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Tese Lidia Nazaré - UFF

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ter para si aquela coisa miúda e indomável, aquela coisa salva de ser comida, aquela<br />

fonte permanente de caridade” (LF, p.82). Olhando o retrato dela no jornal surgiram<br />

comentários e o pai, José, virou “definitivamente” a página do jornal. Pouco depois,<br />

diante de um comentário da filha de treze anos “- A senhora já pensou, mamãe, de que<br />

tamanho será o nenezinho dela? – disse ardente a filha mais velha de treze anos.” (LF,<br />

p. 83), “O pai mexeu-se atrás do jornal” (LF, p.83).<br />

Note que o pai já tinha virado a página definitivamente e agora “mexeu-se” atrás<br />

do jornal. Que vem a ser, senão uma manifestação instintiva do corpo, que ele tentou<br />

dissimular “- Chega de conversas! – engrolou o pai.” ? Dissimulação a que a mãe<br />

respondeu ofendida: “Você há de convir – disse a mãe inesperadamente ofendida – que<br />

se trata de uma coisa rara. Você é que é insensível” (LF, p.83).<br />

Observo que o nome “coisa rara” é totalmente sem sentido, vazio, ocupa o lugar<br />

do aborrecimento advindo de uma das linguagens do marido, a primitiva que se<br />

manifesta pela reação do corpo. “Coisa rara” então se refere também à linguagem<br />

poética, criada a partir de uma pulsão, do desejo, é um rumor. Antes sua esposa usou o<br />

termo: “pessimismo”, “bebê preto menor do mundo”, “imagine só ela servindo a mesa<br />

aqui em casa e de barriguinha grande”. Na perspectiva dela, com estes termos, estaria<br />

sendo sensível – significa usar a linguagem racional, estereotipada, “Pequena Flor” -,<br />

porque quando e esposo pediu-lhe que parasse com aquilo, ela disse que ele estava<br />

sendo “insensível” e mudou os termos anteriores para “coisa rara” – significa usar a<br />

linguagem que rumoreja, poética.<br />

Ora, este termo mostra – na perspectiva da linguagem racionalizada -, que ela é<br />

que está insensível, ou seja sofrendo de perda de sentido, quando cunha este nome,<br />

porque, como Ana, diante do cego, esta mulher foi desarmada pela inesperada reação do<br />

corpo do marido. Nesta família observo que o homem e a mulher são capazes de<br />

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