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Entre o corpo e a poesia:o processo criativo - EMAC - UFG

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inocência e gratidão. Usando a desconstrução, o poeta (des)construiu por completo<br />

o entendimento de <strong>poesia</strong>.<br />

Eu já disse quem sou Ele.<br />

Meu desnome é Andaleço.<br />

Andando devagar eu atraso o final do dia.<br />

Caminho por beiras de rios conchosos.<br />

Para as crianças da estrada eu sou o Homem do Saco.<br />

Carrego latas furadas, pregos, papeis usados.<br />

(Ouço harpejos de mim nas latas tortas.)<br />

Não tenho pretensões de conquistar a inglória perfeita.<br />

Os loucos me interpretam.<br />

A minha direção é a pessoa do vento.<br />

Meus rumos não têm termômetro.<br />

De tarde arborizo pássaros.<br />

De noite os sapos me pulam.<br />

Não tenho carne de água.<br />

Eu pertenço de andar atoamente.<br />

Não tive estudamento de tomos.<br />

Só conheço as ciências que analfabetam.<br />

Todas as coisas têm ser?<br />

Sou um sujeito remoto.<br />

Aromas de jacintos me infinitam.<br />

E estes ermos me somam (BARROS, 2001, p. 85).<br />

A metamorfose em Manoel de Barros possibilita a união imaginativa do<br />

<strong>corpo</strong> humano em existências outras e, em existências outras, o <strong>corpo</strong> humano. Pela<br />

brincadeira séria de se ver, de se ser e de ser o outro, o poeta permite a integração<br />

plena: <strong>corpo</strong> e espírito através do ato de metamorfosear.<br />

Ser o outro poeticamente em Manoel de Barros, através da metamorfose,<br />

assemelha-se ao princípio fraternal da saudação maia IN LAKE‘CH que significa: eu<br />

sou um outro você. Princípio este, proporcionado pela cordial aceitação de um ser<br />

por outro. De uma vida refletida e habitada em outra. IN LAKE‘CH ―é a mensagem<br />

de comunhão universal. Por isso, quando um maia encontra o outro, ele diz: ―eu sou<br />

um outro você‖ (BEUTENMÜLLER e LOCONTE, 2006).<br />

Integrando a essência dessa saudação maia, dessa acolhida, à leitura de<br />

uma <strong>poesia</strong> Barrense, fica a mercê do leitor a possibilidade de ser o que ele quiser,<br />

de ser e de se sentir por alguns instantes uma pedra, um caramujo, uma árvore e<br />

outros. Fica a possibilidade de passar por uma mutação poética, por um casulo<br />

transformador ou desconstrutor, por uma mobilidade em envergar no material massa<br />

de outrem e lá habitar.<br />

O poeta custeia aos seus leitores essa transformação única e palpável (pois<br />

é permitido). Custeia a experiência que permite largar o <strong>corpo</strong> que aprisiona e se<br />

aprisionar na liberdade de se sentir algo totalmente diferente do que é. A

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