FONSECA, Sherloma Starlet. Memórias de um constitucionalista

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homogeneizador com ênfase na unidade e na harmonia da população do estado. As características citadas por Bezerra podem ser identificadas na narrativa de Paulo Duarte (1947, p. 14) sobre o front: “Não via o espaço, via o tempo. Via diante a guerra vencedora. Via o paulista atravessando mais uma vez, na nova bandeira, as serras em que agora se batia. Via-o entrando pelo Brasil a dentro para, de novo, dar o Brasil ao Brasil”. Percebe-se nas palavras do autor a generalização em torno de “o paulista”, como se toda a população estivesse envolvida na guerra civil e como se o espírito bandeirante pudesse se conservar no tempo. Os cartazes do movimento com figuras de bandeirantes ilustraram a citação de Paulo Duarte, quando o autor falou em “Dar o Brasil ao Brasil”. Cartaz da Revolução Constitucionalista, 1932. São Paulo (SP). (CPDOC/ CDA Roberto Costa) 21 A imagem anexada refere-se a um dos cartazes da campanha, amplamente divulgado nos livros e na internet quando o assunto é a revolução constitucionalista. Na ilustração aparece o desenho de um grande bandeirante carregando um pequeno Getúlio como uma presa; atrás aparece o soldado constitucionalista segurando a bandeira do estado e, em sua extensão, os dizeres “Contra a dictadura”, o que demonstra o claro desejo de se estigmatizar a do historiador Alfredo Ellis Júnior, A nossa Guerra, e é usado para adjetivar o espírito que toma conta dos paulistas nesse período e que institui uma série de valores e características consideradas próprias da condição desses (CERRI, 1998). 21 Disponível em: http://www.cpdoc.fgv.br/nav_historia/htm/anos30-37/ev_pop_cons5.htm 40

imagem do governo Vargas. O desbravador e o soldado paulista enfrentavam o invasor Getúlio Vargas para livrar São Paulo e o país daquele que usurpou os princípios revolucionários de 1930. A identificação de São Paulo como construtor do Brasil tornou tênues os limites de compreensão entre “dar o Brasil ao Brasil” e devolver São Paulo aos paulistas (dar São Paulo a São Paulo). Os interesses paulistas eram expostos como nacionais. É o que podemos perceber não apenas nos cartazes da campanha, mas nas mensagens dirigidas aos líderes políticos de outros estados. Estes ocupavam as páginas dos jornais paulistas, incitando a todos da responsabilidade de fazer parte da luta que visava a continuidade do país perante as ameaças à ordem e ao desenvolvimento dos estados pela ditadura, o que significaria o “aniquilamento” destes. É o que se constata na mensagem de Pedro de Toledo, Isidoro Dias Lopes, Francisco Morato, Bertholdo Klinger e Pádua Sales a Olegário Maciel, no início da luta, quando já conseguiram o apoio de mato-grossenses: São Paulo, numa unanimidade assombrosa de todas as forças civis e militares [...] levantou-se resoluto e armado para impor aos dirigentes da Nação as ideias que formam o fundo das tradições da grandeza e das esperanças dos brasileiros, levantou-se para forçar o retorno do País no mais breve prazo possível à normalidade constitucional, à tranqüilidade dos espíritos, de seus compatriotas e ao triunfo na próxima Constituinte dos princípios liberais, que são o apanágio da nossa cultura, o penhor de nossa hegemonia [...].a segurança de nossa finalidade, o orgulho de nosso povo e a relevância de nosso papel no seio das nações que prosperam à sombra do cristianismo e das leis que regem perpetuamente os destinos da Humanidade, expressões nas quatro ideias fundamentais de Deus, Pátria, de Família e de Prosperidade. Conjugados nossos irmãos de Mato Grosso, já estamos no campo da luta. Não ignora v. exa. que a ditadura, subjugada nas malhas de uma política nefasta e mesquinha, tem demonstrado não poder corresponder ao pensamento e desejos do País; o trabalho da reconstituição nacional não será possível sem mudança radical dos rumos até hoje trihados. A luta está travada. Havemos de vencer, venceremos custe o que custar, pois a derrota seria o aniquilamento de São Paulo, de Minas, do Brasil e da nossa própria nacionalidade. (PEREIRA, 1982, p. 454) Apreende-se no texto o desejo de unidade que São Paulo dirigia a Minas e Mato Grosso. A possibilidade da derrota representaria o aniquilamento de São Paulo e, por extensão, de toda nacionalidade. O uso da sinédoque sinaliza a inversão da parte pelo todo, reforçando o sentido de superioridade do paulista. Nota-se que os princípios do liberalismo são reafirmados, estando seus pilares estruturados nas quatro ideias fundamentais: “Deus, Pátria, Família e Prosperidade”. Os 41

imagem do governo Vargas. O <strong>de</strong>sbravador e o soldado paulista enfrentavam o invasor<br />

Getúlio Vargas para livrar São Paulo e o país daquele que usurpou os princípios<br />

revolucionários <strong>de</strong> 1930. A i<strong>de</strong>ntificação <strong>de</strong> São Paulo como construtor do Brasil tornou<br />

tênues os limites <strong>de</strong> compreensão entre “dar o Brasil ao Brasil” e <strong>de</strong>volver São Paulo aos<br />

paulistas (dar São Paulo a São Paulo).<br />

Os interesses paulistas eram expostos como nacionais. É o que po<strong>de</strong>mos perceber não<br />

apenas nos cartazes da campanha, mas nas mensagens dirigidas aos lí<strong>de</strong>res políticos <strong>de</strong> outros<br />

estados. Estes ocupavam as páginas dos jornais paulistas, incitando a todos da<br />

responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> fazer parte da luta que visava a continuida<strong>de</strong> do país perante as ameaças à<br />

or<strong>de</strong>m e ao <strong>de</strong>senvolvimento dos estados pela ditadura, o que significaria o “aniquilamento”<br />

<strong>de</strong>stes. É o que se constata na mensagem <strong>de</strong> Pedro <strong>de</strong> Toledo, Isidoro Dias Lopes, Francisco<br />

Morato, Bertholdo Klinger e Pádua Sales a Olegário Maciel, no início da luta, quando já<br />

conseguiram o apoio <strong>de</strong> mato-grossenses:<br />

São Paulo, n<strong>um</strong>a unanimida<strong>de</strong> assombrosa <strong>de</strong> todas as forças civis e<br />

militares [...] levantou-se resoluto e armado para impor aos dirigentes da<br />

Nação as i<strong>de</strong>ias que formam o fundo das tradições da gran<strong>de</strong>za e das<br />

esperanças dos brasileiros, levantou-se para forçar o retorno do País no mais<br />

breve prazo possível à normalida<strong>de</strong> constitucional, à tranqüilida<strong>de</strong> dos<br />

espíritos, <strong>de</strong> seus compatriotas e ao triunfo na próxima Constituinte dos<br />

princípios liberais, que são o apanágio da nossa cultura, o penhor <strong>de</strong> nossa<br />

hegemonia [...].a segurança <strong>de</strong> nossa finalida<strong>de</strong>, o orgulho <strong>de</strong> nosso povo e a<br />

relevância <strong>de</strong> nosso papel no seio das nações que prosperam à sombra do<br />

cristianismo e das leis que regem perpetuamente os <strong>de</strong>stinos da H<strong>um</strong>anida<strong>de</strong>,<br />

expressões nas quatro i<strong>de</strong>ias fundamentais <strong>de</strong> Deus, Pátria, <strong>de</strong> Família e <strong>de</strong><br />

Prosperida<strong>de</strong>.<br />

Conjugados nossos irmãos <strong>de</strong> Mato Grosso, já estamos no campo da luta.<br />

Não ignora v. exa. que a ditadura, subjugada nas malhas <strong>de</strong> <strong>um</strong>a política<br />

nefasta e mesquinha, tem <strong>de</strong>monstrado não po<strong>de</strong>r correspon<strong>de</strong>r ao<br />

pensamento e <strong>de</strong>sejos do País; o trabalho da reconstituição nacional não será<br />

possível sem mudança radical dos r<strong>um</strong>os até hoje trihados.<br />

A luta está travada. Havemos <strong>de</strong> vencer, venceremos custe o que custar, pois<br />

a <strong>de</strong>rrota seria o aniquilamento <strong>de</strong> São Paulo, <strong>de</strong> Minas, do Brasil e da nossa<br />

própria nacionalida<strong>de</strong>. (PEREIRA, 1982, p. 454)<br />

Apreen<strong>de</strong>-se no texto o <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> unida<strong>de</strong> que São Paulo dirigia a Minas e Mato<br />

Grosso. A possibilida<strong>de</strong> da <strong>de</strong>rrota representaria o aniquilamento <strong>de</strong> São Paulo e, por<br />

extensão, <strong>de</strong> toda nacionalida<strong>de</strong>. O uso da sinédoque sinaliza a inversão da parte pelo todo,<br />

reforçando o sentido <strong>de</strong> superiorida<strong>de</strong> do paulista.<br />

Nota-se que os princípios do liberalismo são reafirmados, estando seus pilares<br />

estruturados nas quatro i<strong>de</strong>ias fundamentais: “Deus, Pátria, Família e Prosperida<strong>de</strong>”. Os<br />

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