Tese Lidia Nazaré - UFF

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13.04.2013 Views

mobilidade avoluma os textos, tornando-os infinitos. Neste caso, dentro deste espaço limitado que é o livro, o incessante processo de modernização, com os benefícios que podem trazer ao homem, é mimetizado pela arte da palavra. Por outro lado, a modernidade apresenta um lado ameaçador porque, ainda consoante Marshall Berman (2006), ela ameaça “destruir tudo o que temos, tudo o que sabemos, tudo o que somos” (BERMAN, 2006, p.15). Certamente, a mobilidade da forma lingüística, dos textos em questão, mimetiza este aspecto negativo também. Destruição e construção fazem parte do processo de modernização. Contudo, quando a mobilidade da referida forma acontece a partir da sua fixidez, ela funciona como um entrave para o autodesenvolvimento, criando com isso a alteridade, primeira hipótese que procurei demonstrar nesta pesquisa. Nos textos em questão, aparece também esta outra forma de mobilização. Pois bem, é esta mobilidade, ocorrida em cima do peso do significado da forma, atravancando o autodesenvolvimento, que é o ponto de partida dos narradores/focalizadores. A personagem Ana, do conto “Amor”, de Laços de família e a personagem G.H., de A paixão segundo G.H. encontram-se satisfeitas com suas vidas. Com relação ao primeiro, é possível afirmar que “[n]o fundo, Ana sempre tivera necessidade de sentir a raiz firme das coisas. E isso um lar perplexamente lhe dera.” (LF, p. 18). Se retirarmos a focalização irônica “perplexamente”, entendemos muito bem a intenção do narrador, que vem na perspectiva da axiologia humanista, em dizer que, a firmeza que Ana queria era encontrada no casamento. Com relação ao segundo, é possível afirmar que a “terceira perna” de G.H. é que fazia dela “um tripé estável”. “Perdi alguma coisa que me era essencial, e que já não me é mais” (PSGH, p.15), contudo, continua, “não me é necessária, assim como se eu tivesse perdido uma terceira perna que até então me impossibilitava de andar mas que fazia de mim um tripé estável” (PSGH, p. 15-6). 213

Somente após o encontro com o cego, no caso de Ana, e da barata, no caso de G.H. é que elas se sentem desestabilizadas. Contudo, encontram neste estágio vida mais intensa que no estágio anterior. G.H. não precisava mais da “terceira perna” e Ana “[q]uantos anos levaria até envelhecer de novo?(LF, p.29). Nesses dois casos a mobilidade em cima da fixidez da forma deve ser percebida a partir da linguagem narrada, ou seja, da linguagem que vem escrita na perspectiva da axiologia humanista. A que, na esteira de Barthes (2006) está ligada a uma margem “confortável” de leitura. Esta linguagem deve ser lida, para ser percebida, em sentido horizontal. Contudo Clarice Lispector e Franz Kafka estão seguros de que esta linguagem é limitada para a comunicação. Por isso, em seus textos, ela já aparece montada para fazer falar esta limitação, conforme procurei demonstrar a partir da segunda hipótese desta pesquisa. Veja esta limitação nesta cena discursiva “[n]o fundo, Ana sempre tivera necessidade de sentir a raiz firme das coisas. E isso um lar perplexamente lhe dera”. A focalização “perplexamente” está fora do lugar neste discurso encenado, é contra- ideológica. Neste caso ela abre um ponto cego na linguagem discursiva para fins de comunicação. Este ponto cego faz-nos refletir sobre a complexidade da vida de Ana, que é abordada ao longo do conto. Não pode ser representada numa palavra que estaria naquele lugar. Observe que a encenação deste ponto cego é diferente em A paixão segundo G.H. “[p]erdi alguma coisa que me era essencial, e que já não me é mais. Não me é necessária, assim como se eu tivesse perdido uma terceira perna que até então me impossibilitava de andar mas que fazia de mim um tripé estável” (PSGH, p. 15-6). Note que o essencial era a “terceira perna”. Sendo assim deveria ajudá-la a se mover. Contudo, mesmo sendo essencial, por ser uma perna a mais, tornava-a inapta para 214

mobilidade avoluma os textos, tornando-os infinitos. Neste caso, dentro deste espaço<br />

limitado que é o livro, o incessante processo de modernização, com os benefícios que<br />

podem trazer ao homem, é mimetizado pela arte da palavra.<br />

Por outro lado, a modernidade apresenta um lado ameaçador porque, ainda<br />

consoante Marshall Berman (2006), ela ameaça “destruir tudo o que temos, tudo o que<br />

sabemos, tudo o que somos” (BERMAN, 2006, p.15). Certamente, a mobilidade da<br />

forma lingüística, dos textos em questão, mimetiza este aspecto negativo também.<br />

Destruição e construção fazem parte do processo de modernização.<br />

Contudo, quando a mobilidade da referida forma acontece a partir da sua fixidez,<br />

ela funciona como um entrave para o autodesenvolvimento, criando com isso a<br />

alteridade, primeira hipótese que procurei demonstrar nesta pesquisa. Nos textos em<br />

questão, aparece também esta outra forma de mobilização. Pois bem, é esta mobilidade,<br />

ocorrida em cima do peso do significado da forma, atravancando o<br />

autodesenvolvimento, que é o ponto de partida dos narradores/focalizadores.<br />

A personagem Ana, do conto “Amor”, de Laços de família e a personagem G.H.,<br />

de A paixão segundo G.H. encontram-se satisfeitas com suas vidas. Com relação ao<br />

primeiro, é possível afirmar que “[n]o fundo, Ana sempre tivera necessidade de sentir a<br />

raiz firme das coisas. E isso um lar perplexamente lhe dera.” (LF, p. 18). Se retirarmos a<br />

focalização irônica “perplexamente”, entendemos muito bem a intenção do narrador,<br />

que vem na perspectiva da axiologia humanista, em dizer que, a firmeza que Ana queria<br />

era encontrada no casamento. Com relação ao segundo, é possível afirmar que a<br />

“terceira perna” de G.H. é que fazia dela “um tripé estável”. “Perdi alguma coisa que<br />

me era essencial, e que já não me é mais” (PSGH, p.15), contudo, continua, “não me é<br />

necessária, assim como se eu tivesse perdido uma terceira perna que até então me<br />

impossibilitava de andar mas que fazia de mim um tripé estável” (PSGH, p. 15-6).<br />

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