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Pedaços de Noz 2007 - Escola Secundária Stuart Carvalhais

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<strong>Pedaços</strong> <strong>de</strong> <strong>Noz</strong> | 70<br />

Abusivo<br />

Apenas se ouviam os meus passos…os meus compassados passos a pisar aquelas<br />

brasas. A brisa, já <strong>de</strong> si fraca, estava quente e levantava a poeira do chão. Esta, seca e<br />

irritante, ro<strong>de</strong>ava-me…secava-me a garganta…acompanhava-me ou empurrava-me…<br />

arrastava-me ou torturava-me por aquele caminho <strong>de</strong>s<strong>de</strong>nhosamente…quente! Enquanto<br />

percorria aquele manto branco que à minha frente se fundia, ouvia os guinchos que<br />

daquelas celas saíam. Guinchos ou berros selvagens. Oh, como eles se mexiam,<br />

ameaçando quem passava com o seu olhar negro! Os movimentos suaves que eles faziam<br />

sob pernas elegantes, sob membros graciosos. Ambiciosos eram eles pela sua beleza<br />

obsessiva. Seres nobres, mas ao mesmo tempo tão agressivos… O meu pensamento<br />

voava em conseguir dominá-los num passo perfeito e com isso…um sorriso soltou-se.<br />

Um último passo e lá estava eu. Lá estava eu naquele recinto enorme, on<strong>de</strong> o céu<br />

era tecto e o chão era fogo; on<strong>de</strong> eu fora alma e ele, mais uma vez, corpo.<br />

A uns escassos metros vi mais um dos meus, sentado e altivo naquele corpo<br />

selvagem. Um olhar avaliativo era crime, mas era mais forte do que eu.<br />

Foi então que ele entrou: passo ante passo, pé ante pé. Sentia-lhe a respiração,<br />

inicialmente calma, inspira…expira…inspira.... Virei-me. Um servo guiava-o na minha<br />

direcção. A cabeça do meu amante erguia-se com aspereza, os seus olhos olhavam-me <strong>de</strong><br />

alto…olhavam-me com <strong>de</strong>safio. A crina preta voava…voava ao sabor da fraca brisa,<br />

brilhava ao sabor do forte sol. Os pés energéticos batiam no chão em protesto pela corda<br />

que ao pescoço levava. Parou…estacou e, ali, livre ficou. Avancei calmamente, mas cá<br />

por <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>sejosa, <strong>de</strong> encontro à minha montada. Num movimento uno subi, num<br />

movimento uno…fugimos.<br />

Aterrei no seu dorso…puxei-lhe as ré<strong>de</strong>as…senti-o erguer as patas dianteiras e<br />

impulsionar-se para a frente.<br />

Primeiro um galope, mais tar<strong>de</strong> uma carga. A velocida<strong>de</strong> aumentava a cada<br />

passada. Conseguia ouvir, apesar do vento, os seus passos pesados e <strong>de</strong>cisivos<br />

ladrilharem a avenida à sua frente. A minha fita voou perante tamanha ousadia. Senti-me<br />

livre: livre por aqueles campos ilimitados, livre como o vento ou como a águia; livre<br />

como o ser selvagem que sou. Quem era ele ou quem era eu, não o sabia dizer. Só me

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