Pedaços de Noz 2007 - Escola Secundária Stuart Carvalhais

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Pedaços de Noz | 68 O Gordo Coronel Vasconcelos Longas eram as horas em que o gordo Coronel Vasconcelos se debruçava sobre a sua vastíssima colecção de caleidoscópios. A sua atenção permitia-lhe esquecer-se dele próprio e da frustração em que se encontrava desde o início da guerra. A guerra, essa aliada perpétua da sua vida, que era já tão velha e tão acabada como ele. Um dia, no seu pequeno quarto, isolado do mundo por meio metro de parede e muito mau feitio, enquanto exercia a tarefa tão minuciosa de moldar o latão de um minúsculo caleidoscópio, o sol entrou pela pequena janela da parede, de tal forma prepotente, que o gordo Coronel Vasconcelos não teve como não se desprender da tarefa que tinha em mãos e levar as mãos aos olhos, para tapar o encadeamento do sol. Lembrou-se da noite em que partiu para a guerra. Lembrou-se dos seus trinta e três amores fugazes de adolescência. Lembrou-se de Mariana, amor eterno dos seus sonhos, já falecida há anos que não se contam pelos dedos. Lembrou-se da noite em que tomou de assalto, juntamente com os seus vinte e sete homens, o quartel-general do magro General Medina e lembrou-se daquela remota tarde em que comeu pela primeira vez um gelado. E sentiu-se velho e decrépito, numa oficina decorada por inúmeros caleidoscópios às cores e inúmeras teias de aranha. Sentiu raspar na pele a dor da solidão e a amargura de tantos anos desaproveitados com propósitos de guerras, agora, idiotas. Sentiu-se respirar o pó do ar que agora o fazia sentir-se pó também. E sentiu-se assim durante os longos anos em que continuaria a fabricar pequeníssimos caleidoscópios sobre as nuvens de pó, sobre a sopa com nata e a carne arrefecida. Joana Neto 11ºC
Pedaços de Noz | 69 Acordei com as ondas. Esmagavam ferozmente o tapete de areia que persistia em invadir o meu terraço e adornar as minhas tulipas de um amarelo gasto e velho. O dia cinzento adivinhava chuva, embora o sol espreitasse aqui e além, com o cheiro do mar a convidar-se, agressivo, a entrar em minha casa, pelas janelas entreabertas de cortinados laranja desmaiado. O cântico do mar fazia dançar a fila interminável de búzios que subia a madeira em espiral para o alto das nuvens envidraçadas cá de baixo. Chovia. A roupa lá fora, molhada, ganhava forma e corpo, belas curvas e proporções carnais que o vento, alegremente, esculpia. Dançavam pela praia, penas de cetim alumiando a manhã. O meu palácio de sal erguia-se, altivo, no meio das ramagens densas e os vizinhos nos ninhos de palha convidavam-me para a ceia no sol nascente. E o cheiro do mar tentava desaconchegar-me do meu pedestal de seda carmim… Joana Neto 11ºC
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PEDAÇOS DE OZ Volume XV | Antologi
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