FONSECA, Sherloma Starlet. Memórias de um constitucionalista
FONSECA, Sherloma Starlet. Memórias de um constitucionalista
FONSECA, Sherloma Starlet. Memórias de um constitucionalista
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
da crise e da sua longa duração. Vivêssemos já sob o regime constitucional e não estaríamos<br />
assistindo o espetáculo da guerra civil” (PEREIRA, 1982, p. 478).<br />
1.5 A pátria ban<strong>de</strong>irante: entre o passado e o presente<br />
Tratar da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>constitucionalista</strong> é i<strong>de</strong>ntificar <strong>um</strong> “ser paulista” que se refere não<br />
apenas ao paulista <strong>de</strong> nascimento, mas todos que congregariam <strong>de</strong> <strong>um</strong> “espírito paulista”. A<br />
guerra civil ficou na história como <strong>um</strong>a questão paulista e o isolamento a que o estado foi<br />
subjugado durante o conflito exacerbou ainda mais as percepções nesse sentido. Para que o<br />
movimento ganhasse expressivida<strong>de</strong> e agregasse o maior número possível <strong>de</strong> militantes e<br />
simpatizantes, tornou-se estratégico o uso <strong>de</strong> propagandas que divulgavam a autoimagem do<br />
grupo <strong>constitucionalista</strong> vinculada à exaltação e reafirmação da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ste “ser<br />
paulista”, entrecruzava-se, assim, as duas i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s. O velho ban<strong>de</strong>irante construtor da<br />
nacionalida<strong>de</strong> teria agora que <strong>de</strong>fendê-la, empunhando a constituição como arma. Os<br />
historiadores, sobretudo da revista do Instituto Histórico Geográfico <strong>de</strong> São Paulo (IHGSP),<br />
como Afonso <strong>de</strong> Taunay e Alfredo Ellis Jr., atribuíram aos paulistas o papel <strong>de</strong> construtores da<br />
nacionalida<strong>de</strong>. Aos intelectuais e, sobretudo, à imprensa coube o papel <strong>de</strong> exaltar a<br />
superiorida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sse povo diante do novo <strong>de</strong>safio, a luta pelo retorno da norma constitucional.<br />
Segundo Peter Burke (2000), cada socieda<strong>de</strong>, assim como os indivíduos, seleciona os<br />
acontecimentos e valores a serem retidos na memória e <strong>de</strong>pois <strong>de</strong>termina também a maneira<br />
com que <strong>de</strong>vem ser rememorados. Essa observação se aplica à experiência paulista, pois a<br />
construção da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> do movimento <strong>de</strong> 1932 perpassou pela adaptação dos valores e da<br />
história paulista aos princípios <strong>constitucionalista</strong>s. Nesse sentido, os feitos e as personagens<br />
do passado são rememorados e outras vezes também ressignificados no trabalho <strong>de</strong><br />
construção <strong>de</strong> <strong>um</strong>a imagem do Estado <strong>de</strong> São Paulo personificado como sujeito coletivo,<br />
civilizador e promotor do progresso nacional. Busca-se também promover a coesão <strong>de</strong><br />
diversos grupos sociais e étnicos, resgatando a importância <strong>de</strong>stes nos cenários das mudanças<br />
regionais, formando <strong>um</strong>a aparente homogeneida<strong>de</strong> firmada na i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> una do “ser<br />
paulista”.<br />
Danilo Zioni Ferretti e Maria Helena Capelato (1999) afirmam que, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o final do<br />
século XVIII, a elite paulista esforçava-se por formar a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo como a<br />
vanguarda da nacionalida<strong>de</strong>. Segundo os autores, a partir <strong>de</strong> 1870, a elite cafeicultora,<br />
marcada pela orientação republicana e liberal <strong>de</strong>scentralizadora, empenhou-se em representar<br />
37