O Senhor da Chuva - Jovem Sul News

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12.04.2013 Views

Estavam apavorados, mas deviam esse esforço ao amigo desaparecido, ele que já os ajudara e confortara tantas vezes. Todos os monstros que agora povoavam o imaginário do grupo de busca foram trazidos e alimentados pelo veterinário Ivan, um dos últimos a chegar. Ele trouxera disposição para ajudar na busca e também algo muito mais interessante: os resultados dos exames das amostras colhidas dos cães. Degeneração acelerada, incompatibilidade de datas para a suposta morte dos cães, afirmada e testemunhada pelos funcionários da fazenda, principalmente por Gregório. Alguns elementos presentes nas amostras não faziam sentido algum. De acordo com os tecidos, os cães estavam mortos há mais de um mês. Outro mistério era a estranha pigmentação vermelha encontrada no couro dos animais, tornando-os demônios escarlates. O pigmento não era resultado de doença catalogada. Ivan, o veterinário, demorara um bocado para acreditar que aqueles monstros um dia tinham sido dálmatas. — São demônios. — afirmara Gregório, traindo-se. — Eu sei, são demônios. Todos perderam quase um minuto focando em silêncio aquele rosto entristecido e cansado. Agora estavam embrenhados na mata, cada um amontoando o medo interno de suas feras imaginárias. A maioria dos grupos já andava há mais de uma hora por aquelas matas sem ter qualquer pista. Cada grupo torcia para que, ao retornar, um deles reservasse boas notícias. Com sorte, algum grupo traria Samuel de volta desidratado, ferido, louco, mas vivo. O grupo em que se concentrava a maior parte do pessoal da fazenda partira na direção da sede velha, e dele faziam parte os três irmãos, André, Paulo e Jonas. E também Teodoro. Além da velha casa, esse grupo, do qual Gregório não participava, também estava incumbido de verificar a capela abandonada, justamente onde se desenrolaria a pior parte da expedição. Melhor seria se aqueles homens tivessem escolhido outros lugares ou outro grupo! Os que adentrassem a capela levariam para suas covas lembranças horríveis. A sorte é que quando chegassem lá, ainda seria dia, o sol forte brilhando no céu. Só isso. Gregório estava no grupo responsável pelo rio Jumaí, que cruzava a cidade e, num pequeno trecho, a fazenda vizinha à de Samuel. Dariam uma busca de ponta a ponta dentro dos limites da cidade. Nesse grupo, da fazenda de Samuel estavam apenas Gregório e o garoto Tônico. Mesmo assim, Gregório estava à vontade, pois tinha ali muitos amigos de infância. Era uma hora da tarde quando o pastor Elias recuperou a consciência.

Abriu os olhos com dificuldade e viu que estava deitado numa sala toda verde, mas não se lembrava de nada. Tinha o culto da manhã para celebrar. Havia deitado para dormir na noite anterior... Uma névoa formava-se quando tentava lembrar das últimas horas. Um acidente de carro passou pela mente. Ele havia assistido a um acidente na rodovia... Não! Estava dentro do carro acidentado! Sim! Então sonhara que havia deitado para o culto... Ah! Que confusão! Com a visão periférica, percebeu um ser com uma capa verde aproximando-se. Os olhos arregalaram-se desesperados. Uma capa de hospital... um lençol, um monstro. Tentou levantar e fugir. — Ufhiss! — uma dor lancinante fê-lo desistir. — Socorro. — murmurou. O espectro verde avançou sobre o indefeso pastor. Felizmente não era nenhum monstro. Nenhum vampiro. Era uma enfermeira. — Bem-vindo de volta, pastor. Que susto, hein? Não tente se mover por enquanto, ainda está sob efeito das drogas. Procure dormir um pouco mais; acredito que sua estadia aqui vá ser um pouco demorada. — Não posso... — murmurou, lembrando que alguma coisa indefinida o compelia a levantar; precisava falar com alguém, não podia... — precis... — Vencido pelos sedativos, dormiu novamente. No pequeno sítio de Genaro, duas dúzias de carros estavam estacionados em torno do celeiro. O bom e velho Gê saiu da casa trajando uma túnica negra, com as bordas das barras e das mangas vermelhas. Atrás dele, vinham dois homens trazendo um caixote coberto por um pano acetinado, demonstrando dificuldade para carregá-lo. Dentro do celeiro, na primeira fila, Pablo e Ney aguardavam o início do culto. O armazém, onde o velho Gê costumava guardar umas poucas sacas de grãos, fora transformado numa igreja diferente. Era equipada com fileiras de bancos de madeira para os fiéis, como na igreja católica ou evangélica. Havia um altar muito bonito, feito de madeira de excelente qualidade, ornado com dizeres em uma língua que parecia o latim. Diferentemente da igreja batista, inúmeras imagens encontravam-se espalhadas pelas dependências do templo, imagens sinistras e bizarras. Algumas evocavam agonia e terror. As cruzes, pelo menos dez, viradas de ponta-cabeça. Velas negras enfeitavam o topo de cada cruz, acesas, queimando e iluminando o estranho santuário. O celeiro permanecia em semi-escuridão porque as janelas e portinholas estavam cerradas. Mesmo assim, centenas de raios de luz cruzavam o espaço, tornando desnecessária a utilização das velas. Verdadeiramente, as velas tinham função apenas ritual. Havia gravuras de demônios estampados nas paredes, alguns comendo homens vivos. Outras imagens os mostravam dilacerando anjos

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Sim! Então sonhara que havia deitado para o culto... Ah! Que confusão! Com a<br />

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— Ufhiss! — uma dor lancinante fê-lo desistir. — Socorro. —<br />

murmurou.<br />

O espectro verde avançou sobre o indefeso pastor. Felizmente não era<br />

nenhum monstro. Nenhum vampiro. Era uma enfermeira.<br />

— Bem-vindo de volta, pastor. Que susto, hein? Não tente se mover por<br />

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acredito que sua estadia aqui vá ser um pouco demora<strong>da</strong>.<br />

— Não posso... — murmurou, lembrando que alguma coisa indefini<strong>da</strong> o<br />

compelia a levantar; precisava falar com alguém, não podia... — precis... —<br />

Vencido pelos se<strong>da</strong>tivos, dormiu novamente.<br />

No pequeno sítio de Genaro, duas dúzias de carros estavam estacionados<br />

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Dentro do celeiro, na primeira fila, Pablo e Ney aguar<strong>da</strong>vam o início do<br />

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permanecia em semi-escuridão porque as janelas e portinholas estavam<br />

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desnecessária a utilização <strong>da</strong>s velas. Ver<strong>da</strong>deiramente, as velas tinham função<br />

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