13.04.2013 Views

Profª Drª Regina Maria Przybycien - ICHS/UFOP

Profª Drª Regina Maria Przybycien - ICHS/UFOP

Profª Drª Regina Maria Przybycien - ICHS/UFOP

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Coloco ainda, apenas como hipótese, mais uma possível forma de<br />

estrangeirização que tem a ver com as relações de gênero. A história humana é<br />

androcêntrica. Em Um teto todo seu 13 Virginia Woolf relata que, convidada a fazer uma<br />

palestra sobre “As mulheres e a literatura”, ela percorre os edifícios de Oxbridge<br />

(junção irônica da autora das duas vetustas universidades britânicas Oxford e<br />

Cambridge) e descobre que aqueles templos do saber eram território proibido para as<br />

mulheres. Em seguida, vai ao Museu Britânico pesquisar a presença das mulheres na<br />

literatura. Consultando os catálogos, verifica que as mulheres estão onipresentes não<br />

apenas na literatura, mas também nas outras artes e nas ciências, mas como tema, não<br />

como autoras. Woolf conclui que todas as obras do espírito humano (as ciências, as<br />

artes, as leis) foram feitas pelos homens. E isso porque os homens gozavam da<br />

liberdade de ir e vir, dominavam a rua, o púlpito, a tribuna e manejavam o cinzel, o<br />

pincel e a pena.<br />

As mulheres, entretanto, ocupavam o espaço estreito da casa e sua função era<br />

gerar e nutrir. Paradoxalmente neste caso, é a casa o lugar de exílio, o espaço<br />

estrangeiro, porque circunscritas a esse espaço, as mulheres ficavam fora da vida<br />

pública, fora das ruas. A linguagem revela a delimitação desses espaços: o homem<br />

público é o político, ao passo que a mulher pública é a prostituta. (Se bem que hoje os<br />

dois sentidos se aproximam. A segunda vende o corpo; o primeiro vende a alma.)<br />

No século XIX, embora as mulheres da classe burguesa tivessem mais acesso à<br />

educação, era-lhes difícil se tornar escritoras, publicar suas obras. Esquecemo-nos que o<br />

verbo ‘publicar’ significa ‘tornar público’. As mulheres podiam escrever, se quisessem,<br />

mas seus escritos deveriam permanecer no espaço privado, isto é, não deveriam ser<br />

publicados. Ilustrativa da atitude da sociedade para com a mulher escritora é este trecho<br />

da carta que o poeta Olavo Bilac escreve para sua noiva:<br />

Minha Amélia<br />

(...)<br />

Antes de tudo, quero dizer-te que te amo, agora mais do que nunca, que não me sais um minuto<br />

do pensamento, que és a minha preocupação eterna, que vivo louco de saudade, (...) Não me<br />

agradou ver um soneto teu (...) desagradou-me a sua publicação.<br />

(...)<br />

Há uma frase de Ramalho Ortigão, que é uma das maiores verdades que tenho lido: - “O<br />

primeiro dever de uma mulher honesta é não ser conhecida”. – Não é uma grande<br />

verdade? (...) há em Portugal e Brasil cem ou mais mulheres que escrevem. Não há<br />

nenhuma delas de quem não se fale mal, com ou sem razão. (...) Não quer isto dizer que<br />

13 WOOLF, Virginia. Um teto todo seu. 2ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.<br />

10

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!