12.04.2013 Views

FONSECA, Sherloma Starlet. Memórias de um constitucionalista

FONSECA, Sherloma Starlet. Memórias de um constitucionalista

FONSECA, Sherloma Starlet. Memórias de um constitucionalista

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

A luta contra a presença <strong>de</strong> Getúlio Vargas no espaço político (mesmo <strong>de</strong> seu legado<br />

político) cons<strong>um</strong>iu a vida do jornalista. Contudo, ele não recebeu muita atenção do<br />

Presi<strong>de</strong>nte, que em seus diários <strong>de</strong>dicou-lhe apenas duas referências, manifestando-se: “o<br />

exilado Paulo Duarte […] 'Que reles intrigante!'” (VARGAS, 1995, p. 241). Percebe-se Paulo<br />

Duarte como <strong>um</strong> opositor ferrenho, mas sem a visibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> muitos membros da elite social,<br />

política e econômica.<br />

O autor escreve suas “razões <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa por ter vivido”, como diz o emblemático título<br />

<strong>de</strong> sua apresentação ao livro <strong>de</strong> <strong>Memórias</strong>, para registrar na escrita sua versão dos fatos,<br />

<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>ndo-se das perversida<strong>de</strong>s do tempo e dos julgamentos h<strong>um</strong>anos. Ao <strong>de</strong>scartar o<br />

interesse pelas memórias <strong>de</strong> vidas insípidas, valorizou seu gesto memorial. A vida só <strong>de</strong>via ser<br />

contada quando se estava em jogo à <strong>de</strong>fesa do espaço público (SANDES, 2009).<br />

Nesse sentido, revelou-se <strong>um</strong> projeto <strong>de</strong> memória. Assim, busca-se i<strong>de</strong>ntificar como o<br />

real foi pensado, escrito e dado a ler pelos contemporâneos dos acontecimentos. A obra<br />

tornou-se <strong>um</strong> objeto singular a ser <strong>de</strong>cifrado, tanto em suas condições <strong>de</strong> produção, quanto na<br />

sua organização discursiva. Nas obras selecionadas, percebe-se que a escrita sobre o passado<br />

da revolução se <strong>de</strong>sdobra em dois momentos: no primeiro, a lembrança se efetiva rente aos<br />

fatos; no segundo, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> trinta anos quando o regime militar já havia se consolidado.<br />

O primeiro é <strong>um</strong>a escrita feita no exílio na Europa, para on<strong>de</strong> Paulo Duarte e os outros<br />

exilados foram enviados após a <strong>de</strong>rrota da luta <strong>constitucionalista</strong>. Nesse momento, é com<strong>um</strong>,<br />

sobretudo, a escrita epistolar entre os exilados e seus parentes e amigos no Brasil. É <strong>de</strong>sse<br />

período também a obra Palmares pelo Avesso, <strong>um</strong> relato sobre o cotidiano da guerra <strong>de</strong> 1932.<br />

Esses escritos apresentam as impressões do autor contemporâneas aos fatos, sinalizando o<br />

primeiro “momento biográfico” 10 em que a escrita teve por finalida<strong>de</strong> or<strong>de</strong>nar e dar sentido<br />

aos acontecimentos.<br />

Com base nos escritos da década <strong>de</strong> 1930, Paulo Duarte escreveu <strong>Memórias</strong>. O<br />

arquivo constituído ao longo <strong>de</strong> décadas servia-lhe como garantia da verda<strong>de</strong> e da<br />

legitimida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua escrita. Os papéis preservados são expressões da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> do autor, que<br />

no trabalho <strong>de</strong> triagem <strong>de</strong> sua doc<strong>um</strong>entação pessoal teve a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> or<strong>de</strong>nar a<br />

narrativa e, assim, reconstruir sua história, construindo <strong>um</strong> sentido à própria vida e <strong>um</strong>a<br />

imagem <strong>de</strong> si 11 . Esses papéis integram a obra memorialista e alguns <strong>de</strong>les são anexados (cartas<br />

10 Conforme Carlos Piña (1991), no “momento biográfico”, o sujeito constrói <strong>um</strong>a imagem <strong>de</strong> si, isto é, <strong>um</strong>a<br />

representação, realizada para si e para os outros, <strong>de</strong> sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> como persona. A i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> persona está<br />

relacionada à percepção do indivíduo como uno e múltiplo: único em relação a todos os <strong>de</strong>mais; múltiplo no que<br />

diz respeito as seus papéis sociais. Somos múltiplos e teatrais. O sujeito mo<strong>de</strong>rno não é contínuo e harmônico,<br />

mas ao escrever apresenta o <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> “unida<strong>de</strong> do eu”.<br />

11 Paulo Duarte reconhece o valor das memórias para a história e pressupunha a importância <strong>de</strong> sua contribuição<br />

19

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!