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FONSECA, Sherloma Starlet. Memórias de um constitucionalista

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- Precisamos provi<strong>de</strong>nciar <strong>um</strong>a toca melhor, on<strong>de</strong> ao menos não chova. Esta<br />

lona, tenho a impressão <strong>de</strong> que cata toda a água do barranco pra jogar em<br />

cima da gente. Guerra boa tem que ser sem chuva.<br />

- E sem tiros... (DUARTE, 1947, p. 11)<br />

A chuva dificultava o posicionamento nas trincheiras, sendo <strong>um</strong> incômodo à<br />

visibilida<strong>de</strong> que se tinha do inimigo, especialmente no período noturno. O transtorno causado<br />

pela chuva <strong>de</strong>sfavorecia ainda mais os <strong>constitucionalista</strong>s enquanto eram fustigados por forte<br />

tiroteio inimigo. Entre os ex-combatentes, era com<strong>um</strong> o comentário <strong>de</strong> que a chuva parecia<br />

ser aliada dos adversários, sendo <strong>um</strong> entrave à ação <strong>constitucionalista</strong>, mesmo em momentos<br />

<strong>de</strong> retirada.<br />

O som da metralhadora embalava a rotina do front. Vários dias recaíram ao som do<br />

tiroteio vindo das trincheiras inimigas e na monotonia do tijuco em que se chafurdavam.<br />

Nestas condições, o autor comenta que logo a trincheira se tornou sinônimo <strong>de</strong>: “Sangue,<br />

lama, chuva, bala, porcaria e morte” (DUARTE, 1947, p. 44). Essa imagem das trincheiras era<br />

conhecida apenas pelos combatentes que enfrentavam as privações.<br />

A primeira cida<strong>de</strong> em que o autor chegou foi no município <strong>de</strong> Cachoeira. Viajou com<br />

<strong>um</strong> grupo o dia inteiro e, ao aproximar-se da cida<strong>de</strong>, comentou: “Entramos a primeira rua da<br />

cida<strong>de</strong>, não fosse o número <strong>de</strong> fardas, ninguém podia adivinhar <strong>um</strong>a vanguarda <strong>de</strong> guerra.<br />

Lembrava mais cida<strong>de</strong> do interior em dia <strong>de</strong> festa. Automóveis, gente, grupos alegres”<br />

(DUARTE, 1947, p. 14). Esse cenário inesperado motivou a indignação do jornalista:<br />

enquanto se perdia tantos soldados na trincheira, havia cenários como em<br />

Cachoeira, cheia <strong>de</strong> soldados para fazer multidão! Na frente, <strong>de</strong> verda<strong>de</strong>,<br />

estava morrendo <strong>um</strong>a porção <strong>de</strong> mocida<strong>de</strong> – outros moços anônimos – para<br />

garantir a farra campestre, a farra dos moços que têm nome... (p. 15)<br />

A presença <strong>de</strong> jovens <strong>de</strong> família ricas na trincheira foi ironizada em vários momentos<br />

pelo autor. Na opinião <strong>de</strong>ste, os jovens faziam da retaguarda <strong>um</strong> “gran<strong>de</strong> acampamento <strong>de</strong><br />

ciganos” elegantes. As críticas direcionavam-se especialmente ao Batalhão Piratininga,<br />

porque era o que estava mais próximo aos seus olhares, pois atuaram no Vale do Paraíba.<br />

O capitão Arcy comunicou pelo telefone que acabavam <strong>de</strong> chegar dois<br />

pelotões do batalhão Piratininga, para reforçar as linhas. Ia enviá-los.<br />

Um batalhão <strong>de</strong> voluntários. Batalhão Pó-<strong>de</strong>-Arroz, como fôra apelidado.<br />

Moços da melhor socieda<strong>de</strong>. Estudantes, meninos ricos...<br />

Recebemos a noticia com indiferença. Precisávamos soldados, mandavam<br />

recrutas <strong>de</strong> luxo...<br />

Com essa mesma indiferença, alg<strong>um</strong>as horas mais tar<strong>de</strong>, recebemo-los em<br />

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