Semântica - CCE - Universidade Federal de Santa Catarina
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(a ) Em 1998, o Brasil exportava carne para a Rússia.<br />
(b) Em 1998, o Brasil exportou carne para a Rússia.<br />
A sentença ‘e ainda exporta’ po<strong>de</strong> ser continuação discursiva <strong>de</strong> (a) e (b)?<br />
Vejamos mais claramente esse contraste com o par <strong>de</strong> sentenças abaixo:<br />
(39) (*) João foi para casa, mas resolveu não ir mais, no meio do caminho.<br />
(40) João ia (estava indo) para casa, mas resolveu não ir mais, no meio do caminho.<br />
Em (39),<br />
o evento <strong>de</strong> João ir para a casa é representado perfectivamente, ou seja, como<br />
concluso, e isso através da forma <strong>de</strong> pretérito perfeito do verbo ‘ir’, ‘foi’. Um evento<br />
dado como concluso não po<strong>de</strong> ser interrompido ou ter sua conclusão negada; é por isso<br />
que a sentença (39) é estranha. Por sua vez, a sentença (40) é perfeitamente natural,<br />
trazendo os mesmos elementos e tratando do mesmo evento, João ir para a casa. A única<br />
diferença em relação à sentença (39) é que (40) representa o evento imperfectivamente,<br />
portanto,<br />
em andamento ou inconcluso, fato que permite que ele seja interrompido ou<br />
que neguemos sua conclusão.<br />
Pelos mesmos motivos, ou seja, representar o evento como concluso, a sentença<br />
(41)<br />
soa estranha, ao passo que (42) não:<br />
(41) (*) Maria chegou quando João pintou o quadro 20 .<br />
(42) Maria chegou quando João pintava o quadro<br />
Uma outra característica<br />
que distingue a representação aspectual perfectiva da<br />
imperfectiva<br />
é que a primeira apresenta uma proprieda<strong>de</strong> que chamaremos <strong>de</strong><br />
isomorfismo,<br />
termo que usaremos para um tipo particular <strong>de</strong> iconismo, pelo qual a<br />
or<strong>de</strong>m<br />
<strong>de</strong> apresentação <strong>de</strong> eventos perfectivos em uma sentença é isomorfa (igual/<br />
correspon<strong>de</strong>nte) à or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> ocorrência dos eventos no mundo<br />
(ou no mundo <strong>de</strong> uma<br />
dada narrativa); o mesmo não se dá com eventos imperfectivos. Vejamos um exemplo,<br />
retirado <strong>de</strong> uma crônica <strong>de</strong> L. F. Veríssimo (1982)<br />
(“s” está por sentença):<br />
20<br />
Essa sentença po<strong>de</strong>, <strong>de</strong> fato, receber uma interpretação segundo a qual Maria chegou no exato momento<br />
em que João terminou <strong>de</strong> pintar o quadro; interpretação essa, <strong>de</strong> resto, completamente diferente da que<br />
atribuímos<br />
a (41).<br />
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