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FONSECA, Sherloma Starlet. Memórias de um constitucionalista

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favoráveis ao bem <strong>de</strong> todos, ao menos em nível <strong>de</strong> discurso. Paulo Duarte procura afastar a<br />

visão do movimento como <strong>um</strong>a tentativa das oligarquias paulistas <strong>de</strong> retomarem ao po<strong>de</strong>r e<br />

vinculá-lo à i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> continuida<strong>de</strong> da obra revolucionária, iniciada em 1930.<br />

Para o autor, a trincheira é o lugar do aprendizado, no qual os sacrifícios são<br />

transformados em re<strong>de</strong>nção, sendo o sofrimento necessário para a modificação do “espírito<br />

amolecido” <strong>de</strong>vido ao “repouso prolongado” (referindo-se aos anos em que o po<strong>de</strong>r político<br />

esteve concentrado nas mãos <strong>de</strong> <strong>um</strong> grupo restrito). Nesse sentido, o autor expõe que, diante<br />

dos horrores da guerra, “se polia para o brilho <strong>de</strong> <strong>de</strong>pois” (DUARTE, 1947, p. 73).<br />

A pedagogia da guerra, para Paulo Duarte, é também <strong>um</strong>a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

auto<strong>de</strong>scoberta nas trincheiras. O autor fala <strong>de</strong> si, dos seus aprendizados. Eis o caráter<br />

autobiográfico <strong>de</strong> Palmares pelo Avesso.<br />

Eu, com minha negação militar, o nada que sabia, apren<strong>de</strong>ra ali, naqueles<br />

poucos dias, pois nunca havia assistido a <strong>um</strong>a manobra, ignorava mesmo o<br />

que vinha a ser <strong>um</strong> flanco. A única aula <strong>de</strong> guerra tida antes era as paradas <strong>de</strong><br />

gala comemorativa do aniversário <strong>de</strong> In<strong>de</strong>pendência […]. A Vala Suja fôra o<br />

meu curso especializado e o meu curso <strong>de</strong> Estado Maior, como estava sendo<br />

<strong>de</strong> outros como eu. (p. 58-59)<br />

Por muitas vezes o autor voltou-se para si, para seus temores e <strong>de</strong>spreparo com o<br />

ambiente da guerra e, assim, pô<strong>de</strong> compreen<strong>de</strong>r as reações <strong>de</strong> outros combatentes. Enten<strong>de</strong>u<br />

que os jovens soldados estavam inseguros e por vezes com medo, por isso, precisavam<br />

presenciar gestos firmes que lhes passassem a segurança que faltava pra enfrentarem o medo<br />

que pairava sobre todos. Compreen<strong>de</strong>-se o outro ao olhar para si.<br />

Quantas vezes me invadiu <strong>um</strong> medo quase irreprimível, sem explicação.<br />

Sobretudo à noite, só com muito esforço se consegue vencer a crise. Nos<br />

primeiros é mais com<strong>um</strong>. Depois esses acessos vão diminuindo. Mas, <strong>de</strong> vez<br />

em quando, <strong>de</strong> surpresa, o medo bate <strong>de</strong> novo à porta...por isso, não me<br />

revolto contra o soldado, mas contra o oficial que corre. Este tem obrigação<br />

<strong>de</strong> dominar-se.<br />

O segredo do domínio é não per<strong>de</strong>r o raciocínio. Basta pensar que no mais<br />

das vezes a segurança está no lugar mais perigoso e a morte n<strong>um</strong>a retaguarda<br />

[...]. No ambiente especial das linhas <strong>de</strong> fogo, essas coisas e mais o hábito<br />

vão pondo a gente indiferente e apático. Mas, apesar disso, é preciso <strong>um</strong><br />

alerta contínuo, porque o medo é o melhor cúmplice do inimigo. (DUARTE,<br />

1947, p. 99)<br />

A passagem por Cachoeira foi rápida. Paulo Duarte hospedou-se na cida<strong>de</strong>.<br />

Desapontado com o que viu na retaguarda, o ex-combatente sentiu-se impulsionado a ir para a<br />

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