Profª Drª Regina Maria Przybycien - ICHS/UFOP
Profª Drª Regina Maria Przybycien - ICHS/UFOP
Profª Drª Regina Maria Przybycien - ICHS/UFOP
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
não acreditava em viagens puramente textuais, viajou até Diamantina para percorrer os<br />
caminhos trilhados por Helena Morley sessenta anos antes. A tradução conta com uma<br />
introdução de mais de quarenta páginas, na qual além das descrições intensamente<br />
poéticas de Diamantina, Bishop realiza um trabalho que podemos chamar de<br />
etnográfico, registrando hábitos e costumes, à maneira da literatura dos viajantes.<br />
A descoberta de Ouro Preto veio depois, no final dos anos cinquenta, quando ela<br />
morava em Petrópolis. Nos primeiros anos da década de sessenta voltou várias vezes,<br />
ficando hospedada na casa de Lilli Correia de Araújo e no Pouso do Chico Rey, até que<br />
em 1965 comprou uma casa em ruínas na Rua Conselheiro Quintiliano, encarregando<br />
Lilli de restaurá-la. Viveu pouco tempo na casa, de 1969 a 1971.<br />
Uma poeta americana em Ouro Preto nos anos sessenta! Que estranhamentos e<br />
desencontros aconteceram entre ela e os ouropretanos podemos verificar na sua<br />
correspondência: uma história de incompreensões e sofrimento, muita loucura, muito<br />
delírio, mas também esse inevitável fascínio pelo diferente, pelo outro.<br />
Para alguém à deriva, sem família, sem raízes, como Elizabeth Bishop, Minas<br />
significava solidez, capacidade de perdurar. Quando comprou a casa em Ouro Preto, em<br />
1965, Bishop escreveu para seu amigo, o também poeta Robert Lowell : “Gosto de Ouro<br />
Preto porque lá tudo foi feito ali mesmo, à mão, com pedra, ferro, cobre e madeira.<br />
Tiveram que inventar muita coisa − e tudo está em perfeito estado há quase trezentos<br />
anos.” 3<br />
Anos mais tarde, já morando em Ouro Preto, a poeta se expressou quase nos<br />
mesmos termos numa entrevista: “De Ouro Preto, gosto sobretudo das coisas que são feitas<br />
aqui. Os móveis, os utensílios do século XVIII são sólidos. O clássico não me atrai, o que<br />
importa é a durabilidade − aqui as coisas permanecem”. 4 Solidez e permanência: aquilo<br />
que o estrangeiro não tem e que busca encontrar em suas novas circunstâncias. Não<br />
obstantes seus desencontros com os mineiros, Elizabeth Bishop encontrou em Minas o que<br />
necessitava. Não na casa ouropretana, onde morou pouco tempo, mas na poesia de Carlos<br />
Drummond de Andrade. Inspirada nos poemas de Drummond sobre Itabira, alguns dos<br />
quais ela traduziu para o inglês, ela aprendeu a abrir os caminhos da memória e reconstruir<br />
a infância perdida num vilarejo remoto do Canadá em versos que representam uma nova<br />
fase de sua poesia, mais intensa, mais pessoal. Nesses versos da infância, a estrangeira<br />
Elizabeth Bishop finalmente voltava para casa.<br />
3 Carta a Robert Lowell, 18.11.1965. In: Uma arte – as cartas de Elizabeth Bishop<br />
4 COLÔNIA, <strong>Regina</strong>. A poesia como "way of life". Jornal do Brasil. Rio de Janeiro, 6 jun. 1970, p.8.<br />
4