Tese Lidia Nazaré - UFF
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surgirão todas as cenas da narrativa. O mais interessante é que as cenas vêm na mesma ordem da disposição do nome e cada um deles encontra-se como núcleo das cenas. Assim “Marcel Pretre” é: o explorador, o francês, o caçador e homem do mundo e “Pequena flor” é: a explorada, a africana, a caça e mulher virgem ou então mulher do Congo Central ou então mulher do mundo. O narrador deixa esta conotação à disposição do leitor, porque aqui se trata de oferecer-lhe um lugar histórico que lhe dê pertencimento, como ela só existe no campo do imaginário, ele não a situa, deixa-a por conta do imaginário do leitor. “Marcel Pretre” também deixou o nome de “Pequena Flor” à disposição da sociedade burguesa, só que induziu uma interpretação impiedosa. Trata-se de nomes conotativos, flexíveis, mas nas mãos do narrador são manejados de forma magistral. Assim, tudo que se refere ao explorador, ao francês, ao caçador e ao homem do mundo refere-se também à “Pequena Flor”. Sendo ele “o explorador francês Marcel Pretre, caçador e homem do mundo” e ela “a explorada africana, Ø, caça e mulher do Congo Central” onde o nome dela aparece neste referente? Eu quero dizer que falta o nome dela no referente construído a partir do referente inicial. Isso porque ela é como aquele “machado pequeno” que ficava de guarda. Lá o referido ficava de guarda para que os “likoualas” se protegessem dos “bantus”. Mas os “bantus” os atacariam de todo jeito. Vimos então que o referido, por um processo de migração de sentido, ausentou-se da cena. Deixando o seu espaço vazio, assinala este ponto cego da linguagem, ou seja, a sua incapacidade de nomear. Neste caso interpretei aquele “machado pequeno” como um sinal de alerta que marca uma tensão, ou seja, a linguagem deve manifestar-se sempre nesta tensão entre a possibilidade e a impossibilidade de representar. Neste caso aqui, entendo que o nome de “Marcel Pretre” ocupa aquele lugar no referente inicial, porque é pétreo, tem uma identidade, ele é “francês”. O espaço vazio é o de “Pequena Flor”, marcando a tensão a 137
que me referi. Afinal de contas, na perspectiva do narrador/focalizador, ela é inominável. Então o “machado pequeno” inicial permuta seu sentido com “Pequena Flor”. Assim, enquanto palavra, ela é o sinal de alerta. Assim como os nomes comuns que a ela se referem por sugestão – a fim de mantê-la resguardada - encontram-se ao redor do nome de “Marcel Pretre”, assim também, nas cenas da narrativa, ela se encontra na margem e ele no centro. Podemos inferir isso da relação que está no nome inicial: Logo, na perspectiva de Marcel Pretre e de sua linguagem designativa temos o seguinte esquema: “explorador”/“explorada”; “francês”/“africana”; “Marcel Pretre”/ “Pequena Flor”; “caçador”/ “caça”; “homem do mundo”/“mulher”. Ou seja o binômio que cimenta a linguagem ocidental. Na perspectiva do narrador e de sua linguagem poética temos: “explorador”-explorada/Ø, “francês”-“africana”/Ø, “Marcel Pretre”/Ø, “caçador”-“caça”/Ø,“homem de mundo”-“mulher”/Ø. Agora, a partir da sugestão, o narrador consegue mudar este quadro, como se a linguagem estivesse na frente de um espelho invertido. Neste caso, ela seria a exploradora, a africana, a mulher de quarenta e cinco centímetros, madura, negra, calada; a caçadora, a mulher do mundo. Um de-fronte para o outro. Ele “defrontou-se” com ela, já disse, mas se ela tinha quarenta e cinco centímetros como pode se dar isso? Vê-se que o verbo em questão precisa ser arrancado do seu lugar comum. Defrontar há de ser outra coisa. Flexibilizado pelo nome de “Pequena Flor”, o referente inicial “explorador francês Marcel Pretre, caçador e homem do mundo” já está preparado para ser decifrado. Podemos compreender melhor a relação entre a palavra adâmica e a palavra criadora de Clarice Lispector, palavra que reconhece o mundo criado e aceita a 138
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surgirão todas as cenas da narrativa. O mais interessante é que as cenas vêm na mesma<br />
ordem da disposição do nome e cada um deles encontra-se como núcleo das cenas.<br />
Assim “Marcel Pretre” é: o explorador, o francês, o caçador e homem do mundo<br />
e “Pequena flor” é: a explorada, a africana, a caça e mulher virgem ou então mulher do<br />
Congo Central ou então mulher do mundo. O narrador deixa esta conotação à<br />
disposição do leitor, porque aqui se trata de oferecer-lhe um lugar histórico que lhe dê<br />
pertencimento, como ela só existe no campo do imaginário, ele não a situa, deixa-a por<br />
conta do imaginário do leitor. “Marcel Pretre” também deixou o nome de “Pequena<br />
Flor” à disposição da sociedade burguesa, só que induziu uma interpretação impiedosa.<br />
Trata-se de nomes conotativos, flexíveis, mas nas mãos do narrador são manejados de<br />
forma magistral. Assim, tudo que se refere ao explorador, ao francês, ao caçador e ao<br />
homem do mundo refere-se também à “Pequena Flor”.<br />
Sendo ele “o explorador francês Marcel Pretre, caçador e homem do mundo” e<br />
ela “a explorada africana, Ø, caça e mulher do Congo Central” onde o nome dela<br />
aparece neste referente? Eu quero dizer que falta o nome dela no referente construído a<br />
partir do referente inicial. Isso porque ela é como aquele “machado pequeno” que ficava<br />
de guarda. Lá o referido ficava de guarda para que os “likoualas” se protegessem dos<br />
“bantus”. Mas os “bantus” os atacariam de todo jeito. Vimos então que o referido, por<br />
um processo de migração de sentido, ausentou-se da cena. Deixando o seu espaço vazio,<br />
assinala este ponto cego da linguagem, ou seja, a sua incapacidade de nomear. Neste<br />
caso interpretei aquele “machado pequeno” como um sinal de alerta que marca uma<br />
tensão, ou seja, a linguagem deve manifestar-se sempre nesta tensão entre a<br />
possibilidade e a impossibilidade de representar. Neste caso aqui, entendo que o nome<br />
de “Marcel Pretre” ocupa aquele lugar no referente inicial, porque é pétreo, tem uma<br />
identidade, ele é “francês”. O espaço vazio é o de “Pequena Flor”, marcando a tensão a<br />
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