eBook - Antropologia Missionária - Ronaldo Lidorio - Juvep
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um grande perigo tanto para um indivíduo como para um pequeno grupo que passe a noite sem proteção. Atravessam um riacho e ouvem vozes ao longe. Um enorme alívio passa pelo coração de todos pois a noite já chegava. Entretanto, como feiticeiro grumadii Mebá não poderia entrar em uma nova aldeia sem antes sacrificar ao seu fetiche que cuidadosamente trazia guardado em uma bolsa de couro cru pendurada no ombro esquerdo. Cada clã Konkomba é associado a um totem 2 - objeto, planta ou animal - que representa aquele grupo e demanda para si certos tipos específicos de sacrifícios. Os três mais comuns são ‘begangmanm’ – o leopardo - ‘bwawintieb’- o crocodilo - e ‘bekumbwan’ – a hiena. Como seguidores de ‘begangmanm’ deveriam sacrificar um macaco e derramar o seu sangue sobre a raiz exposta de alguma grande árvore nas imediações da nova aldeia que adentrariam. Preferencialmente procurariam uma árvore próxima a uma encruzilhada, exigência para aqueles que partiram da terra natal, o que na visão animista indica que espíritos de longe virão e levarão o sacrifício para a terra de onde saíram. Entretanto não haveria tempo de caçar ou sacrificar pois a noite chegava, assim Mebá e sua família dormiram no mato, próximo a um pequeno riacho, ouvindo vozes ao longe na aldeia que sabiam ser Koni. Pela manhã, após o sacrifício entraram na aldeia que era formada por palhoças circulares e simetricamente agrupada em três diferentes áreas marcando a existência de três clãs. Imediatamente Mebá foi reconhecido por um membro do seu clã através de suas marcas faciais e dialeto falado sendo acolhidos pelos Sanbol, dos quais Laason era o mais velho. Koni era uma aldeia circundada por árvores altas e frondosas tendo ao sul o rio Molan. As palhoças que davam o toque humano no meio do que parecia uma floresta virgem eram baixas, circulares, cobertas cuidadosamente com palha seca e agrupadas em círculos de forma a protegerem-se. Era habitada por pouco mais de 200 pessoas e, além dos clãs Konkombas, membros das tribos Chokossi e Fulani haviam migrado para os derredores. Como exige a tradição, tais estrangeiros poderiam cultivar terras Konkombas desde que passassem a falar a língua e aprendessem as danças do povo que os recebia, demonstração de respeito ao grupo acolhedor. Assim Chokossis e Fulanis desde os primeiros dias passaram a guardar a própria língua e costumes para usarem apenas quando estivessem em suas próprias palhoças. 238 eBook – Antropologia Missionária – Ronaldo A Lidório
Os Konkombas formam uma nação tribal basicamente dividida em quatro grupos maiores. Bimonkpeln, Bichaboln, Bikuln e Kombas os quais se subdividem em 23 etnias e sub-etnias. Estas se dividem novamente em 64 sub-etnias que se subdividem uma vez mais em 123 micro-dialetos. As marcas faciais e os dialetos são as provas cabais da identidade cultural de cada um. ‘Grumadii fu ni’ – “Grumadii chegou” – disse Laason naquela noite, enquanto conduzia Mebá pelas palhoças dos outros clãs. Grumadii era o nome do fetiche que Mebá servia de ‘guardião’. Em cada clã Konkomba um fetiche é adorado. Os Sanbol adoram grumadii que é tido como ‘o fetiche guerreiro’, ‘aquele que mata’ ou ‘aquele que demanda morte’ e temido por todos os outros clãs fazendo com que os Sanbol sejam especialmente influentes. Naquela mesma noite algumas árvores foram escolhidas na periferia de Koni como ‘asori’ – lugar sagrado – e preparado o local para as cerimônias. Para inaugurar ‘o tempo grumadii’ na aldeia sacrifícios seriam necessários. Mebá toma então as “litakpal-watiir”, pequenas pedrinhas brancas usadas no fetichismo para convidar os espíritos, invoca grumadii que vem e possui vários naquela noite. Assim o espírito ordenou o sacrifício de uma criança e iniciou a exposição de ordens e medidas que afetariam toda a vida do povo na aldeia de Koni e imediações sob a proteção de Grumadii. Estas ordenanças influenciavam desde as preces, casamentos, criação de filhos até os funerais e cerimônias comuns ao povo. Era o preço para que Grumadii habitasse em Koni e, apesar de sua conhecida personalidade maligna, passou a ser adorado e temido em num misto de atração e terror. A partir daquele dia Mebá tornou-se homem particularmente influente na aldeia e esta crescia em importância e passava a ser temida. A “cultura grumadii” poderia ser vista em grandes eventos e pequenos detalhes da vida diária. Yuhupdeh O banquete Na pequena aldeia Buriti, do povo Yuhupdeh, tem apenas 6 famílias, somando ao todo 30 pessoas. Certa vez alguns caçadores mataram quatro porcos selvagens no mesmo dia e ao chegarem na aldeia seus familiares foram tomados por uma grande euforia. As mulheres comentavam sobre a habilidade dos maridos e as crianças corriam em volta dos porcos em clima de festejo. Os homens acenderam fogueiras, queimaram os pêlos dos porcos, levaram-nos para a beira do rio e ali os esquartejaram. A parte central do peito, bem gordurosa, deram para o pajé. 239 eBook – Antropologia Missionária – Ronaldo A Lidório
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Os Konkombas formam uma nação tribal basicamente dividida em quatro grupos<br />
maiores. Bimonkpeln, Bichaboln, Bikuln e Kombas os quais se subdividem em 23<br />
etnias e sub-etnias. Estas se dividem novamente em 64 sub-etnias que se subdividem<br />
uma vez mais em 123 micro-dialetos. As marcas faciais e os dialetos são as provas<br />
cabais da identidade cultural de cada um.<br />
‘Grumadii fu ni’ – “Grumadii chegou” – disse Laason naquela noite, enquanto<br />
conduzia Mebá pelas palhoças dos outros clãs. Grumadii era o nome do fetiche que<br />
Mebá servia de ‘guardião’. Em cada clã Konkomba um fetiche é adorado. Os Sanbol<br />
adoram grumadii que é tido como ‘o fetiche guerreiro’, ‘aquele que mata’ ou ‘aquele<br />
que demanda morte’ e temido por todos os outros clãs fazendo com que os Sanbol<br />
sejam especialmente influentes.<br />
Naquela mesma noite algumas árvores foram escolhidas na periferia de Koni como<br />
‘asori’ – lugar sagrado – e preparado o local para as cerimônias. Para inaugurar ‘o<br />
tempo grumadii’ na aldeia sacrifícios seriam necessários. Mebá toma então as<br />
“litakpal-watiir”, pequenas pedrinhas brancas usadas no fetichismo para convidar os<br />
espíritos, invoca grumadii que vem e possui vários naquela noite. Assim o espírito<br />
ordenou o sacrifício de uma criança e iniciou a exposição de ordens e medidas que<br />
afetariam toda a vida do povo na aldeia de Koni e imediações sob a proteção de<br />
Grumadii. Estas ordenanças influenciavam desde as preces, casamentos, criação de<br />
filhos até os funerais e cerimônias comuns ao povo. Era o preço para que Grumadii<br />
habitasse em Koni e, apesar de sua conhecida personalidade maligna, passou a ser<br />
adorado e temido em num misto de atração e terror.<br />
A partir daquele dia Mebá tornou-se homem particularmente influente na aldeia e<br />
esta crescia em importância e passava a ser temida. A “cultura grumadii” poderia ser<br />
vista em grandes eventos e pequenos detalhes da vida diária.<br />
Yuhupdeh<br />
O banquete<br />
Na pequena aldeia Buriti, do povo Yuhupdeh, tem apenas 6 famílias, somando ao<br />
todo 30 pessoas. Certa vez alguns caçadores mataram quatro porcos selvagens no<br />
mesmo dia e ao chegarem na aldeia seus familiares foram tomados por uma grande<br />
euforia. As mulheres comentavam sobre a habilidade dos maridos e as crianças<br />
corriam em volta dos porcos em clima de festejo. Os homens acenderam fogueiras,<br />
queimaram os pêlos dos porcos, levaram-nos para a beira do rio e ali os<br />
esquartejaram. A parte central do peito, bem gordurosa, deram para o pajé.<br />
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