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cérebro que não visitava há muito. Apertou as pálpebras, forçando o<br />
pensamento. Seu ser foi subtraído <strong>da</strong>li e transportado para uma déca<strong>da</strong> atrás.<br />
Aquela mesma voz, ouvia-a berrando no meio <strong>da</strong> rua, no centro intocado <strong>da</strong><br />
ci<strong>da</strong>de. Um dia quente, como aquele. Nuvens esparsas vagando, quase<br />
estáticas, no céu azul. O homem <strong>da</strong> cena, com seu vozeirão, gritou, chamando<br />
a atenção de Gregório. — Ei, rabo de gato! Depois, arremessou uma moe<strong>da</strong><br />
para o alto, rodopiante, fazendo o reflexo do sol chicotear o rosto apequenado<br />
do guri. Estendeu a mão para cima, agarrando a moedinha. — Vai tomar um<br />
sorvete. Está um calorão <strong>da</strong>nado. Vai! — insistiu o homem.<br />
— Gê?! — murmurou Gregório, <strong>da</strong>ndo três passos na direção do<br />
homem.<br />
O velho apertou os lábios e repuxou a boca, esboçando um sorriso<br />
engraçado. Pousou a mão direita no ombro do rapaz e deu um apertão.<br />
—E bom te ver novamente, guri.<br />
—Digo o mesmo.<br />
Os dois se abraçaram fortemente por alguns segundos.<br />
Gregório sentia-se envolto em lembranças. Estar de novo na ci<strong>da</strong>de natal<br />
fazia muito bem. Quantas pessoas queri<strong>da</strong>s ain<strong>da</strong> encontraria? Quantos rostos?<br />
Os dois conversaram por um momento e combinaram almoçar juntos no<br />
final de semana que chegava. Abraçaram-se mais uma vez e continuaram o<br />
trabalho de descarregar a madeira, enquanto os homens discutiam assuntos<br />
locais. Queriam esmiuçar o que sucedera ao cego. Difícil era não notar que<br />
repentinamente aquela pacata ci<strong>da</strong>de via-se envolvi<strong>da</strong> em mistérios por demais<br />
bizarros.<br />
A maioria apostava que outro bicho poderia tê-lo atacado. Nunca os<br />
cães. Não fazia sentido. Mas onde estariam os outros bichos? Teriam fugido?<br />
Teriam morrido também? Seus corpos não estavam lá. Se Anderson não havia<br />
sido vitimado pelos cães, quem ou o quê teria feito aquela mal<strong>da</strong>de? O assunto<br />
predominou durante to<strong>da</strong> a laboriosa tarefa de descarregar o caminhão.<br />
Providenciaram algumas escoras para que o monte ficasse seguro. Em duas<br />
horas, terminaram a tarefa. Genaro e seus homens se despediram, recusando<br />
convite para o almoço, pois ain<strong>da</strong> tinham dois carregamentos. A demora na<br />
chega<strong>da</strong> <strong>da</strong> madeira acumulara o serviço, e o dia seria cheio para os<br />
trabalhadores.<br />
O caminhão partiu. Samuel e Gregório acenaram para o velho. Alguns<br />
minutos depois, o veículo sumia pra lá <strong>da</strong> curvinha.<br />
—Estranha essa história do cego. — comentou Gregório, acom-