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Descartada tal hipótese pergunto: por que ele teria desviado os olhos? Ele teria<br />
compreendido a violência de seu ato através da reação da mulher? Se isto se comprova<br />
no texto, entendemos um pouco melhor o motivo pelo qual o narrador utiliza o nome<br />
designativo “explorador” tantas vezes, e somos levados a crer que existe mesmo a<br />
intenção do narrador em fazer valer tal juízo.<br />
Noutro momento da narrativa, após a notícia ter sido divulgada no jornal<br />
deparamos com “Marcel Pretre” totalmente envolvido pelo riso de “Pequena Flor”. “Era<br />
um riso como somente quem não fala ri. Esse riso, o “explorador” constrangido não<br />
conseguiu classificar” (LF, p.84). Note aqui a piscadela do narrador sobre a colonização<br />
da linguagem gestual e o motivo pelo qual me deixei enganar pelo seu gesto. Bem, se<br />
“Esse riso, o explorador constrangido não conseguiu classificar”, significa que “outro”<br />
riso, o explorador constrangido conseguiu classificar. Diante deste riso, “[o] explorador<br />
estava atrapalhado”. Diante de “outro” riso o explorador constrangido estava<br />
atrapalhado. Mas estar constrangido e atrapalhado não o fez desviar o olhar, pelo<br />
contrário, o explorador “tentou sorrir-lhe de volta, sem saber exatamente a que abismo<br />
seu sorriso respondia (...)” (LF, p. 85). Deste constrangimento e deste sentir-se<br />
atrapalhado resultou uma ação. “Ele [d]isfarçou ajeitando melhor o chapéu de<br />
explorador, corou pudico. (...) Foi provavelmente ao ajeitar o capacete simbólico que o<br />
explorador se chamou à ordem (...)” (LF, p. 86). Toda esta cena posterior à veiculação<br />
da notícia na mídia, lembra o momento em que “Pequena Flor” foi nomeada por<br />
“Marcel Pretre”. O único aspecto que me confunde aqui é o riso, ela não riu no<br />
momento da nomeação, ela “coçou-se onde uma pessoa não se coça”.<br />
Ainda assim podemos equiparar ambas as cenas. Se não sabemos o motivo que<br />
desencadeou esta linguagem gestual de “Pequena Flor”, sabemos o motivo que<br />
desencadeou este mesmo ato de “Marcel Pretre”: o constrangimento e o sentir-se<br />
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