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sobrenatural, e estacaram no topo do prédio. Ambos mantinham as cabeças<br />
ergui<strong>da</strong>s, farejando. Surpreendentemente, Thal surgiu em um vôo rasante,<br />
trazendo a espa<strong>da</strong> chamejante à mão. Khel abaixou-se velozmente. O outro cão<br />
não teve a mesma sorte. O anjo traspassou-lhe a espa<strong>da</strong> pelo pescoço,<br />
decapitando a besta. Khel urrou, exalando puro ódio no ar, enquanto o parceiro<br />
tornava-se uma esfera de fumaça, espalhando odor de enxofre por todo o céu.<br />
Thal retornou em seu rasante. O demônio acuou novamente. Khel retomou o<br />
galope, saltando para o prédio vizinho e partindo na direção sul. O anjo<br />
pousou, apenas observando a deban<strong>da</strong><strong>da</strong> <strong>da</strong> fera. Sorriu.<br />
Khel, bem adiante, espumava em ver<strong>da</strong>deiro ódio. Reuniria mais<br />
demônios. Agora que Thal tinha cruzado outra vez seu caminho, não riria<br />
nunca mais às suas custas.<br />
Lá embaixo, na rua, Renan entrava no carro dos traficantes. O homem<br />
de colete, cambaleante, parecendo embriagado, foi o último a entrar. Pablo, <strong>da</strong><br />
janela, pediu que Gregório se aproximasse.<br />
— Estevão, conhece? — apontou para o motorista, que retribuiu com um<br />
aceno. — Ele volta <strong>da</strong>qui a meia hora. Esteja aqui embaixo. Ele lhe entregará seus<br />
sete quilos. Daqui a meia hora, será uma hora e sete minutos <strong>da</strong> manhã. A<br />
partir <strong>da</strong>í, começo a contar as suas quarenta e oito horas para me pagar.<br />
Dinheiro vivo, no preço do dia. Renan, diga tchau pro papai. — Pablo e seus<br />
homens riram e partiram. — Te vejo na sexta. Não sacaneia.<br />
Gregório olhou para o céu, que permanecia cinza e carregado, <strong>da</strong>ndo a<br />
impressão de que a chuva tornaria a cair. Acendeu um cigarro e sentou-se na<br />
esca<strong>da</strong>ria de frente para o prédio. Apesar do imprevisto, sentia-se calmo,<br />
convicto de que tudo <strong>da</strong>ria certo. Amanhã, àquela hora, estaria com todo o<br />
dinheiro de que precisava nas mãos. Libertaria Renan e, se o garoto quisesse,<br />
poderia segui-lo até Belo Verde.<br />
Infelizmente, Gregório não tinha o dom de prever. Se o possuísse,<br />
certamente cancelaria aquela transação, pois jamais voltaria a ver Renan.<br />
Jamais voltaria a ser o mesmo.<br />
Thal, lentamente, pousou às costas de Gregório. Ficou ali, a observá-lo,<br />
como um passatempo de criança. Havia interferido no destino <strong>da</strong>quele homem.<br />
Ain<strong>da</strong> não sabia, mas sua interferência naquela noite custaria a vi<strong>da</strong> de muitos<br />
de seus irmãos, de muitos humanos. A vi<strong>da</strong> de muitas vi<strong>da</strong>s. Começava a se<br />
sentir responsável por aquela criatura ambígua. Estava assumindo um<br />
compromisso com aquele homem perdido.