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6. Estratégias do narrador clariceano<br />
Além dos termos destoantes que envolvem o nome do “francês Marcel Pretre”,<br />
“explorador”, “caçador e homem do mundo” dentre outros, no conto em questão alguns<br />
detalhes ficam escondidos. Há um aspecto da descoberta do “francês” que não é<br />
descortinado com a mesma clareza que os outros: [t]emos informação da descoberta, da<br />
coleta de dados, da classificação, da revelação, da repercussão, mas não nos inteiramos<br />
nitidamente sobre a utilidade desta descoberta para a sociedade à qual ela foi revelada.<br />
É claro que há uma utilidade e é claro que ela serve aos seus propósitos sociais.<br />
Clarice Lispector somente vela isso como se brincasse com o leitor de passar-o-anel a<br />
fim de que seja encontrado o seu paradeiro, ou ainda, como se estivesse dando uma<br />
piscadela para o leitor a fim de que ele a procurasse e a encontrasse.<br />
Velar, esconder é um procedimento semelhante ao do Sistema de representação<br />
ao manipular a linguagem e tudo que por ela é construído na realidade. Se não<br />
conseguimos identificar algo é porque este conto esconde um sentido segundo sob a<br />
margem da beleza aparente da linguagem representativa que o leitor deve buscar<br />
compreender. É nas frestas da representação, como já disse, que podemos acionar este<br />
sentido, tornando o texto mais nítido e prazeroso.<br />
Por que “Marcel Pretre” revelou à sociedade organizada sob a égide da<br />
racionalidade do pensamento ilustrado a sua “Pequena Flor”? Por que ela foi focalizada<br />
pelos leitores do suplemento dos jornais do “Domingo’ de forma tão diversa à forma<br />
como o narrador e “Marcel Pretre” a focalizou? Por que uma idealizada “Pequena Flor”<br />
foi focalizada como grotesca, tendo o seu nome substituído por tantos outros?<br />
Duas histórias interpenetram-se, ambas as margens encenam os seus papéis, mas<br />
é possível rastreá-las e refletir sobre elas, porque a autora disponibiliza certos elementos<br />
intertextuais e intratextuais que nos orientam. Cada leitor há de encontrá-los de acordo<br />
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