FONSECA, Sherloma Starlet. Memórias de um constitucionalista
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frente ao posto <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> [...].<br />
O Bayma explicou-me que os meninos eram bons. Não tinham ainda entrado<br />
em fogo, mas gente disposta a morrer.<br />
Mas nós precisávamos <strong>de</strong> gente disposta a viver! Que soubesse matar sem se<br />
expor. (DUARTE, 1947, p. 40-41) 34<br />
Contudo, não era a diferença social ou o <strong>de</strong>spreparo dos soldados o foco das críticas <strong>de</strong><br />
Paulo Duarte. Pelo contrário, o autor consi<strong>de</strong>rava que essas fraquezas eram reflexos das<br />
atitu<strong>de</strong>s dos oficiais. Acost<strong>um</strong>ados com <strong>um</strong>a existência totalmente diversa, o autor<br />
consi<strong>de</strong>rava que muitos meninos ricos do batalhão Piratininga se tornaram homens no front.<br />
Acreditava que alguns jovens, ao contrário dos oficiais, apren<strong>de</strong>ram que no campo <strong>de</strong> batalha<br />
todas as classes se nivelam. Os oficiais, entretanto, mantiveram a distinção da hierarquia e se<br />
transformaram em alvo fácil para a ira do jornalista.<br />
O mau comportamento <strong>de</strong> oficiais pareceu intrigar Paulo Duarte e a narrativa <strong>de</strong><br />
episódios con<strong>de</strong>náveis é constante no texto. É <strong>um</strong>a forma <strong>de</strong> o autor comprovar,<br />
gradativamente, sua visão <strong>de</strong> que 1932 não foi <strong>um</strong>a guerra <strong>de</strong>rrotada, mas traída, pois aos<br />
poucos a vitória foi sendo entregue ao inimigo: quando não se atacou com coragem, não se<br />
resistiu com dignida<strong>de</strong> e abriu-se gran<strong>de</strong> espaço para a <strong>de</strong>sorganização. Tal situação é<br />
apresentada pelo autor <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início das narrativas do conflito armado.<br />
A mesma <strong>de</strong>pressão dos dias passados na inutilida<strong>de</strong> do Gran<strong>de</strong> Quartel<br />
General, on<strong>de</strong> os instantes <strong>de</strong> sacrifício alheio alimentavam a carreira do<br />
oportunismo.<br />
Passei a noite assuntando sobre a nossa <strong>de</strong>sgraça e sobre a nossa<br />
<strong>de</strong>sorganização.<br />
Quase dois meses <strong>de</strong> tempo, nem <strong>um</strong>a providência <strong>de</strong> preparação da guerra<br />
inevitável! Meio mês <strong>de</strong> guerra, nem organização, nem disciplina!<br />
(DUARTE, 1947, p. 16)<br />
Os memorialistas e a historiografia com<strong>um</strong>ente apontam a <strong>de</strong>sorganização da guerra<br />
como <strong>um</strong> dos fatores da <strong>de</strong>rrota. Segundo Alfredo Feijó, o militar da Força Pública, ex-<br />
comandante do Regimento da Cavalaria do Rio Pardo, “foram três os motivos que levaram à<br />
<strong>de</strong>rrota, todos localizados no começo da luta: a má organização da revolução; a precipitação<br />
do 9 <strong>de</strong> Julho e a falta <strong>de</strong> comando geral em chefe... Tínhamos três entida<strong>de</strong>s empenhadas<br />
n<strong>um</strong>a revolução, sem <strong>um</strong> comando único, real e atuante” (BORGES, 1997, p. 49).<br />
Paulo Duarte não menciona diretamente a questão da precipitação da data. Contudo,<br />
34 O Batalhão Piratininga era formado por engenheiros da Escola Politécnica. Há registro <strong>de</strong> que eles se<br />
rebelaram e <strong>de</strong>sobe<strong>de</strong>ceram as or<strong>de</strong>ns da comissão <strong>de</strong> professores da escola que, <strong>de</strong> posse <strong>de</strong> <strong>um</strong>a requisição do<br />
Q.G., tencionava impedir a sua partida para o front, alegando que seus serviços seriam mais úteis no Serviço <strong>de</strong><br />
Engenharia da Força Pública do estado. O primeiro pelotão ficou conhecido como “Caçadores <strong>de</strong> Piratininga”.<br />
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