Entre o corpo e a poesia:o processo criativo - EMAC - UFG
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etirou, dando lugar a um outro eu, e você não o vivenciou como o<br />
verdadeiro artista que existe em você? (CHEKHOV, 1996, p. 110, 111,<br />
grifos do autor).<br />
A metamorfose é um <strong>processo</strong> em que os caminhos transcendem qualquer<br />
limitação. O ator precisa estar disponível a se encontrar e a encontrar sua vida nas<br />
suas criações. Deixar espaços abertos para que possam ser completados pela<br />
personagem. Acolher a vida em suas variadas formas. Não ter preconceito com<br />
nada, seja o que for. Experimentar, aprofundar, investigar até ser, ser o que ainda<br />
não é. Não ser para sempre, mas ser sempre um ser diferente. Mergulhar na<br />
proposta que o outro oferece é apreender dessa experiência o outro que o ator pode<br />
ser.<br />
O ator esbanja possibilidades de atuação. A metamorfose acopla o sentido<br />
pleno dessa profissão: a interpretação, ou melhor, as distintas interpretações. A<br />
verdade latente na cena não está no exibicionismo do ator, em mostrar suas<br />
apuradas técnicas, mas sim, em deixar transparecer ao público o ser íntimo da<br />
personagem. O ator precisa deixar o público ver além dele mesmo. Deve<br />
desaparecer em prol da personagem. Assim compreendida, a metamorfose: uma<br />
doação viva, sábia e humilde do ator ao outro, assemelha-se ao conceito de Ator<br />
Invisível proposto por Yoshi Oida (2007). O ator desaparecendo e personagem<br />
sendo, ele dispõe da verdade que a cena precisa.<br />
Pelo <strong>corpo</strong> do ator o universo pode ser representado. Com o <strong>corpo</strong> ele<br />
penetra o mundo e o mundo penetra-o. Com sua massa <strong>corpo</strong>ral e espiritual e com a<br />
disponibilidade de ambas, transita por entre seres que rastejam, pelas rochas,<br />
águas, répteis, homens e mulheres. Ele sente a energia vibrante de tudo isso e a<br />
transforma em ações.<br />
O ator pode ser um peixe, um lagarto, uma pedra, não pela imitação<br />
estereotipada, mas pela atenção dada à singularidade que cada ser traz consigo.<br />
Com movimentos da coluna uma serpente surge. Com os olhos atentos do ator uma<br />
coruja transmite suas habilidades. Ele retira das suas incitações a essência de cada<br />
uma e a representa. Assim, a ação adquire verdade e cada coisa interpretada<br />
adquire um novo modo de ser.<br />
Posso pensar o meu <strong>corpo</strong> como uma árvore e a árvore como um <strong>corpo</strong>;<br />
posso simular o andar do meu <strong>corpo</strong> fazendo mexer o dedo indicador e o<br />
médio em cima de uma mesa, fazendo-os dar passos, eu sou o Pequeno<br />
Polegar que se instala numa flor e Polifemo na sua caverna gigante (GIL,<br />
1997, p. 44).