a odisseia de ulysses pernambucano: dos primórdios ao ... - FPS

explicação hipotética, que tenta lançar alguma luz sobre esse “mistério inicial” que cerca a
figura já mítica de Ulysses Pernambucano.
Seus pais foram José Antônio Gonçalves de Mello, que era bacharel em direito, e
D. Maria da Conceição de Mello. Sua família era relativamente bem conceituada, assim
como de boa condição financeira, e ele a princípio foi educado em sua própria residência,
por seu pai, terminando os estudos primário e secundário no Educandário Aires Gama,
situado à rua do Hospício.
Ainda adolescente decidiu-se pela carreira na área médica. Entretanto, aqui em
Recife ainda não havia um formal curso superior de Medicina – a Faculdade de Medicina
do Recife só iria se estabelecer em definitivo no ano de 1920. Em relação a isso,
inclusive, há algo interessante a se registrar: nesse ano, quem teve o nome indicado para
professar a cátedra de Psiquiatria da recém-criada Faculdade foi o próprio Ulysses, já
formado médico, tendo este renunciado ao posto. Quem explica melhor a questão é Zília
Codeceira, em seu livro “A Psiquiatria que Conheci”:
“Quando a faculdade de medicina foi fundada, em 1915, coube ao professor Alcides
Codeceira a cadeira de Clínica Psiquiátrica. Ocorreu então um episódio interessante: mesmo
tendo sido fundada em 1915, a Faculdade só iria funcionar mais tarde, em 1920. Foi então que ao
ser organizada a Congregação, foi indicado o Professor Ulysses para a cadeira de Clínica
Psiquiátrica. O professor Ulysses, demonstrando ser um homem desprovido de ambições
pessoais, e reconhecendo o mérito pessoal do Professor Alcides Codeceira que participara das
demarches da fundação da Faculdade, cinco anos antes, não hesitou em renunciar a cátedra que
lhe era oferecida (...)”.
Pois bem. Voltando à questão de seu período formativo: se não há faculdades por
essas bandas, vai-se o Pernambucano até o Rio de Janeiro. Lá, tem contato com figuras
do porte de Juliano Moreira, Fernandes Figueira, Antônio Austregésilo e Ulisses Viana –
mestres esses que iriam influenciar fundamentalmente sua formação médica e
psiquiátrica, dar-lhe bases e experiências sólidas, para que o psiquiatra pernambucano
pudesse alcançar voo posteriormente, já de volta à sua terra natal, moldando e recriando
a psiquiatria que lhe havia sido repassada. Assim, lhe seria repassada uma visão de
modelo psicopatológico predominantemente kraepeliniano, baseado nas ideias do então
atualíssimo pensamento alemão, que tinha como expoente o psiquiatra Emil Kraepelin
(1856-1926).
É importante que se enfatize a considerável influência formativa e de conduta ética
que esses mestres legariam ao jovem Ulysses. Citemos a figura, por exemplo, de um
Juliano Moreira – psiquiatra de origem muito humilde, mulato, que chegou aos mais altos
graus da psiquiatria nacional, tendo tido inclusive grande relevo internacional
representando o Brasil, sendo considerado o fundador e patrono da psiquiatria brasileira.
Moreira repassou a seus aprendizes as bases de um modelo médico-psiquiátrico calcado
em pontos como as bases orgânicas para as manifestações das doenças mentais, as
observações e comparações clínicas rigorosas, o reconhecimento de padrões
sindrômicos e o estabelecimento de diagnóstico preciso (elementos do modelo
kraepeliniano). Foi também um estudioso das ainda pouco compreendidas ideias
psicanalíticas que aportavam da Europa, e tendo igualmente atuado na rejeição das teses
eugenistas que pairavam em alguns setores (inclusive na Psiquiatria) do panorama social
da época.
Ulysses Pernambucano se forma, então, pela Faculdade de Medicina do Rio de
Janeiro, em 1912, aos 20 anos de idade – após ter estagiado, previamente, por dois anos