FONSECA, Sherloma Starlet. Memórias de um constitucionalista
FONSECA, Sherloma Starlet. Memórias de um constitucionalista
FONSECA, Sherloma Starlet. Memórias de um constitucionalista
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
<strong>de</strong>legavam aos intelectuais a tarefa <strong>de</strong> formar a consciência nacional e disciplinar a<br />
mentalida<strong>de</strong> do povo.<br />
Paulo Duarte integra o grupo dos “primos pobres” das oligarquias 6 , cujas famílias<br />
encontram-se relativamente afastadas da fração política, econômica e intelectual da classe<br />
dirigente. O pai <strong>de</strong> Paulo Duarte, Hermínio Duarte, era maçom e republicano. No entanto, já<br />
na República, tinha repulsa pela política partidária e pouco interferia nas eleições 7 . A mãe,<br />
Dona Jovina – a quem Paulo Duarte (1974, p. 79) se referiu como: “inigualável amiga”, a<br />
quem <strong>de</strong>via tudo – era <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> <strong>um</strong>a família tradicional da região <strong>de</strong> Franca. Seu<br />
bisavô era o Barão <strong>de</strong> Casa Branca. Contudo, sua avó materna fora privada da herança e,<br />
consequentemente, a família <strong>de</strong> Paulo não <strong>de</strong>sfrutou <strong>de</strong> muita riqueza. Ao <strong>de</strong>screver a<br />
condição econômica da família, o autor comenta:<br />
Nós também sofríamos aquelas diferenciações sociais. A maioria dos<br />
Junqueiras era ricos (sic) e nós pobres. Meu Pai vinha também <strong>de</strong> <strong>um</strong>a<br />
família pobre. Mas minha Mãi, (sic) Junqueira, havia sido muito rica, e meu<br />
Pai era filho <strong>de</strong> <strong>um</strong> <strong>de</strong>sses que os patriotas chamam <strong>de</strong> herói do Paraguai,<br />
antigo protegido <strong>de</strong> Caxias e dos Republicanos. De modo que gozávamos <strong>de</strong><br />
<strong>um</strong> prestígio intermediário. (DUARTE, 1974, p. 166)<br />
A posição social alcançada pela família <strong>de</strong> Paulo Duarte <strong>de</strong>ve-se à formação<br />
educacional e profissional a que se <strong>de</strong>dicava. Paulo Duarte teve contato com o ambiente da<br />
imprensa <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o primeiro emprego, ainda na adolescência, aos quatorze anos. Os contatos<br />
profissionais o colocaram próximo aos personagens e bastidores da política do período.<br />
6 A expressão foi usada por Sério Miceli (1979) ao se referir aos intelectuais <strong>de</strong> 1920-1945 que pertenciam a<br />
famílias <strong>de</strong> “parentes pobres” ou <strong>de</strong> oligarquias <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ntes que ingressaram nos serviços públicos buscando<br />
resgatar o <strong>de</strong>clínio social e a segurança financeira para <strong>de</strong>senvolverem suas ativida<strong>de</strong>s intelectuais. O autor<br />
<strong>de</strong>monstra que a ascensão social e intelectual <strong>de</strong>sse grupo se <strong>de</strong>u com dificulda<strong>de</strong>s, quando comparados a<br />
trajetórias <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rnistas her<strong>de</strong>iros <strong>de</strong> famílias tradicionais (o autor usa como exemplo a comparação entre<br />
Oswald <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, proveniente <strong>de</strong> berço abastado, e Mario <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, que não chegou a concluir nenh<strong>um</strong><br />
curso superior).<br />
7 Hermínio Duarte (nascido em 1873, em Franca) exercia ativida<strong>de</strong>s comerciais, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os doze anos, quando se<br />
mudou para São Paulo. Em 1895, fez parte <strong>de</strong> <strong>um</strong> grupo <strong>de</strong> enfermeiros contratados para lutar contra <strong>um</strong>a<br />
epi<strong>de</strong>mia <strong>de</strong> febre amarela em Cataguases. Foi quando conheceu Paulo Saldanha da Gama, sobrinho do famoso<br />
almirante <strong>de</strong> 1893, que se tornou <strong>um</strong> gran<strong>de</strong> amigo, e foi por causa <strong>de</strong>le que Paulo Duarte foi batizado com o<br />
mesmo prenome. Depois do nascimento <strong>de</strong> Paulo, a família voltou para Franca. Hermínio passou a trabalhar<br />
n<strong>um</strong>a coletoria, <strong>um</strong>a repartição arrecadadora, e sentia-se frustrado com o baixo cargo no emprego público,<br />
apesar <strong>de</strong> ser <strong>um</strong> personagem indispensável na vida cultural da pequena cida<strong>de</strong> em que morava.<br />
Paulo Duarte cita como fato importante que o pai, em 1910, votou em Rui Barbosa, <strong>de</strong> quem era gran<strong>de</strong><br />
admirador. A campanha civista que agitara São Paulo – em oposição à candidatura militar do marechal Hermes<br />
da Fonseca, ministro <strong>de</strong> Guerra <strong>de</strong> Afonso Pena – “<strong>de</strong>ixara lembranças fundas que se integraram na tradição<br />
francana. E fez ainda inimiza<strong>de</strong>s” (DUARTE, 1974, p. 206). Após a vitória do militar, o Diário Oficial publicou,<br />
dias <strong>de</strong>pois, a <strong>de</strong>missão <strong>de</strong> meu pai e a nomeação <strong>de</strong> <strong>um</strong> hermista para o seu lugar. “Tudo aquilo por <strong>um</strong>a questão<br />
<strong>de</strong> política na qual se envolvera apenas com o seu voto” (p. 212).<br />
Hermínio Duarte voltou a ser <strong>de</strong>mitido do emprego em 1932, <strong>de</strong>vido à participação <strong>de</strong> Paulo Duarte no<br />
movimento <strong>constitucionalista</strong>.<br />
16