece em competições<br />

“vulgares” como o futebol.<br />

A "Chega" pode ser rápida ou prolongada, caso os contendores sejam do mesmo<br />

gabarito. Em qualquer dos casos, o entusiasmo dos assistentes é indescritível. O final da<br />

"Chega" pode acontecer quando um dos bois foge, assumindo a derrota ou quando um dos<br />

animais é ferido pelas investidas do seu opositor. Para os seus proprietários são momentos de<br />

euforia, quase de glória.<br />

3


Contudo há aqui um facto curioso. Face à expectativa e ao orgulho de uma exibição<br />

perante milhares de forasteiros, as aldeias que se defrontam, fazem-no primeiramente às<br />

escondidas (numa espécie de off record) e apenas avançam para o espectáculo público se os<br />

animais mostrarem que estão em condições de mostrar a virilidade do povo barrosão, ou se<br />

quisermos, de todas as aldeias das redondezas. As lutas são uma autêntica festa de música e<br />

claro de gastronomia. No final, a imagem que resta são as “Chegas de Bois” de Montalegre.<br />

O animal vencedor passa a ser quase venerado pelos seus proprietários. Há exemplos<br />

de aldeias que veneraram de tal forma o seu campeão que lhe constroem estátuas com o<br />

granito da região. Um animal vencedor é igualmente cobiçado pelas aldeias vizinhas,<br />

tornando-se num cobridor que irá render alguns lucros suplementares aos seus donos.<br />

Os homens das Terras do Barroso continuam a vibrar com o mesmo entusiasmo face a<br />

qualquer uma das "Chegas" que se vão realizando por ocasião das festas anuais de cada<br />

povoação, sendo actualmente uma evocação folclórica que logrou subsistir à passagem dos<br />

anos e ao esquecimento do dia-a-dia comunitário das gentes do interior transmontano”. 4<br />

A competição estende-se ao “Fumeiro”. Cada família, cada lar, tem uma produção<br />

própria com especificidades e paladares diferentes da do vizinho. E nas aldeias de<br />

Montalegre, situação que se alastra pelos concelhos de Boticas e Chaves, cada família faz<br />

questão de mostrar que os seus enchidos são superiores aos da vizinhança. O curioso é que há<br />

troca de fumeiro entre as famílias e na hora de receber forasteiros, incluindo turistas, a<br />

imagem transmitida colectivamente é aquela, segundo a qual, o “nosso fumeiro” é o melhor<br />

de Portugal. “E ai do forasteiro que diga mal do fumeiro do vizinho”.<br />

Observa-se que a concentração de famílias em determinadas áreas e consequentes<br />

relações de vizinhança e parceria são motivo de competição e produção. No Barroso, o Porco<br />

é tradicionalmente fonte de subsistência. A raça Bízara, raça autóctone da região, pela sua<br />

distinção no paladar e textura da carne assume um papel de destaque.<br />

Contudo, também se observa que famílias isoladas, faltando-lhes incentivos de uma<br />

vizinhança que tenha orgulho na sua produção, dão menos valor ao fumeiro. O esmero e a<br />

quantidade não são os mesmos. A partilha acaba por resultar em competição e a competição<br />

acaba por fomentar a partilha. No fundo, o isolamento leva a que o Barrosão procure pretextos<br />

para interagir, mostrando um espírito de corpo através de uma oferta turística transversal e<br />

sedutora: a gastronomia.<br />

4 Rituais – Circuitos Temáticos, Chegas de Bois no Barroso, in Rotas e Destinos, 2005.<br />

4


A variedade de paladares do Fumeiro de Montalegre é por isso enorme, quase infinita,<br />

porque esta variedade muda também de ano para ano. Todos os produtores querem mostrar<br />

que são melhores. No final temos a Feira do Fumeiro de Montalegre, um cartaz turístico<br />

avaliado pelo presidente da autarquia local, em cerca de cinco milhões de euros. Estes<br />

números têm um peso significativo para as comunidades rurais deste concelho do Parque<br />

Nacional da Peneda Gerês.<br />

Em toda a sua envolvência, no Inverno, a feira assume-se já como um indicador<br />

estratégico de actuação económica. O evento que contou com 150 expositores em 2005,<br />

assume um significado muito maior do que a venda registada no próprio certame,<br />

designadamente através da venda de outros produtos e do aumento da procura hoteleira e<br />

turística que a região tem vindo a registar.<br />

Classificando o fumeiro e o presunto de Montalegre como uma “mina de ouro”, o<br />

presidente da câmara municipal de Montalegre considera que para alcançar os níveis<br />

desejados de receitas é necessária alguma dose de risco empresarial (à qual os emigrantes<br />

devidamente apoiados poderão corresponder) e melhorar continuamente os níveis de<br />

organização, designadamente ao nível da produção e da comercialização. O responsável<br />

político refere que “obviamente sem pôr em perigo a autenticidade do produto, é necessário<br />

dar um salto quantitativo na produção e nas vendas, até porque estamos perante algo que tem<br />

nome, mercado e qualidade”.<br />

Ao mesmo tempo que pretende contribuir para preservar a tradição e a cultura, o<br />

município de Montalegre que suporta inteiramente os custos do certame, quer igualmente<br />

robustecer a Feira do Fumeiro, assumindo-a definitivamente como um acontecimento<br />

económico. Por isso mesmo é que a edilidade tem feito grandes investimentos para melhorar<br />

o evento, sendo que o certame realiza-se já num novo espaço, no Parque de Exposições e<br />

Feiras, uma obra de cerca de 9 milhões de euros e com cerca de 2 mil metros quadrados.<br />

A promoção dos produtos locais tem sido feita precisamente no sentido de rentabilizar<br />

as potencialidades económicas da região, cada vez mais encarada como uma zona do país que<br />

tem muito para oferecer ao turismo nacional em termos de autenticidade.<br />

Fernando Rodrigues não tem dúvidas que a Feira do Fumeiro é um forte motivo de<br />

atracção, sendo sinal disto mesmo o facto de as unidades hoteleiras esgotarem em termos de<br />

ocupação e no fim de semana em questão, o certame proporcionar o movimento de um milhão<br />

e 250 mil euros, o que “para uma economia rural e débil como a de Montalegre tem um<br />

significado muito importante. A cooperação entre produtores poderá revelar-se também como<br />

uma mais valia para alcançar objectivos mais ambiciosos”.<br />

5


A Feira do Fumeiro de Montalegre está a contribuir para fidelizar clientes, para<br />

aperfeiçoar e melhorar a qualidade da produção, sendo sinal disto mesmo o facto de<br />

Montalegre ter já uma série de cozinhas licenciadas cumprindo todas as normas higiénicas e<br />

sanitárias. A Feira do Fumeiro é o maior evento da região, tendo sido vendidas sessenta<br />

toneladas de produto e passaram pelo certame mais de 50 mil pessoas.<br />

São muitas as especialidades, desde a linguiça, a bocheira, chouriças diversas e<br />

salpicões, diversas partes fumadas do animal e o inevitável presunto, capaz de seduzir os<br />

paladares mais exigentes. Em Montalegre, a população já aprendeu que os hábitos seculares<br />

de cada família produzir o seu fumeiro único, afirmando-o e competindo com os vizinhos,<br />

acaba por ser um factor de coesão que promove a comunidade.<br />

Esta competição salutar é transmitida para a Feira do Fumeiro, sendo que na edição de<br />

2005 apareceram com admiração os maiores presuntos da Feira: cinquenta e três quilos, cada<br />

um. Esta forma saudável de competir é ilustrada pelo facto de os presuntos gigantes não<br />

estarem à venda, dizendo os seus donos que ainda não estavam devidamente curados. No<br />

entanto assumiram que estavam expostos para ser admirados.<br />

Segundo informava o proprietário dos presuntos a todos os que paravam para admirar<br />

o fenómeno, o porco que proporcionou presuntos desta natureza foi criado na aldeia de<br />

Tourém e pesava quase 400 quilos. A esta realidade de necessidade de exibição e competição<br />

está sempre associado um ambiente de convívio entre as comunidades locais que admiram e<br />

sentem orgulho nas suas raridades locais.<br />

Esta realidade é determinante no sentido de proporcionar uma envolvência da<br />

comunidade que vê reconhecidos os seus dotes gastronómicos num evento que é já referência<br />

em Portugal e mesmo na Galiza, Espanha.<br />

O Fumeiro e as realidades envolventes<br />

Aproveitar todas as potencialidades naturais, patrimoniais e culturais, valorizando-as e<br />

preservando-as é o grande objectivo da autarquia para os próximos tempos, nomeadamente<br />

através da criação do Eco – Museu.<br />

Aquilo que é manifestamente diferenciador é assim apontado como solução<br />

estratégica. O Fumeiro, a Gastronomia e as tradições em geral, são factores que podem<br />

corporizar uma plataforma cultural nos territórios das comunidades envolvidas, plataforma<br />

esta que poderá alavancar uma actividade turística sustentável e que tenha em conta as novas<br />

6


exigências do sector. São inúmeros os benefícios que podem surgir com a dinamização e<br />

promoção destes produtos, caracterizados por uma forte transversalidade, afectando toda a<br />

comunidade.<br />

A gastronomia, as “chegas de bois”, a música popular e o próprio ambiente rural, são<br />

assim uma mistura que confere um ambiente muito próprio e autêntico assente numa forte<br />

componente cultural identitária das comunidades que fazem questão, por um lado, em assumir<br />

as suas tradições e por outro, sentem orgulho ao exibi-las perante forasteiros.<br />

Esta exibição acaba por ser uma forma de afirmação perante um mundo exterior que<br />

desde sempre abandonou estas terras. Mas também conforme as gentes locais fazem questão<br />

de referir, “nunca precisamos que os outros se metessem nos nossos assuntos, quando muito,<br />

vamos para fora trabalhar”. 5<br />

Em termos práticos constatamos que a Feira do Fumeiro e as Chegas de Bois são<br />

iniciativas que se complementam entre si, aproximando e envolvendo as comunidades locais<br />

em torno de actividades tidas como autênticas sob o ponto de vista da identidade cultural local<br />

e regional.<br />

Na perspectiva do turista, tudo está em harmonia, desde o ambiente natural, cultural e<br />

comunitário. O ambiente comunitário é aqui referido dado que são as comunidades que<br />

conseguem o mérito de transmitir este sentido de equilíbrio e harmonia entre natureza e<br />

cultura.<br />

Algumas notas como conclusão<br />

A gastronomia enquanto oferta turística transversal que afecta decisivamente o<br />

Turismo em geral, tem assumido em Montalegre um papel económico assinalável ao ponto de<br />

surgirem já concelhos vizinhos a tentar e com sucesso, seguir os mesmos passos. É o caso de<br />

Boticas que organizou já várias edições da Feira Gastronómica do Porto. O certame, segundo<br />

nos garantiu o presidente da autarquia local, tem motivado positivamente as comunidades<br />

locais no sentido destas se dedicarem mais aos produtos de fumeiro.<br />

Por outro lado, é visível a competição através do Fumeiro entre comunidades de<br />

Boticas e de Montalegre.<br />

O papel institucional enquanto alavanca deste potencial tem sido determinante. Ao<br />

organizar eventos que corporizam o orgulho barrosão perante o exterior, a autarquia de<br />

5 A zona de Montalegre regista um elevado índice de emigração, constatando-se no entanto que os emigrantes<br />

têm uma forte tendência para voltar à sua terra, à qual continuam emocionalmente ligados.<br />

7


Montalegre conseguiu realizar cartazes turísticos assentes nos valores da autenticidade, do<br />

imaginário e da nostalgia, seguindo assim um Turismo de Prestígio na perspectiva de Harkin<br />

que surge como alternativa sustentável às ofertas massificadas.<br />

Montalegre branca, cheia de neve, paisagens únicas, comunidades locais hospitaleiras,<br />

o silêncio e a paz com restaurantes a servir o genuíno Cozido à Transmontana e o Fumeiro<br />

Barrosão, ou, por outro lado, no Verão, os percursos pedestres, praias fluviais e a caça e<br />

pesca, são potencialidades que poderão ser produtos turísticos de um país que sem escamotear<br />

o peso económico dos produtos massificados, necessita urgentemente de diversificar as suas<br />

ofertas turísticas. Esta diversificação terá como base plataformas culturais próprias de cada<br />

território determinadas em grande medida pelo envolvimento das respectivas comunidades. A<br />

diversidade cultural do território português, o que é visível na diversidade da própria<br />

Gastronomia é nesta perspectiva, uma vantagem a ter em linha de conta.<br />

Ainda recentemente, o ICEP publicava um estudo, segundo o qual, a Cultura e<br />

particularmente a Gastronomia, eram as ofertas que mais seduziam os turistas estrangeiros,<br />

independentemente da sua origem. Ora, assumindo Portugal esta distinção em termos<br />

gastronómicos, uma grande questão estrutural do nosso país passa forçosamente pelo<br />

estabelecimento de uma plataforma cultural do território atractiva assente na autenticidade e<br />

no envolvimento comunitário.<br />

A Feira do Fumeiro de Montalegre traduz esta realidade assente na competição inter-<br />

comunitária e no orgulho colectivo das comunidades barrosãs.<br />

As notícias, sobretudo as da televisão, aglutinam ainda mais estas comunidades em<br />

torno dos seus valores culturais colectivos. Os novos intermediários culturais são assim um<br />

instrumento da globalização fundamental para o envolvimento das comunidades em torno do<br />

seu património, conseguindo-se assim a desejada assumpção do Poder da Identidade.<br />

Num mundo em que se valorizam as diferenças, serão as próprias comunidades que<br />

reúnem melhores condições para assumir e promover os seus valores naturais e culturais. São<br />

as comunidades que reúnem condições naturais para transmitir o conceito essencial de<br />

“autenticidade” da oferta. Montalegre teve o mérito de impulsionar esta realidade e tem agora<br />

a responsabilidade de impedir uma massificação marcada por uma indesejada intromissão de<br />

elementos não autênticos.<br />

Fumeiro:<br />

Em Montalegre observam-se os seguintes impactos relacionados com a produção de<br />

- A criação de emprego ligado à actividade.<br />

- Os níveis de confiança da população local.<br />

8


- O surgimento de cursos de formação profissional nas áreas do turismo, hotelaria e<br />

restauração.<br />

- Procura crescente dos produtos ligados ao fumeiro que leva os produtores a acreditar num<br />

projecto que dure ao longo de todo o ano e não apenas do decorrer da Feira do Fumeiro.<br />

- O aumento nos últimos anos de unidades hoteleiras mercê do impacto do certame que todos<br />

os anos atrai milhares de turistas.<br />

- Sensibilização das entidades oficiais locais, regionais e nacionais para a importância dos<br />

produtos tradicionais.<br />

- A promoção de outras iniciativas tradicionais que directa ou indirectamente relacionadas<br />

com a Feira do Fumeiro, conquistaram uma importância acrescida. 6<br />

6 O Padre Fontes, organizador do Congresso de crenças populares de Vilar de Perdizes, foi o impulsionador da<br />

primeira edição da Feira do Fumeiro.<br />

9


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