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Claro, nada impede que um país conceda patentes para descobertas. O problema não é de ordem jurídica, sobretudo naqueles países em que a lei não exclui as descobertas da patenteabilidade. E para aqueles que pensam que as patentes são recompensas às contribuições inventivas, então as patentes poderiam ser mecanismos apropriados de recompensa aos pesquisadores que identificam as funções biológicas e químicas dos genes, com vistas a desenvolver futuras terapias. Mas o verdadeiro problema das patentes para genes é de natureza econômica. Sem dúvida, as patentes para descobertas – e nisso se incluem os materiais naturais isolados da natureza – desvirtuam a função econômica essencial das patentes. Com efeito, uma descoberta representa um fator inevitável no desenvolvimento de suas aplicações e a sua apropriação atribui ao descobridor um poder de controle total sobre os desenvolvimentos tecnológicos a jusante dessa descoberta. Uma patente sobre um gene causador de câncer dá ao seu titular o poder de controle sobre o desenvolvimento de quaisquer kits de diagnóstico bem como de quaisquer produtos para controlar ou tratar essa doença. Essa idéia ofende as noções mais essenciais e básicas do sistema de patentes. O sistema de patentes não foi criado para assegurar monopólios naturais, mas para promover a concorrência em volta do trabalho inventivo. Enquanto instrumento do sistema capitalista, os direitos de propriedade privada servem para reduzir custos de transação e, num mundo de custos de transação positivos, permitem um produto de maior valor agregado quando interesses individuais entram em conflito. Este é o famoso teorema de Coase. Os custos de transação reduzem-se quando os direitos de propriedade privada permitem uma melhor avaliação do bem protegido e estão garantidos por mecanismos judiciais efetivos de defesa de direitos. As patentes cumprem exatamente o mesmo destino, isto é, são títulos de propriedade neutros em si mesmos que permitem melhor avaliar os seus objetos, os inventos, através da descrição e divulgação da invenção e da fixação de prazos de validade da patente. Mas a avaliação de ativos tangíveis ou intangíveis só se dá num clima de livre concorrência. Um invento só é avaliado corretamente pela sociedade quando há alternativas disponíveis ou potenciais ao objeto da patente. Quando uma empresa obtém uma patente sobre um determinado invento e este tem interesse comercial (o que muitas vezes não é o caso), os concorrentes têm uma de quatro opções legítimas: ou obtêm do titular uma licença contratual (o que não é necessariamente competitivo, pois o titular e os licenciados podem, ao abrigo de uma licença, conluiar entre si para dividir o mercado; já se disse até que as licenças de patentes freqüentemente consistem num suborno que o titular da patente dá aos concorrentes para evitar os ataques à validade da patente ou o desenvolvimento de tecnologias alternativas); os concorrentes podem também desenvolver um invento concorrente (o que em idioma inglês, se chama de inventing around); ou podem simplesmente continuar utilizando a tecnologia que faz parte do estado da técnica; ou obtêm uma licença de um outro concorrente do titular que dispõe de tecnologia proprietária alternativa. Tendo em vista estas quatro possibilidades é que o titular da patente põe um preço nos bens ou serviços produzidos a partir de sua invenção. No caso de patentes sobre descobertas, aos concorrentes não cabe, senão, a primeira possibilidade: ou obtêm uma licença do titular, ou estão fora do mercado relativamente àquela descoberta específica. Não existe outra alternativa. 7 2 6º Encontro de Propriedade Intelectual e Comercialização de Tecnologia
É por isso que o sistema de patentes foi concebido para cobrir tão-somente tecnologias que podem ser emuladas, isto é, que podem ser contornadas pelos concorrentes mediante recurso a alternativas. Esta pode parecer uma idéia estranha, sobretudo em vista do conceito um tanto ingênuo e irrefletido, mas infelizmente generalizado, de que as patentes são monopólios. Nada mais falso. As boas patentes, isto é, aquelas que são concedidas para verdadeiras invenções, são pró-competitivas, pois estimulam a concorrência entre inventores e promovem a oferta de tecnologias alternativas aos consumidores. Foi precisamente isto o que disse o Supremo Tribunal dos Estados Unidos num acórdão há mais de 100 anos: “os processos usados para extrair, modificar, e concentrar agentes naturais constituem a invenção. Os elementos geradores de energia existem; a invenção não está em descobri-los, mas em aplicá-los a objetos úteis. [...] A patente não serve para cobrir um efeito ou o resultado de um certo processo, porque isso proibiria todas as outras pessoas de fazer a mesma coisa por quaisquer meios imagináveis. Isto, ao criar monopólios, desencorajaria a técnica e a indústria, contra os objetivos manifestos do direito de patentes”. Recorde-se de que o Supremo Tribunal dos Estados Unidos nunca foi chamado a se expressar sobre se a palavra “descobertas”, que a Constituição emprega, significa efetivamente descobertas no sentido que a palavra tem hoje, ou se foi utilizado no sentido arcaico de “inventos.” Não é de todo impossível (ainda que seja de todo imprevisível) que a visão eminentemente pró-concorrencial da Suprema Corte, a qual foi expressa também em outros acórdãos, como Funk Brothers Seed ou Diamond v. Chakrabarty, desautorize patentes para simples descobertas. É esta visão pró-concorrencial do sistema de patentes que desaconselha que elas sejam concedidas para descobertas. As patentes de genes, de seqüências genéticas, de proteínas, etc., ainda que claramente identificando a patologia com a qual se relacionam diretamente, são socialmente inconvenientes, porque permitem aos titulares proibir todas as outras pessoas de fazer o que quer que seja e por quaisquer meios a partir dessa informação genética que eles não criaram nem modificaram, e que eles apenas encontraram. Um segundo argumento diz que as patentes são úteis porque encorajam a descoberta e identificação dos genes. Isso até pode ser verdade e explica a corrida às repartições de patentes para reivindicar genes, seqüências, partes de seqüências, etc. por universidades, institutos de pesquisa e empresas de biotecnologia. Mas as patentes não foram feitas para isso. Há outros mecanismos próprios para incentivar as descobertas científicas que não as patentes. As patentes, repito, são um mecanismo pró-concorrencial, e desvirtuar esse sistema custa um preço muito alto à sociedade. Como exemplo de como patentes malconcedidas podem impor um custo social muito alto – que pode até ser insuportável para países em desenvolvimento, em busca de seus próprios caminhos na área da biotecnologia – recomenda-se a leitura do artigo “O sistema de patentes e o descontentamento agrário”, pelo historiador norte-americano Earl Hayter, o qual descreve o tortuoso sistema de cobrança de royalties a milhares de pequenos agricultores norte-americanos no final do século XIX pela exploração de patentes sobre equipamentos agrícolas, muitas das quais gritantemente descabidas. Como diz o autor, em muitos casos a mesma invenção era objeto de várias patentes, e os agricultores eram cobrados várias vezes por diferentes agentes. Em alguns casos, pessoas foram processadas por inventos que elas mesmas haviam desenvolvido – o que 6º Encontro de Propriedade Intelectual e Comercialização de Tecnologia 7 3
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Claro, nada impede que um país conceda patentes para descobertas. O<br />
problema não é de ordem jurídica, sobretudo naqueles países em que a lei não<br />
exclui as descobertas da patenteabilidade. E para aqueles que pensam que as<br />
patentes são recompensas às contribuições inventivas, então as patentes poderiam<br />
ser mecanismos apropriados de recompensa aos pesquisadores que identificam<br />
as funções biológicas e químicas dos genes, com vistas a desenvolver<br />
futuras terapias. Mas o verdadeiro problema das patentes para genes é de natureza<br />
econômica. Sem dúvida, as patentes para descobertas – e nisso se incluem<br />
os materiais naturais isolados da natureza – desvirtuam a função econômica<br />
essencial das patentes. Com efeito, uma descoberta representa um fator inevitável<br />
no desenvolvimento de suas aplicações e a sua apropriação atribui ao descobridor<br />
um poder de controle total sobre os desenvolvimentos tecnológicos a jusante<br />
dessa descoberta. Uma patente sobre um gene causador de câncer dá ao seu<br />
titular o poder de controle sobre o desenvolvimento de quaisquer kits de diagnóstico<br />
bem como de quaisquer produtos para controlar ou tratar essa doença.<br />
Essa idéia ofende as noções mais essenciais e básicas do sistema de<br />
patentes.<br />
O sistema de patentes não foi criado para assegurar monopólios naturais,<br />
mas para promover a concorrência em volta do trabalho inventivo. Enquanto instrumento<br />
do sistema capitalista, os direitos de propriedade privada servem para<br />
reduzir custos de transação e, num mundo de custos de transação positivos,<br />
permitem um produto de maior valor agregado quando interesses individuais<br />
entram em conflito. Este é o famoso teorema de Coase. Os custos de transação<br />
reduzem-se quando os direitos de propriedade privada permitem uma melhor<br />
avaliação do bem protegido e estão garantidos por mecanismos judiciais efetivos<br />
de defesa de direitos. As patentes cumprem exatamente o mesmo destino, isto é,<br />
são títulos de propriedade neutros em si mesmos que permitem melhor avaliar os<br />
seus objetos, os inventos, através da descrição e divulgação da invenção e da<br />
fixação de prazos de validade da patente. Mas a avaliação de ativos tangíveis ou<br />
intangíveis só se dá num clima de livre concorrência.<br />
Um invento só é avaliado corretamente pela sociedade quando há alternativas<br />
disponíveis ou potenciais ao objeto da patente. Quando uma empresa obtém<br />
uma patente sobre um determinado invento e este tem interesse comercial (o que<br />
muitas vezes não é o caso), os concorrentes têm uma de quatro opções legítimas:<br />
ou obtêm do titular uma licença contratual (o que não é necessariamente competitivo,<br />
pois o titular e os licenciados podem, ao abrigo de uma licença, conluiar entre<br />
si para dividir o mercado; já se disse até que as licenças de patentes freqüentemente<br />
consistem num suborno que o titular da patente dá aos concorrentes para evitar<br />
os ataques à validade da patente ou o desenvolvimento de tecnologias alternativas);<br />
os concorrentes podem também desenvolver um invento concorrente (o que<br />
em idioma inglês, se chama de inventing around); ou podem simplesmente continuar<br />
utilizando a tecnologia que faz parte do estado da técnica; ou obtêm uma licença<br />
de um outro concorrente do titular que dispõe de tecnologia proprietária alternativa.<br />
Tendo em vista estas quatro possibilidades é que o titular da patente põe um preço<br />
nos bens ou serviços produzidos a partir de sua invenção.<br />
No caso de patentes sobre descobertas, aos concorrentes não cabe, senão,<br />
a primeira possibilidade: ou obtêm uma licença do titular, ou estão fora do mercado<br />
relativamente àquela descoberta específica. Não existe outra alternativa.<br />
7 2 6º Encontro de Propriedade Intelectual e Comercialização de Tecnologia