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— Não permito que me contradigas. Acaso, não estás farto de saber que<br />
aqui, em França, são as mulheres que fazem os ministros?<br />
D. Margarida, desejosa de imprimir novo rumo à conversação, a fim de<br />
que o espôso não incidisse nos comentários apaixonados, aventurou:<br />
— Suponho, Inácio, que deves ir. Ainda que não conseguisses um acôrdo<br />
para o recebimento do que te é devido, essa visita dar-te-á ensejo a qualquer<br />
combinação com a rainha.<br />
— Eu? — bradou êle com energia — que me poderia dar a desventurada<br />
infanta, necessitada de quase tudo em seu ambiente doméstico? Poderei<br />
procurar a filha do meu soberano para chorar as desditas, mas nunca<br />
alimentando o propósito de pedir qualquer coisa.<br />
— Em todo o caso, seria útil alguma tentativa — exclamou Cirilo Davenport<br />
timidamente, receoso de ser tomado como indesejável nas combinações<br />
familiares.<br />
D. Inácio Vilamil, porém, carregou mais expressivamente o semblante e<br />
sentenciou:<br />
— Mas eu sou um homem da velha têmpera.<br />
O rapaz, compreendendo-lhe a resistência inquebrantável, baixou os olhos<br />
e calou-se.<br />
A palestra chegou ao fim, com as expressões conciliatórias de todos, ante<br />
a intransigência do velho fidalgo. Nenhum argumento lhe modificou a atitude.<br />
Nas despedidas, notando a ternura dos olhares e gestos da prima e do<br />
jovem Cirilo, Antero sentiu que mortal ciúme lhe envenenava para sempre o<br />
coração.<br />
Duas semanas passaram, repetindo-se diária-mente a visita de Davenport,<br />
as idéias intransigentes de D. Inácio e a perplexidade do sobrinho dos Vilamil,<br />
que vinha de Versalhes a Paris, de três em três dias.<br />
O par venturoso continuou tecendo, carinhosamente, os fios dourados de<br />
seus sonhos de felicidade, enquanto Antero dissimulava hàbilmente o profundo<br />
rancor que lhe dilacerava o espírito. Apesar da mágoa odiosa, tratava Cirilo<br />
com maneiras cativantes. No íntimo, detestava o rival, que lhe triturava<br />
devagarinho as esperanças; no entanto, buscava conquistar-lhe a confiança,<br />
intencionalmente maquinando projetos sutis e terríveis de vingança, a seu<br />
tempo. O próprio Cirilo estava surprêso. A amizade que Antero de Oviedo lhe<br />
demonstrava era mais um obstáculo transposto. A certeza de que o<br />
companheiro da infância de Madalena lhe compreendera os propósitos<br />
sinceros, constituía fonte de tranqüilidade para o seu coração. Andava, por isso<br />
mesmo, plenamente satisfeito. Respirava os ares de Paris a longos haustos. O<br />
serviço diuturno fizera-se-lhe leve e doce, o novo estado de espírito<br />
descortinava-lhe profundos horizontes no entendimento justo da vida.<br />
Aguardava a noite, ansiosamente, e, quando em companhia da jovem amada,<br />
renovavam, os dois, os votos afetuosos, os juramentos sublimes, as promessas<br />
de eterno amor.<br />
Surgiu a ocasião em que Madalena se preocupou com a atitude da família<br />
Davenport e insistiu para que o rapaz comunicasse aos parentes de Belfast o<br />
projeto de casamento. Cirilo prometeu escrever, mas alegou que, antes mesmo<br />
da consulta aos pais, procuraria ouvir o tio Jaques, em Blois, que lhe<br />
consagrava paternal afeição desde os primeiros dias da sua vida.<br />
Mademoiselle Vilamil demonstrava cuidados justos e, contudo, no espírito de<br />
resolução que lhe era característico, Cirilo considerava semelhante zêlo de<br />
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