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Tese Lidia Nazaré - UFF

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cansaço fosse exclusivamente físico e sempre que voltei a este texto o fiz com o mesmo<br />

pensamento. Mas se ela está UM POUCO cansada, encontraria descanso não<br />

“conforto”. Neste caso a locução inicial sugere desconforto. Então o motivo do cansaço<br />

não é apenas físico, mas também psicológico.<br />

Agora vejo o motivo pelo qual estancava neste ponto a minha leitura. É que o<br />

ato de “andar” do bonde, induziu-me a pensar que o cansaço inicial de Ana fosse físico.<br />

Só que esta relação é automatizada, impensada. A palavra UM POUCO não é capaz de<br />

representar o cansaço de Ana, que é inominável, pelo menos na forma lingüística<br />

instrumental. Note que a ação humana emprestada ao bonde por falta de outra mais<br />

adequada me confundiu. Todos sabem que o bonde não anda, que isso é um recurso de<br />

linguagem já absorvido pelo senso comum. Mas saber disso não impediu que meu<br />

cérebro não fosse confundido pela aproximação daquele ato da máquina com o ato<br />

humano. A máquina é automática, mas o homem não.<br />

Esta ilusão tendo sido criada por Clarice Lispector faz ver a relação entre a<br />

automatização das ações de Ana com a automatização das ações da máquina. Faz ver<br />

também que deve haver uma intenção nada inocente nesta atribuição de ações humanas<br />

às máquinas. Afinal uma máquina jamais vai humanizar-se, não é verdade?! Contudo,<br />

por um processo de migração de sentidos, o humano pode ser induzido a automatizar-se<br />

ou a acostumar-se com a automatização. Ana assim o comprova e a minha incapacidade<br />

inicial de perceber a manipulação que Clarice Lispector fez com a linguagem também.<br />

Charles Chaplin já nos alertou, desde seus “Tempos modernos”, para este perigo, mas o<br />

alerta de Clarice Lispector é mais contundente, porque faz-nos experimentar a nossa<br />

limitação diante do texto. Assim é impossível não nos convencermos. Parece que o<br />

cansaço de Ana, representado pela locução inicial “UM POUCO” excede em muito ao<br />

físico. Voltemos ao motivo deste cansaço.<br />

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