a odisseia de ulysses pernambucano: dos primórdios ao ... - FPS

formar profissionais técnicos aptos a aplicar exames psicométricos. O teste das lâminas
projetivas de Rorschach (bem conhecidas atualmente, elaboradas originalmente em 1921
pelo psiquiatra suíço Herrmann Rorschach), por exemplo, passou a partir desse momento
a ser utilizado para psicodiagnóstico nos serviços psiquiátricos. Ulysses e seus
colaboradores, também, realizaram uma bastante famosa Revisão Pernambucana da
escala métrica de inteligência de Binet-Simon-Terman, trabalho árduo que durou cerca de
10 anos, publicado por partes, nos volumes da revista “Arquivos de Assistência a
Psicopatas”. O Instituto de Psicologia foi, sem dúvida, um importante marco de iniciativas
no campo da psicologia teórica e, também, prática. De acordo com o prof. Othon Bastos,
em seu texto “A Atualidade de Ulysses Pernambucano”,
“Em decorrência de sua presença na vida científica local, a utilização frequente de técnicas
psicológicas em problemas de psicopatologia clínica tornou-se tão usual, a ponto de converter-se
em uma das características da Escola Psiquiátrica do Recife”
Entretanto, ainda estava por vir, então nos anos 30, a considerada por muitos como
a maior realização, ou melhor, as maiores realizações, de Ulysses Pernambucano. Em
1930, por conta da ascensão de Getúlio Vargas ao poder e o consequente início da “Era
Vargas” no Brasil (governo que se propunha democrático mas que convergiu ao
autoritarismo), é nomeado para Pernambuco o interventor federal Carlos de Lima
Cavalcanti. Este, favorável às ideias e ânsias defendidas por Ulysses, de ampliação e
reforma da assistência aos enfermos mentais, o nomeia para mais uma vez o cargo de
diretor da Tamarineira. E é pelo decreto n° 26, de 10 de Janeiro de 1931, que formalmente
é criada a Divisão de Assistência a Psicopatas (termo corrente na época, de equivalência
a “enfermos mentais”) do Estado de Pernambuco. A partir da Assistência a Psicopatas,
toda a estrutura de atendimento, prevenção e reabilitação psiquiátrica do estado iria, sem
exceções, ser afetada.
O Hospital de Alienados da Tamarineira passa a abrigar somente os quadros
psicóticos considerados agudos; descentraliza-se, assim, o atendimento psiquiátrico no
local e, a partir daí, é rompida a lógica hospitalocêntrica no Estado.
É criado, em um antigo casarão adaptado ao serviço de atendimento médico –
casarão que logo seria batizado de “Hospital Correia Picanço” – um Serviço Aberto, que
contava com um concorrido ambulatório. Cabe aqui a justa observação: esse serviço foi
descrito como sendo o primeiro do tipo em todo o Brasil; e tinha, tanto em sua idealização
como na dinâmica de atendimento, princípios equivalentes aos dos atuais serviços
ambulatoriais que compõem a principal estratégia de atendimento psiquiátrico no Brasil.
Ulysses Pernambucano, nesse ponto específico, pareceu vislumbrar a tendência do futuro
da psiquiatria não só brasileira, mas também mundial, antecedendo os movimentos
antimanicomiais, as discussões realizadas na sociedade civil, a organização de entidades
de direitos aos enfermos mentais, até chegarmos ao estado atual da questão. Dizia o
mesmo dos serviços abertos: “tudo leva a crer seu desenvolvimento cada vez maior em
detrimento dos hospitais fechados”.
É importante destacar o caráter distintivo do atendimento médico-psiquiátrico que
se inaugura nessa época, em Pernambuco. A regra agora passaria a ser não mais a
contenção, o amontoado de leitos, a sujeira e falta de acesso aos itens mais básicos de
higiene, alimentação e vestuário. Agora, se iniciaria uma era de cuidados, de dedicação
total aos enfermos, uma época de prevenção de enfermidades maiores inclusive. Se
passaria, por exemplo, a colher regularmente exames de Liquido Cefalorraquidiano (LCR)
para detecção e tratamento da neurossífilis, em um também recém-inaugurado
Laboratório de Análises. São as palavras do próprio professor Ulysses que ilustram o