Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Samuel era invadido por um ir-e-vir <strong>da</strong>quele odor de enxofre,<br />
provocando náuseas terríveis. Seria um cão dálmata que o atacara no<br />
pesadelo? Uma premonição? Não, a "fera" era muito maior... uma aberração,<br />
um monstro. Pobre do Anderson.<br />
O vento matinal batia no pátio <strong>da</strong> fazen<strong>da</strong>, levantando poeira vermelha,<br />
mergulhando as botas dos homens numa nuvem de pó.<br />
Gregório sentia-se disposto, sem dor alguma. Caminhou de um lado<br />
para outro no alpendre. Pôs uma <strong>da</strong>s mãos sobre os olhos, em forma de<br />
concha, protegendo-os <strong>da</strong> clari<strong>da</strong>de, estu<strong>da</strong>ndo a torre <strong>da</strong> caixa d’água. Era<br />
alta e larga. Lembrou-se, de repente, <strong>da</strong> estranha e passageira confusão visual.<br />
Uma pegadinha <strong>da</strong> mãe natureza. Desceu ao pátio de terra bati<strong>da</strong> calçando<br />
botas empresta<strong>da</strong>s. Sapatos e vestes não seriam problema. O dia, tudo<br />
indicava, seria bem quente. Gregório atravessou o pátio chutando a poeira,<br />
tingindo a bota de vermelho. Juntou-se ao grupo de trabalhadores,<br />
carregando e aninhando a madeira no monte.<br />
Samuel e o velho Genaro conversavam encostados na boléia. Genaro deu<br />
uma olhadela por sobre os ombros de Samuel, observando o último homem<br />
que se ajuntara aos demais, e ficou boquiaberto por uns segundos.<br />
—Aquele ali é... é teu irmão, não é? — balbuciou o velho, como se<br />
vislumbrasse um fantasma.<br />
—Claro que é, Gê. Pra ser cuspido e escarrado igual a mim, só poderia<br />
ser...<br />
—Gregório. É esse o nome, não é?<br />
—Você não sabia que ele estava aqui?<br />
—Sabia. Ouvi comentários lá no centro, mas eu ain<strong>da</strong> não o tinha visto...<br />
está forte, bonito, graças a Deus. E tem mais uma coisa...<br />
—O que é?<br />
—Na<strong>da</strong>... besteira de velho.<br />
Genaro continuou avançando. Gregório não se deu conta de que era<br />
observado. Puxou outra peça do caminhão, sustentou-a no ombro e rumou ao<br />
monte. O velho perseguia-o. Gregório apoiou uma <strong>da</strong>s extremi<strong>da</strong>des <strong>da</strong> tábua<br />
no chão e preparava para deitá-la. Arqueou o corpo a fim de facilitar o<br />
deslize, quando ouviu alguém chamá-lo de uma maneira especial, como não<br />
ouvia há anos:<br />
— Ei, rabo de gato!<br />
Em segundos, Gregório sentiu-se submerso num compartimento de seu