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FONSECA, Sherloma Starlet. Memórias de um constitucionalista

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Mais <strong>um</strong>a vez, Paulo Duarte critica os militares que se satisfaziam com as glórias<br />

individuais. Sobre a relação entre a postura militar e da impresa, o autor (1947, p. 189)<br />

reconhece que o interesse militar exiga a censura e que “o conjunto das notícias <strong>de</strong> guerra<br />

<strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong> <strong>um</strong> otimismo capaz <strong>de</strong> manter em calma e sem alarme a população”. Contudo,<br />

analisa que “esse otimismo não <strong>de</strong>ve chegar ao exagero ridículo que se via em todos os jor-<br />

nais”. Percebe-se que a dissimulação <strong>de</strong> heroísmo <strong>constitucionalista</strong> <strong>de</strong>sagrada o autor, que<br />

julga inútil e inacreditável esse tipo <strong>de</strong> escrita dos fatos.<br />

109<br />

Enquanto isso, os verda<strong>de</strong>iros combatentes jazem esquecidos na Terra-<strong>de</strong>ninguém.<br />

Os verda<strong>de</strong>iros soldados nunca po<strong>de</strong>m sair <strong>de</strong> lá para essas<br />

cabotinadas. E, se alg<strong>um</strong> dia saem é para o hospital ou para o entêrro. Quem<br />

vai para o hospital não fala ao jornal, geme. E quem acompanha <strong>um</strong> entêrro<br />

na qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>funto nem fala, nem geme. De qualquer maneira <strong>um</strong>a<br />

impossibilida<strong>de</strong> absoluta <strong>de</strong> ficar herói. (DUARTE, 1947, p. 191)<br />

Paulo Duarte alerta para os verda<strong>de</strong>iros heróis que não sobreviverem ou não tiveram a<br />

oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> narrar suas história e torná-las públicas. O autor fala em nome <strong>de</strong>stes, para<br />

que não fossem esquecidos pelo tempo, pois só aquilo que é conhecido po<strong>de</strong> ser lembrado.<br />

Nesse sentido, consi<strong>de</strong>ra-se que “a escrita do sobrevivente se vincula à memória daqueles que<br />

não sobreviveram. Nesse sentido, escrever é também <strong>um</strong>a forma <strong>de</strong> dar túmulo aos mortos,<br />

para que não sejam esquecidos” (SELIGMANN-SILVA: 2003, 55) 52 .<br />

Em contrapartida à divulgação dos feitos <strong>de</strong> pseudo ou anti-heróis, eis que surge o<br />

soldado anônimo. Ao registrar as atuações <strong>de</strong> alguns <strong>de</strong>sses, divulga-se os feitos dos genuínos<br />

heróis da guerra <strong>constitucionalista</strong>. Assim, o autor nos apresenta o jovem Augusto, na época<br />

com seus 17 anos, cujo sobrenome é <strong>de</strong>sconhecido – que corajosamente colocou-se em<br />

situação <strong>de</strong> perigo para <strong>de</strong>simpedir a passagem do trem blindado.<br />

O nosso trem não podia recuar!<br />

Estávamos presos!<br />

A exclamação brotou <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> mim ao ouvir a comunicação do Carlos com<br />

<strong>um</strong>a voz metálica. Abusáramos <strong>de</strong>mais!<br />

Retruquei ao Carlos. Recuaríamos o trem até encostar-se aos entulhos. Fôsse<br />

avisando da aproximação para que o maquinista <strong>de</strong>tivesse a marcha,<br />

enquanto isso, se escolhesse <strong>um</strong> voluntário para se sacrificar em favor do<br />

resto do trem.<br />

– Se ninguém se apresentar, rematou o Carlos, eu <strong>de</strong>scerei.<br />

Mas não foi preciso. Todos queriam ser <strong>de</strong>stacados no segundo carro, para o<br />

sacrifício!<br />

52 Ver também Certeau (200, p.107-108): “a escrita construiu <strong>um</strong> 'túmulo' para o morto […] Ela exorciza a morte<br />

e a coloca no relato, que substitui pedagogicamente alg<strong>um</strong>a coisa que o leitor <strong>de</strong>ve crer e fazer. Este processo se<br />

repete em muitas outras formas não-científicas, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o elogio fúnebre, na rua, até o enterro”.

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