"CCONFISSÕES DA CONDESSA BEATRIZ DE DIA" (pdf) - guido viaro

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44 a arrancá-los. E depois é que vem a dor maior “como me mostra- rei a ele com dentes faltando”, por enquanto vou usando o velho truque do leque, mas vejo que já desconfia de algo. Além disso, quase tudo que ingiro, ponho para fora através de vômitos ou diarreia. A fraqueza limita minhas caminhadas a uma pequena área ao redor do castelo. Perdi quase todas as cores, e o que so- brevive sob a pesada maquiagem branca é uma pele amarelada e cheia de imperfeições. Minhas vontades também estão mudadas, dias olhando paisagens, sem falar com ninguém, alimentando- me de sopa servida em canecas. Em outros, peço para que to- das as criadas me acompanhem em um passeio até o próximo castelo, que fica cerca de seis léguas daqui, nesses dias não me faltam energias ou alegrias, na volta me interno em meu quarto por vinte e quatro horas, nas duas ou três horas que permaneço acordada, mergulho numa tristeza sem fim seguida de total de- sânimo. Finalmente o sono vem me socorrer, e quando acordo, aquelas sensações são memória levemente enterrada. Chego a suspeitar que aquela mulher deprimida não sou eu. Algum espírito, aproveitando-se do cansaço de meu corpo percebe as resistências baixas e ataca, sugando minha energia vital e deixando como compensação os ossos roídos da depres- são. Em um de meus sonhos recorrentes sou surpreendida por Raimbaut, sem ter um lenço para esconder minha boca. No so- nho ele me diz que mesmo com poucos dentes eu sou a mais bela condessa que ele já viu. Estufada de alegria por suas palavras despeço-me e vou correndo contar as novidades para minhas amigas. Elas riem e me abraçam, congratulando-me por ser de- sejada pelo mais belo dos príncipes. Quando as conversas bai- xam o tom, o grupo de amigas escuta algumas gargalhadas de rapazes, as moças se aproximam na surdina, tentando descobrir se estariam falando delas. Ouve-se com clareza a voz veludosa de Raimbaut “A banguela é tão amarela quanto um boneco de

cera, uma mulher nessas condições e com a idade que tem, nunca conseguirá parir um filho, e se o fizer, esperem por uma aberra- ção tão grande, que fará o anão da corte parecer um homem bem apessoado”. O sonho continuava, eu corria para o mais longe que mi- nhas pernas pudessem alcançar, sequei as lágrimas de uma vida inteira. Pedi para que as damas de companhia me deixassem em paz. Fiquei sentada a beira de um riacho tentando descobrir uma maneira de não me sentir tão diminuída com as palavras que havia escutado. Apanhei uma grande pedra, levantei em direção de minha boca, queria quebrar pelo menos mais uns três dentes. Antes que a pedra acertasse minha boca eu acordei. Repleta de um ódio que nunca havia experimentado, e que parecia feito de material resistente. 45

cera, uma mulher nessas condições e com a idade que tem, nunca<br />

conseguirá parir um filho, e se o fizer, esperem por uma aberra-<br />

ção tão grande, que fará o anão da corte parecer um homem bem<br />

apessoado”.<br />

O sonho continuava, eu corria para o mais longe que mi-<br />

nhas pernas pudessem alcançar, sequei as lágrimas de uma vida<br />

inteira. Pedi para que as damas de companhia me deixassem em<br />

paz. Fiquei sentada a beira de um riacho tentando descobrir uma<br />

maneira de não me sentir tão diminuída com as palavras que<br />

havia escutado. Apanhei uma grande pedra, levantei em direção<br />

de minha boca, queria quebrar pelo menos mais uns três dentes.<br />

Antes que a pedra acertasse minha boca eu acordei. Repleta de<br />

um ódio que nunca havia experimentado, e que parecia feito de<br />

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