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lógica brasileira: as negociações na área de saúde pública e na área de biodiversidade e dos conhecimentos tradicionais associados. Por último, abordarei os trabalhos que hoje ocorrem no Grupo de Comércio e Transferência de Tecnologia, também da OMC, com vistas a gerar resultados que serão apreciados na V Reunião Ministerial da OMC, que ocorrerá em setembro de 2003, em Cancún, México. O Acordo TRIPS, como mencionado, foi um dos pontos mais complicados da Rodada do Uruguai. O Acordo contemplou vários dispositivos sobre tecnologia, desde o preâmbulo até a parte operativa. O TRIPS reconhece aspectos que são fundamentais para a compreensão da propriedade intelectual como instrumento de transferência de tecnologia e de promoção da inovação. Por exemplo, o preâmbulo que os sistemas nacionais para a proteção de propriedade intelectual devem ter objetivos essenciais de políticas públicas, inclusive os objetivos de desenvolvimento tecnológico. Da mesma forma, reconhece as necessidades especiais dos países de menor desenvolvimento relativo, inclusive a necessidade de habilitá-los a criar uma base tecnológica sólida e viável. O artigo 7.º do TRIPS, referente aos objetivos, cita que a proteção e aplicação de normas do direito de propriedade intelectual devem contribuir para a promoção da inovação tecnológica e para a transferência e difusão de tecnologia. O artigo 8.º refere-se aos princípios e estabelece que os membros, ao formularem ou emendarem suas leis e regulamentos, podem adotar medidas necessárias para proteger a saúde e para promover o interesse público em setores de importância vital para o seu desenvolvimento socioeconômico e tecnológico. Aduz, ainda, que poderão ser necessárias medidas para evitar o recurso a práticas que limitem de maneira injustificável o comércio ou que afetem adversamente a transferência internacional de tecnologia. Em sua parte operativa, por exemplo, na Seção 5 e 8, relativas ao Controle de Práticas Anticompetitivas em licenças contratuais e à Concorrência Desleal, o artigo 40 estipula que os membros concordam que algumas práticas ou condições de licenciamento relativas a direitos de propriedade intelectual que restringem a concorrência podem afetar adversamente o comércio e impedir a transferência e disseminação de tecnologia. E, mais adiante, no artigo 66, principalmente no § 2.º, que trata da questão dos países de menor desenvolvimento relativo, diz que “os países desenvolvidos concederão incentivos a empresas e instituições em seus territórios, com o objetivo de promover e estimular a transferência de tecnologia aos países de menor desenvolvimento relativo de forma a habilitálos a estabelecer uma base tecnológica sólida e viável”. Não obstante esse conjunto de dispositivos que permeiam todo o corpo do Acordo TRIPS, a experiência tem demonstrado que sua implementação não favoreceu e não está favorecendo a transferência de tecnologia e a inovação – pelo menos na intensidade desejada. Sendo verdade que a propriedade intelectual se fortaleceu com a adoção daquele Acordo da OMC, mediante padrões de proteção mais altos do que os que vigoravam até então, o mesmo não se pode dizer da aplicação de seus princípios e objetivos que, como já mencionei, contemplam a questão da tecnologia. Hoje, após vários anos de experiência, o que se observa é justamente o contrário. O TRIPS, em alguns aspectos, passou a representar dificuldades adicionais nesse processo, uma vez que proíbe diversas práticas que, no passado, contribuíram para o desenvolvimento dos atuais países industrializados. Por exemplo, o TRIPS restringiu a liberdade dos países em desenvolvimento de ganhar acesso à tecnologia mediante engenharia reversa. A imitação é um recurso de que já não se pode fazer uso, sob pena de o país estar infringindo 168 6º Encontro de Propriedade Intelectual e Comercialização de Tecnologia
as regras de propriedade intelectual. Portanto, a experiência em relação a essa questão tem mostrado certas limitações. Na última reunião do Grupo Negociador de Propriedade Intelectual da ALCA, em junho passado, a questão da transferência de tecnologia, que é parte da proposta do Mercosul, foi discutida. A própria delegada dos Estados Unidos reconheceu que nesse aspecto o TRIPS não vem funcionando. Mesmo com todas essas dificuldades – quiçá, exatamente por causa delas – estão hoje em curso negociações que poderão ter implicações importantes para as políticas tecnológicas, se os resultados forem positivos para o Brasil. A primeira negociação – muitos de vocês, certamente, já a acompanham – diz respeito à relação entre a Convenção de Diversidade Biológica (CDB) e o Acordo TRIPS. Essa negociação está dentro do mandato de Doha, que dentre outros aspectos, incorpora a revisão do artigo 27.3(b) do TRIPS, que trata das exceções à patenteabilidade, e determina a necessidade de examinar a relação entre a CDB e o TRIPS. Ambos os mandatos estão sendo cumpridos no âmbito do Conselho de TRIPS. Como mencionei no Encontro da REPICT no ano passado, o Brasil apresentou, juntamente com os países em desenvolvimento, uma proposta de revisão do artigo 27.3(b) para a incorporação de algumas novas condições para patenteabilidade de invenções que envolvam conhecimentos tradicionais e recursos genéticos. Os três requisitos seriam: a) o conhecimento prévio informado dos detentores do conhecimento ou dos recursos; b) a repartição justa e eqüitativa de benefícios; e c) a identificação da origem do material genético e do conhecimento tradicional associado. Essa questão, como todos sabem, tem sido objeto de muita resistência por parte dos países desenvolvidos, principalmente dos Estados Unidos, Japão, Austrália e Canadá. Em relação à União Européia, o Brasil tem tido, pelo menos, a possibilidade de dialogar, pois ela reconhece que essa discussão está dentro da OMC e tem um mandato negociador. A própria União Européia apresentou, em uma das sessões do Conselho de TRIPS (setembro de 2002), uma proposta em que avalia a questão da identificação do material e do conhecimento tradicional como requisito importante, embora não obrigatório, a ser aplicado pelas legislações nacionais. O desdobramento mais importante em relação a esse assunto diz respeito a uma proposta de iniciativa indiana, co-patrocinada pelo Brasil e outros países em desenvolvimento, a qual, dependendo dos rumos da negociação em Genebra, poderá ser levada à Conferência Ministerial de Cancún. A proposta ainda não chega a formular uma linguagem jurídica de emenda ao TRIPS, mas reforça os argumentos em favor de uma emenda a Acordo, com vistas a evitar a biopirataria e a apropriação indevida dos recursos. Na verdade, a biopirataria é um conceito um pouco nebuloso, ainda em gestação. Não se sabe se seria mais apropriado dizer “biogrilagem” ou “biopirataria”, mas, certamente, a apropriação indevida dos recursos da biodiversidade e dos conhecimentos tradicionais é um problema que precisa ser combatido rapidamente, sob pena de serem concedidas patentes sobre recursos existentes na natureza associados a um conhecimento tradicional, como foi o caso da “ayahuasca”, ou, então, patentes concedidas sem o reconhecimento da origem dos conhecimentos e dos recursos envolvidos. Inúmeros outros casos podem ser citados: o da “erva de São Caetano”; de uma planta da Etiópia chamada “Endod”, da “Kava-Kava”, de origem indiana, dentre vários outros exemplos que, a cada dia, vêm à tona. 6º Encontro de Propriedade Intelectual e Comercialização de Tecnologia 169
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ALCA, em junho passado, a questão da transferência de tecnologia, que é parte<br />
da proposta do Mercosul, foi discutida. A própria delegada dos Estados Unidos<br />
reconheceu que nesse aspecto o TRIPS não vem funcionando.<br />
Mesmo com todas essas dificuldades – quiçá, exatamente por causa delas<br />
– estão hoje em curso negociações que poderão ter implicações importantes<br />
para as políticas tecnológicas, se os resultados forem positivos para o Brasil.<br />
A primeira negociação – muitos de vocês, certamente, já a acompanham –<br />
diz respeito à relação entre a Convenção de Diversidade Biológica (CDB) e o<br />
Acordo TRIPS. Essa negociação está dentro do mandato de Doha, que dentre<br />
outros aspectos, incorpora a revisão do artigo 27.3(b) do TRIPS, que trata das<br />
exceções à patenteabilidade, e determina a necessidade de examinar a relação<br />
entre a CDB e o TRIPS. Ambos os mandatos estão sendo cumpridos no âmbito do<br />
Conselho de TRIPS. Como mencionei no Encontro da REPICT no ano passado, o<br />
Brasil apresentou, juntamente com os países em desenvolvimento, uma proposta<br />
de revisão do artigo 27.3(b) para a incorporação de algumas novas condições<br />
para patenteabilidade de invenções que envolvam conhecimentos tradicionais e<br />
recursos genéticos. Os três requisitos seriam: a) o conhecimento prévio informado<br />
dos detentores do conhecimento ou dos recursos; b) a repartição justa e eqüitativa<br />
de benefícios; e c) a identificação da origem do material genético e do conhecimento<br />
tradicional associado. Essa questão, como todos sabem, tem sido objeto<br />
de muita resistência por parte dos países desenvolvidos, principalmente dos Estados<br />
Unidos, Japão, Austrália e Canadá. Em relação à União Européia, o Brasil<br />
tem tido, pelo menos, a possibilidade de dialogar, pois ela reconhece que essa<br />
discussão está dentro da OMC e tem um mandato negociador. A própria União<br />
Européia apresentou, em uma das sessões do Conselho de TRIPS (setembro de<br />
2002), uma proposta em que avalia a questão da identificação do material e do<br />
conhecimento tradicional como requisito importante, embora não obrigatório, a<br />
ser aplicado pelas legislações nacionais.<br />
O desdobramento mais importante em relação a esse assunto diz respeito<br />
a uma proposta de iniciativa indiana, co-patrocinada pelo Brasil e outros países<br />
em desenvolvimento, a qual, dependendo dos rumos da negociação em Genebra,<br />
poderá ser levada à Conferência Ministerial de Cancún. A proposta ainda<br />
não chega a formular uma linguagem jurídica de emenda ao TRIPS, mas reforça<br />
os argumentos em favor de uma emenda a Acordo, com vistas a evitar a biopirataria<br />
e a apropriação indevida dos recursos. Na verdade, a biopirataria é um conceito<br />
um pouco nebuloso, ainda em gestação. Não se sabe se seria mais apropriado<br />
dizer “biogrilagem” ou “biopirataria”, mas, certamente, a apropriação indevida<br />
dos recursos da biodiversidade e dos conhecimentos tradicionais é um problema<br />
que precisa ser combatido rapidamente, sob pena de serem concedidas patentes<br />
sobre recursos existentes na natureza associados a um conhecimento tradicional,<br />
como foi o caso da “ayahuasca”, ou, então, patentes concedidas sem o reconhecimento<br />
da origem dos conhecimentos e dos recursos envolvidos. Inúmeros<br />
outros casos podem ser citados: o da “erva de São Caetano”; de uma planta da<br />
Etiópia chamada “Endod”, da “Kava-Kava”, de origem indiana, dentre vários outros<br />
exemplos que, a cada dia, vêm à tona.<br />
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