Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
www.nead.unama.br<br />
A oportunida<strong>de</strong> para o segundo não tard<strong>ou</strong> a apresentar-se. Ofendido pela<br />
intimação <strong>de</strong> <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong>, o agregado trat<strong>ou</strong> <strong>de</strong> angariar elementos para a<br />
construção da casa, e alguns dias <strong>de</strong>pois, graças a empréstimos <strong>de</strong> dinheiro por<br />
parte do sub<strong>de</strong>legado e dos serviços oferecidos por Lúcio, o inspetor André,<br />
Sebastião e Viana, começaram-se a fincar os esteios.<br />
Lisonjeado pelo acolhimento que recebeu dos seus vizinhos, Francisco<br />
Benedito convenceu-se logo, o que era fácil ao seu caráter, estar invulnerável diante<br />
do seu compadre, fossem quaisquer os abusos que para contrariá-lo praticasse.<br />
Assim, contra a vonta<strong>de</strong> do feitor, e zombando até das ameaças <strong>de</strong>ste,<br />
lanç<strong>ou</strong> mão <strong>de</strong> bois do sítio para carregar a ma<strong>de</strong>ira que tinha necessida<strong>de</strong> e proviase<br />
dos cereais <strong>de</strong> que precisava nas roças do seu compadre.<br />
Essas represálias continuadas punham patente a mudança <strong>de</strong> Francisco<br />
Benedito no modo <strong>de</strong> pensar a respeito do seu protetor, e pela sua gravida<strong>de</strong><br />
mesma não podiam passar <strong>de</strong>spercebidas aos olhos do violeiro.<br />
O ven<strong>de</strong>iro foi logo posto em campo para extremar <strong>de</strong> uma vez esta<br />
situação.<br />
Já a nova casa, como um gran<strong>de</strong> esqueleto, erguia-se completa no seu<br />
ma<strong>de</strong>iramento. Ao lado <strong>de</strong>la avultavam gran<strong>de</strong>s pilhas <strong>de</strong> sapé, que eram<br />
<strong>de</strong>stinadas a cobrirem a cumeeira; e junto das pilhas, em enormes buracos,<br />
revolviam-se as enxadas amassando o barro para solapar as pare<strong>de</strong>s.<br />
O ven<strong>de</strong>iro, que tinha contribuído assaz para a rápida prontificação da casa,<br />
trav<strong>ou</strong> conversa com Francisco Benedito a respeito do casamento.<br />
— Então, seu Chico, é <strong>de</strong>sta <strong>ou</strong> da <strong>ou</strong>tra que há <strong>de</strong> sair o casamento.<br />
— A sair, seu Viana, há <strong>de</strong> ser daqui, com o favor <strong>de</strong> Deus. Aquela<br />
amaldiçoada casa não me vê mais <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> oito dias.<br />
— Está-lhe com muita gana hoje, mas já gost<strong>ou</strong> bem <strong>de</strong>la.<br />
— O passado, passado. Hoje até me parece que se o casamento saísse <strong>de</strong><br />
lá vocês haviam <strong>de</strong> ser infelizes, tem-me acontecido ali o diabo; est<strong>ou</strong> com os<br />
cabelos brancos.<br />
— Na verda<strong>de</strong> <strong>de</strong>u-lhe água pela barba.<br />
— Adoeceu-me a Antonica, prosseguiu Francisco Benedito, que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a<br />
queda no rio nunca mais teve saú<strong>de</strong>; Chiquinha está que parece opilada, e se ela já<br />
tivesse ido à igreja bem se podia dizer ao marido que era tempo <strong>de</strong> tratar das t<strong>ou</strong>cas<br />
<strong>de</strong> lã; a minha Mariquinhas, que era dantes um gaturamo, que passava os dias<br />
cantando, anda-me agora com uma cara <strong>de</strong> p<strong>ou</strong>cos amigos, bisonha e aborrecida.<br />
— Mas então posso contar com o sim da sua parte, seu Chico? Pergunt<strong>ou</strong><br />
Viana.<br />
— Palavra <strong>de</strong> honra! E vai ver como isto se <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> hoje, respon<strong>de</strong>u o<br />
agregado.<br />
À noite voltaram para o casarão e Francisco Benedito, chamando sua<br />
mulher, disse-lhe que tratasse <strong>de</strong> ver o que se havia <strong>de</strong> fazer para os enxovais <strong>de</strong><br />
Antonica.<br />
A moça, que estava cosendo a um canto da sala, interveio<br />
dissimuladamente na conversa.<br />
— Mas eu não tenho vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> casar-me, papai; est<strong>ou</strong> muito criança ainda.<br />
— Ora vá daí, atalh<strong>ou</strong> bruscamente Francisco Benedito; quem sabe se você<br />
<strong>de</strong>ve <strong>ou</strong> não <strong>de</strong>ve casar s<strong>ou</strong> eu; po<strong>de</strong> meter a viola no saco.<br />
98