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é a expulsão e mesmo a aversão do sentido” (MILLOT, 1993, p.147). De fato.<br />
“Aristóteles, diz Lacan, esvazia os ditos de seu sentido e é assim que nos dá a dimensão<br />
do real” (LACAN: apud. MILLOT, 1993, p.147). Esta demonstração deveria colocar-<br />
nos em alerta em relação aos discursos que norteiam nossas vidas. Uma palavra adâmica<br />
é uma palavra redentora, porque nos faz entender que tudo pode ser conduzido de outra<br />
forma. Neste caso a única maneira de acessar o sentido do texto de Franz Kafka é<br />
através do esvaziamento de sentidos e da redistribuição destes sentidos ao longo do<br />
texto.<br />
1.2. O escoar dos sentidos<br />
O procedimento literário de Clarice Lispector é muito semelhante ao de Franz<br />
Kafka, também ela busca cindir o significado do significante, a fim de revelar a colagem<br />
construída, que resulta no código, com o qual são tecidos os discursos que nos enredam.<br />
Trata-se de uma descolagem momentânea, que nos alerta para a necessidade de outras<br />
de igual natureza, como a relação entre o valor da mercadoria e ela própria e, por<br />
extensão, entre o valor do homem e ele mesmo.<br />
É assim que os sentidos do narrador clariceano se confundem como os de “Pedro<br />
Vermelho”. Este desarticula e gesticula a partir da “palavra franca” e de um ponto de<br />
apoio. Pois bem, na penúltima cena do conto de Clarice Lispector, o narrador também<br />
não fala, engrola e aponta – focaliza - para os gestos de “Pequena Flor”, que igualmente<br />
não fala.<br />
Para tentar trabalhar com esta impossibilidade de nomear o real com o<br />
simbólico, ele desarticula a palavra e tenta obturar o vazio que se abre neste processo,<br />
com o sentimento amor. Nesta tentativa ele vai rumorejando, exercitando a música do<br />
sentido. Neste instante o espaço se nos abre quase que totalmente à mímesis da<br />
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