12.04.2013 Views

Antônio Luiz Vieira - ICHS/UFOP

Antônio Luiz Vieira - ICHS/UFOP

Antônio Luiz Vieira - ICHS/UFOP

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Mas o quê tornava aqueles personagens tão atrativos e inspiradores a todo ativista<br />

revolucionário?<br />

Alain Besançon 1 , em seu estudo sobre a intelligentsia russa, procura responder à<br />

pergunta fazendo um reconhecimento psicanalítico tanto de Tchernichevski quanto da<br />

constelação de seus personagens. Em sua exposição ele deixa claro o quê tornava o homem<br />

novo, o personagem-emblema, em atraente modelo à militância revolucionária de então:<br />

O auto-controle e a auto-disciplina são a marca do herói tchernichevskiano.<br />

A idéia subjacente àqueles romances de propaganda revolucionária seria oferecer o<br />

exemplo de uma conduta metódica, através da qual alcançar-se-ia o perfeito domínio de si<br />

mesmo, demonstrando o triunfo completo de uma consciência racional sobre os sentidos e<br />

os desejos. O homem-novo, consciente das exigências de uma auto-preparação para as<br />

tarefas revolucionárias, submete-se a uma reeducação total de suas faculdades: disciplina<br />

física, disciplina intelectual, disciplina afetiva, disciplina sexual. Como máquinas<br />

pensantes, sem sofrimento nem conflitos interiores, tornam-se a vanguarda na preparação e<br />

conquista da sociedade futura.<br />

No ensaio Le Principe Anthropologique em Philosophie, Tchernichevski<br />

fundamenta, com forte positivismo teórico, os pressupostos filosóficos para a formação<br />

dessa personalidade maquínica e sem vida interior, que constitui o homem novo: “primeiro,<br />

a filosofia vê o homem o que vêem a medicina, a fisiologia e a química; segundo, as<br />

ciências naturais adquiriram já um tal progresso que fornecem abundantes materiais para<br />

uma solução correta dos problemas morais” 2 .<br />

Contudo, diante da arrogância megalomaníaca das convicções que animam o<br />

homem novo, em sua busca penitencial de verdades cartesianas e claras, a voz de<br />

Dostoievski, insidiosamente, lança as dúvidas. Através de personagens como Raskolnikov,<br />

Kirsanov, ele também frequentava a alma do homem novo, mas nele procurando sempre o<br />

que se encontra oculto...<br />

O caráter metafísico da dúvida dostoievskiana é bem sintetizado no seguinte<br />

comentário,<br />

“... se se consegue descobrir a fórmula de todos os nossos desejos, e de<br />

todos os nossos caprichos, quer dizer, donde provém, em que leis se baseia<br />

seu desenvolvimento, como se reproduzem, para que objetivos tendem em<br />

tais e tais casos etc., é provável então que o homem se reduzirá<br />

imediatamente à classe de uma simples engrenagem, pois um homem<br />

despojado de desejo, de vontade, é apenas um parafuso, uma simples<br />

transmissão!” 3 .<br />

A arrogante auto-afirmação da personalidade do homem novo, o típico niilista russo<br />

do século XIX, já havia sido bem caracterizada, antes dos romances de propaganda de<br />

Tchernichevski, por I. Turguéniev em seu romance Pais e Filhos. No desenrolar de toda a<br />

trama, Basarov, o personagem niilista, move incansavelmente a metralhadora giratória de<br />

seu intelecto atlético vivamente interessado pelos progressos da ciência. Em uma conversa<br />

alusiva aos alemães, diante do comentário (provocativo) de um certo interlocutor, que<br />

1 BESANÇON, Alain. O inconsciente – o episódio da prostituta em Que fazer? e em O subsolo, in: LE<br />

GOFF, J. e NORA, P. (Orgs.). História – novos objetos, RJ: Francisco Alves, 1976, pp.33-51.<br />

2 Citado em BESANÇON, A. Op. cit., p. 47.<br />

3 Id. Ibid., p. 39.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!